O último auxílio oferecido pela Administração Pública ocorreu em 2013 quando o valor de R$200 mil foi dividido entre seis associações estudantis do município, desde então, apesar das mobilizações, estudantes deixaram de receber descontos
Desde a pequena Santa Tereza, onde 25 universitários utilizam o transporte intermunicipal, até em cidades maiores, como Garibaldi, a Administração Pública destina parte do Orçamento Municipal para auxiliar os estudantes com o transporte universitário. Os descontos variam entre os municípios, indo dos 20,46% obtidos em Veranópolis até a isenção total como ocorre em Farroupilha. Bento Gonçalves, apesar de apresentar renda e população superior às cidades do entorno, há cinco anos não destina nenhum repasse às associações universitárias. Em conversa com o Semanário, representantes estudantis expõem as dificuldades enfrentadas pelos alunos e o desânimo diante das negativas da Prefeitura em contribuir com algum valor.
Em novembro de 2013, após meses de tratativas, o prefeito Guilherme Pasin assinou o documento que garantiu o repasse de R$ 200 mil para auxiliar os universitários de Bento Gonçalves que dependiam do transporte intermunicipal para estudar. O valor destinado a seis associações universitárias, foi comemorado pelos representantes estudantis que assistiram o ato, junto aos Secretários de Finanças e Educação da época. No entanto, o tom animado durou pouco. Em 2015, os estudantes ocupavam cerca de 30 assentos na Câmara de Vereadores para reivindicar a volta dos repasses. Passados cinco anos, as exigências seguem vivas e mais nenhum valor foi concedido pelo Poder Público.
Desde então, coube as associações estudantis o trabalho de intermediar os preços junto às empresas de transporte, como é o caso da Associação dos Estudantes Universitários de Bento Gonçalves na Unisinos (AEUBGU) que freta ônibus das empresa Santo Antônio. Embora o preço pago pelos estudantes cadastrados seja menor que a média apresentada pelas empresas que partem da Rodoviária de Bento Gonçalves para São Leopoldo (de R$27,90 a R$34,60), a presidente da AEUBGU, Karine Rigo Ghiggi, explica que o valor não provém de desconto, tratando-se do preço normal de fretamento cobrado pela empresa de transportes com quem a associação trabalha. “No último ano o valor era de R$24,50 e foi estipulado pela Santo Antônio. O preço vai variar de acordo com cada semestre. Eles podem ficar mais altos ou baixos dependendo do número de pessoas que vão em cada dia. Há semestres que conseguimos lotar dois ônibus por dia e um na sexta, já em outros um ônibus e um micro, e isso muda o preço”, esclarece.
“Daria para fazer uma cadeira a mais”
Essa é a afirmação e o protesto da estudante de Direito e Presidente da Associação Diurna da Unisinos (AUDUBG), Camila Panizzi, ao calcular seus gastos mensais com transporte. “Pagamos muito caro. São R$42 por dia só em passagem. Se você vai para a aula quatro vezes por semana, o custo passa dos R$800, mais caro que muitas cadeiras”, destaca.
A reclamação é repercutida também por outros estudantes e entidades representativas. Karine, por exemplo, destaca que há até estudantes, que cientes da gratuidade ou dos descontos obtidos em municípios vizinhos, chegam a enfrentar a burocracia de ir até outra cidade para pegar um ônibus mais barato. “Vale a pena gastar um pouco de gasolina e ir até outra cidade”, comenta.
Eu gastava R$800 em passagem, foi vantagem conseguir um aluguel em Canoas
O reflexo do alto custo da passagem fica ainda mais evidente no caso da odontóloga Ingrid Copat Somacal, que atuou como presidente da Associação Bento-gonçalvense de Estudantes da Ulbra (AEUUBG) antes de se formar. “Eu gastava R$800 por mês para ir até a Universidade. Consegui um aluguel em Canoas por R$600, foi vantagem me mudar”, conta.
Tratativas com a Prefeitura
Segundo representantes de diferentes associações universitárias, as tentativas de diálogo com a Prefeitura para que volte a ser destinado algum valor do Orçamento Municipal para o transporte dos alunos que estudam fora da cidade têm sido constantes nos últimos cinco anos. Além da manifestação na Câmara Municipal em 2015, onde os estudantes reivindicavam auxílio de 100% nas passagens assim como ocorre em cidades vizinhas, houveram mobilizações defronte a prefeitura, além de inúmeras reuniões com a Administração Pública e envios de propostas. O resultado de todas elas, no entanto, foi sempre o mesmo: nenhum.
Segundo Karine, da AEUBGU, anualmente, em agosto, a entidade encaminha um novo projeto para a Prefeitura, explicando a necessidade do repasse e qual seria o retorno dos estudantes, mas nunca há retorno. “Alguém na Prefeitura já chegou a comentar se queríamos mesmo seguir enviando o projeto, pois não adiantava, mas a gente segue fazendo para mostrar aos associados que estamos tentando”, lamenta.
O prefeito disse que Bento tem faculdade, que ninguém precisa estudar fora
Uma fonte ligada a Associação dos Universitários e Acadêmicos de Bento Gonçalves (AUABG), que preferiu não se identificar, comenta que já não tem mais energia para protestar, já que as respostas têm sido sempre negativas. “Dizem que não há dinheiro, que Bento não tem recursos para isso. Se um município deste tamanho não tem verba, imagina cidades menores como Garibaldi e Veranópolis. Certeza que temos mais recursos que essas cidades, e nelas há descontos, aqui não”, protesta.
