Professora da rede municipal utiliza instrumentos alternativos e busca saída na arte para formar alunos mais tolerantes

A professora pergunta aos alunos o nome de um grande expoente musical do Brasil. “Luiz Gonzaga”, responde prontamente um deles, no outro lado do auditório da Escola Municipal São Roque. A aula de música, tanto teórica como prática, faz parte do ensino básico no colégio de turno integral de Bento Gonçalves, provavelmente um dos poucos do Brasil que oferece esse tipo de atividade.
A maioria dos instrumentos são improvisados: uma garrafa pet com grãos de arroz vira chocalho, duas colheres de pau se transformam em percurssão e o violão, que uma menina de 11 anos trouxe de casa especialmente para a aula, acompanha o ritmo da turma. De acordo com a professora Rosana Três, não precisa dos instrumentos tradicionais para ensinar. “Quando a gente se abre para conhecer, se cria um ambiente de tolerância”, observa.
Ela afirma que gosta de trabalhar questões multiculturais e a diversidade, uma vez que a manifestação artística em questão possibilita essa abordagem. “É uma área muito abrangente, porque além de a gente trabalhar o ritmo, trabalhamos a cultura, a história, etc. A gente abre para uma visão de mundo”, comenta.

A questão da cultura

Rosana conta que, neste ano, as aulas estão focadas em países, abordando a cultura e questões sociais. “Nós estamos estudando a Nigéria. Assim nós trabalhamos com o racismo e a intolerância. Com algumas turmas, aproveitei o gancho para a música afro e afro-brasileira”, comenta.
Além disso, ela observa que as aulas já originaram discussões acerca da qualidade musical. “Geralmente se tem a ideia de que rap tem mais cultura do que funk. Essa questão já surgiu na aula. Mas aí eu faço eles questionarem o que é cultura. Assim eles chegam à conclusão de que a afirmação está completamente errada”, analisa. Segundo a professora, esses temas precisam ser postos à reflexão.
Rosana conta que não costuma proibir os estudantes de ouvir determinada música ou de trazê-la para sala de aula, mas busca fazê-los entender que o gênero musical é reflexo de uma manifestação cultural. “O que nós temos que mudar é a cultura. Nós temos que dar condições para aquelas pessoas, para que elas passem a pensar diferente. Por isso, não costumo ter a postura pedagógica de proibir manifestações em salas de aula”, reflete.

Produto ou processo?

Outra questão colocada pela professora se refere à arte como produto ou processo. Segundo ela, é importante que os estudantes apresentem os trabalhos, mas também considera que o estudo da música vai além de ensaiar apresentações para datas comemorativas. “Porque assim a música fica restrita aos estereótipos musicais, aquelas músicas infantilóides. Eu tento fugir disso e ir para a questão da cultura”, pontua.
Por isso, ela enfatiza que gosta de aliar as duas formas, produto e criação. “Eu gosto de mostrar porque temos que ser valorizados também, mas gosto de trabalhar com a ideia de arte como processo”, afirma.

Estudantes contam suas experiências na sala de aula

Todos os estudantes, na aula que a reportagem do Semanário acompanhou, se mostraram entusiasmados. Segundo Bryan Alesxander de Oliveira Silveira, 13 anos, na escola que estudava anteriormente não havia ensino de música. “Eu estou achando bem legal”, comenta. Raíssa Somavilla, 11 anos, e Andrews da Silva Stake, 12 anos, também comentam que gostam de estudar a matéria, sobretudo pelas novidades que aprendem. “De todas as tarefas diferentes na escola, essa é a mais que eu me identifico”, afirma Raíssa. Ela comenta também que gosta das atividades de dança. Já Eduardo Pereira, 11 anos, e Emanuelle Grasnievikz, 11 anos, acompanham os demais colegas com o violão. Emanuelle conta que toca há um ano. “Comecei a fazer umas aulas e gostei bastante, agora eu sei várias músicas”, ressalta. Já Eduardo relata que começou a tocar há poucos meses. “Aqui na sala foi a primeira vez que toquei em conjunto”, pontua.

 

fotos: Lucas Araldi