O Instituto Oswaldo Cruz (IOC), da Fiocruz, dará início a um teste clínico inédito para o desenvolvimento de uma vacina contra a hanseníase. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou, na segunda-feira, 14, a realização de testes em humanos, o que poderá abrir caminho para que a população brasileira tenha acesso a uma vacina gratuita contra a doença.
A candidata a se tornar a primeira vacina contra a hanseníase, chamada LepVax, foi desenvolvida pelo Access to Advanced Health Institute (AAHI), um instituto americano de pesquisa biotecnológica sem fins lucrativos. Utilizando moderna tecnologia de subunidade proteica, a vacina demonstrou resultados promissores em testes pré-clínicos contra a Mycobacterium leprae, o agente causador da hanseníase.
Antes de avançar para os estudos em humanos no Brasil, a LepVax passou por testes de segurança em 24 pessoas saudáveis nos Estados Unidos, onde não houve registro de eventos adversos graves. Os resultados indicaram também a imunogenicidade da vacina, ou seja, sua capacidade de estimular a resposta imunológica.
O ensaio no Brasil contará com a participação de 54 voluntários e permitirá aos pesquisadores observar os efeitos da vacina em uma área com alta transmissão da hanseníase. O Brasil é responsável por 90% dos casos da doença na América Latina e ocupa a segunda posição mundial em notificações, atrás apenas da Índia. Entre 2014 e 2023, foram registradas quase 245 mil novas infecções, com 22.773 novos casos apenas em 2023, conforme dados do Ministério da Saúde.
Diante desse panorama epidemiológico, os pesquisadores acreditam que muitos brasileiros já tiveram contato anterior com microbactérias, o que pode influenciar a resposta à vacina. Roberta Olmo, chefe do Laboratório de Hanseníase do IOC/Fiocruz, ressalta a importância do ensaio clínico da LepVax, destacando que a eliminação da hanseníase como problema de saúde pública requer uma vacina eficaz. “A LepVax surge como uma vacina profilática e terapêutica, contribuindo para as metas de controle da doença”, afirma.
O enfrentamento da hanseníase é parte do trabalho do Comitê Interministerial para Eliminação da Tuberculose e Outras Doenças Determinadas Socialmente, que busca soluções para doenças frequentemente associadas à pobreza. As metas incluem interromper a transmissão da hanseníase em 99% dos municípios, eliminar a doença em 75% das cidades e reduzir em 30% o número de novos casos com incapacidade física aparente até 2030.
Estrutura do Estudo
O Instituto Oswaldo Cruz avaliará a segurança e a imunogenicidade da vacina, testando duas formulações com diferentes doses de antígeno. Os participantes serão divididos em três grupos: dois receberão a vacina (um com dose baixa e outro com dose alta) e o terceiro grupo receberá um placebo. Cada voluntário receberá três doses com intervalos de 28 dias e será acompanhado por um ano.
Para participar, os voluntários devem ter entre 18 e 55 anos, estar em boas condições de saúde e não ter histórico da doença ou contato próximo com pacientes com hanseníase. O dermatologista e pesquisador Cássio Ferreira explicou que a segurança da vacina será monitorada por meio de acompanhamento clínico e exames laboratoriais. “Nos Estados Unidos, os resultados foram positivos, sem eventos adversos significativos. As reações observadas, como dor no local da injeção, são comuns em imunizações e não são motivo de preocupação”, conclui Ferreira.
Foto: Fernando Frazão / Agência Brasil