Segundo ela, o tom das respostas também não costuma ser alentador. “Em uma das reuniões, o prefeito disse que Bento tem faculdade, que ninguém precisa ir estudar fora. Como se isso fosse opção”, finaliza.
Respostas da Administração Pública
Desde 2014, o discurso recebido pelos estudantes, de acordo com as associações, é que falta verba ao município. Segundo eles, não há como compreender que nenhum valor do Orçamento Municipal seja destinado ao transporte intermunicipal, quando a realidade cidades vizinhas com menores recursos financeiros é diferente. À título de comparação, o orçamento de 2019 para a Capital do Vinho é de R$516 milhões. Em Farroupilha, onde a passagem é isenta, o orçamento é de R$ 272 milhões.
De acordo com a secretária da Educação, Iraci Luchese Vasques, a pasta tem responsabilidade sobre a rede municipal de ensino, ou seja o Ensino Fundamental, e por isso não há destinação de recursos para universitários.
Apesar de afirmar desconhecer a realidade dos municípios vizinhos, Iraci destaca que seria importante destinar algum valor ao transporte para estudantes que se deslocam a outras regiões, porém, assinala que primeiramente deveria ser pensado em valorizar as universidades locais. “Há pessoas que vão para outra cidade longe, em vez de estudar aqui, onde muitas vezes existem os mesmos cursos e com igual qualidade”, comenta. Iraci destaca ainda que dentro da cidade os estudantes contam com 50% de descontos na passagem.
Sobre a possibilidade de nova destinação de repasses para auxílio de transporte intermunicipal, o Semanário entrou em contato com a Secretaria de Finanças, mas não obteve respostas.
Último repasse público foi assinado pelo prefeito Pasin em 2013
No dia 27 de novembro de 2013, o prefeito Guilherme Pasin reuniu, em seu gabinete, os representantes das associações universitárias de Bento Gonçalves para assinatura do documento que garantiu o repasse de R$ 200 mil para o transporte. Foram repassados: R$ 84 mil para a AUABG; R$ 10,9 mil para a AUEFBG, R$ 8,4 mil para a AEUUBG, R$ 33,3 mil para a AUDUBG, R$ 45,2 mil para a AUNUBG e R$ 17,7 mil para a AEBG. Na data, o prefeito destacou que a iniciativa era uma forma de valorizar os estudantes. “É um ganho para educação do nosso Município, e principalmente para que possamos fazer parte da vida destes universitários o que há tempos não vinha sendo feito”, assinalou.
Semanário acompanha reivindicação universitária em 2015
No dia 25 de maio de 2015, cerca de 30 estudantes estiveram presentes em sessão da Câmara de Vereadores em mobilização pelo retorno do repasse do transporte estudantil. O requerimento 64/500 sugeria a elaboração de uma lei que concedesse 100% de auxílio para as associações de alunos que necessitassem se deslocar
a universidades da região.
Embora a requisição tenha sido aprovada por unanimidade, o então presidente da casa, o vereador Valdecir Rubbo (PDT), reiterou que não era possível criar uma lei que onerasse o município sem que estivesse em conformidade com a disponibilidade financeira dos cofres públicos.
Como funciona o repasse do transporte universitário nas cidades vizinhas
. Carlos Barbosa:
Em 2018, a Prefeitura destinou 3,637 milhões para o transporte universitário. Os estudantes pagaram uma taxa de R$ 103 por semestre.
. Farroupilha:
De acordo com informações da Associação Farroupilhense de Estudantes (AFEI), o repasse do município para a entidade foi de R$ 1, 2 milhão, valor igual ao do último ano. O transporte é gratuito desde 2013 para estudantes com renda familiar inferior a cinco salários mínimos (de cinco até dez salários o desconto é diferente) e que morem em Farroupilha há pelo menos dois anos. É cobrado uma taxa de inscrição.
. Garibaldi:
Segundo o Setor de transporte escolar da Secretaria da Educação, em 2018, foram repassados aproximadamente R$ 2 milhões no transporte de cursos técnicos e universitários, beneficiando mais de 900 estudantes. Conforme Lei Municipal nº 3.311/2005, alunos que estudam fora da cidade ganham isenção total. Já os estudantes das instituições locais possuem desconto de 25% na passagem do transporte urbano.
. Pinto Bandeira:
A Administração Municipal informou que o valor investido com transporte universitário no último ano foi de R$ 58.101,90, beneficiando cerca de 60 alunos.
. Santa Tereza:
De acordo com a Secretária de Educação de Santa Tereza, foram repassados R$87,462,64 para custear totalmente os calores do transporte universitário intermunicipal. Atualmente, 25 estudantes utilizam o benefício.
. Veranópolis:
O Diretor de Planejamento do município, Eliézer Dalla Costa assinala que para 2019, o repasse destinado para o transporte universitário será de R$ 340.000,00. Os 550 alunos (número base do último ano) terão desconto de 20,46%, no valor das passagens.
Foto de capa: Diúlit Oldoni, Divulgação