O Nepal, país localizado no sul da Ásia, entre a China (Tibete) e a Índia, viveu entre segunda-feira (8) e terça-feira (9) uma revolta sem precedentes protagonizada pela chamada Geração Z, jovens nascidos entre 1995 e 2009. A mobilização foi motivada pelo contraste entre a ostentação de políticos e a pobreza da população, e mergulhou o país em caos, resultando na morte de 19 pessoas, incêndios em prédios governamentais e casas de ministros, e confrontos com a polícia.
O estopim da mobilização foi o bloqueio de redes sociais pelo governo, que buscava controlar a disseminação de informações. A medida gerou revolta, pois impediu que famílias mantivessem contato com jovens nepaleses trabalhando no exterior e foi interpretada como tentativa de silenciar o movimento anticorrupção online. Os manifestantes passaram a utilizar redes alternativas, como Viber e TikTok, para se organizar.

A desigualdade social é um dos principais motivos da indignação. Segundo o Banco Mundial, os 10% mais ricos do país ganham mais de três vezes a renda dos 40% mais pobres. Um em cada cinco nepaleses vive na pobreza e 22% dos jovens entre 15 e 24 anos estão desempregados. A instabilidade política e econômica vem desde a década de 1990, após uma guerra civil que culminou na abolição da monarquia em 2008.
O governo do Nepal, presidido por Ram Chandra Poudel, de centro-esquerda, enfrentava críticas à elite política e escândalos de corrupção. O primeiro-ministro Khadga Prasad Oli, do Partido Comunista, renunciou após a escalada dos protestos. Mesmo com a renúncia, a população ignorou o toque de recolher e manteve os protestos durante a noite.
Durante as manifestações, prédios do governo, do Parlamento e da Suprema Corte foram incendiados. Casas de autoridades, incluindo a do premiê que renunciou e de outro ex-primeiro-ministro, também foram atacadas, deixando civis feridos. Dois aeroportos foram danificados, assim como hotéis de luxo, e o principal aeroporto de Katmandu foi fechado devido à fumaça.
A mobilização da Geração Z foi fortemente organizada online. Segundo Gaurav Nepune, líder dos protestos, jovens vinham conduzindo uma campanha digital por três meses para expor a diferença entre a vida dos políticos e a das pessoas comuns. O grupo, considerado nativo digital, é descrito como mais conectado, crítico e engajado em debates sobre política, diversidade e sustentabilidade.
O prefeito de Katmandu, Balendra Shah, ex-rapper de 35 anos, tornou-se uma referência entre os manifestantes. Após as mortes de manifestantes, ele criticou o primeiro-ministro, chamando-o de “terrorista” e pediu calma aos jovens em suas redes sociais, ressaltando que a renúncia já havia ocorrido.
O episódio evidencia a frágil democracia do Nepal, ainda marcada por desigualdade social, desemprego juvenil e insatisfação com a classe política, e mostra o poder de mobilização da Geração Z em um contexto de crise política e digital.