O mercado de trabalho está cada vez mais exigente. Em tempos de crise econômica, a oferta de mão de obra aumenta. Conforme o estudo Panorama da Desocupação no Rio Grande do Sul, feito pelo Departamento de Economia e Estatística (DEE), a população gaúcha que mais sofreu com o desemprego em 2018 foram os jovens e aqueles que não concluíram o Ensino Médio. Essas duas características são responsáveis por mais da metade das taxas de desocupação.
A assistente de Recursos Humanos do Grupo Tomasi, Júlia Basso, diz que o número de jovens que não concluem o Ensino Médio em Bento Gonçalves impressiona. “A gente orienta os candidatos a fazer a Educação de Jovens e Adultos (EJA) ou as provas de certificação, mas poucos estão indo atrás. Esbarramos em diversas situações. Jovens que tiveram filhos e pararam de estudar para cuidar da criança, questões culturais, falta de incentivo em casa”, ressalta.
Júlia diz que algumas empresas menores até contratam pessoas sem o Médio completo, mas o salário e as posições ocupadas por esses funcionários são inferiores. “O mercado está mais exigentes. O que a gente nota é que muitas das posições operacionais, que não exigiam qualificação, estão mais disputadas com a vinda dos imigrantes”, observa.
“A prioridade era trabalhar”
Pâmela Arend, 21 anos, cursava o 2º anos do Ensino Médio à noite, mas só conseguia chegar na escola 30 minutos após o início das aulas. A prioridade era ajudar em casa. Ela largou os estudos pela segunda vez. “Comecei trabalhar aos 13 anos, como Menor Aprendiz, depois consegui no comércio”, conta.
A primeira vez estava dando tudo certo, mas Pâmela se mudou. Da escola onde estudava até a nova residência, não havia transporte. Desempregada há alguns meses, ela pensa em fazer EJA e procurar emprego em uma indústria. “Se não conseguir, por falta de experiência, vou ter que voltar para uma loja”, diz.
No núcleo familiar, ninguém conclui o Ensino Médio. O irmão, de 19 anos, aguarda iniciar a colheita do pêssego para trabalhar. A mãe faz bicos como faxineira. Mas Pâmela não deixa de sonhar, ela quer fazer o EJA, arrumar um emprego e cursar Direito.
Anderson espera o resultado do Encceja
Há dois anos, Anderson Machado, 30, sobrevive como pode. Arruma alguns bicos, consegue doações. Há sete anos chegou em Bento, no mês seguinte ele estava empregado. Mas as vagas foram diminuindo e as seleções ficaram mais exigentes. Sem ter finalizado o Ensino Médio, ele acaba sendo descartado para várias oportunidades. “Mesmo tendo experiência, eles dizem que a prioridade é para quem concluiu os estudos. Eu acho bom exigirem qualificação, mas somos uma sociedade desestruturada”, opina.
Anderson já parou de estudar três vezes. As duas primeiras, ainda na adolescência, foram para cuidar da mãe, que tinha problema de saúde. Com uma irmã pequena e o pai trabalhando, foi ele quem assumiu a tarefa, deixando os estudos de lado. Aos 25, já morando em Bento, ele havia voltado à escola, mas se mudou de cidade e trancou o Ensino Médio mais uma vez.
Residindo novamente na Capital do Vinho, ele fez o Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (Encceja). Assim o sonho de cursar sociologia pode estar próximo. A esperança de Anderson é conseguir uma bolsa para entrar em uma universidade. “Por enquanto, a gente faz bicos, recebe ajuda de um, de outro. Vai se virando”, diz.