Relatório divulgado nesta semana pelo Novo Caged, do Ministério do Trabalho e Emprego do governo federal, aponta para pior nível da empregabilidade em Bento Gonçalves nos últimos 10 anos

O nível da empregabilidade no município de Bento Gonçalves tem tudo para ser o pior dos últimos 10 anos, considerando a projeção que se pode fazer com base nos números do primeiro semestre de 2020. O total de admissões de trabalhadores pelos vários setores da economia local tende a ser um dos mais baixos, o volume de demissões projetado vai se manter no patamar dos mais elevados da década e, com isso, o saldo – diferença entre postos de trabalho gerados e as vagas fechadas – tende a ser o mais negativo do período. A constatação é possível levando-se em conta o relatório do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Novo Caged) do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), e tem como principal razão a pandemia da Covid-19, provocada pelo coronavírus.

Como diz o presidente do Centro da Indústria, Comércio e Serviços de Bento Gonçalves (CIC-BG), Rogério Capoani, “os resultados desta ‘guerra biológica’ que apresenta como protagonista atuante o Covid-19, mas que de fundo tem os alicerces mais podres que uma sociedade pode ter no retardo e até mesmo destruição de sua liberdade e progresso, são estes tristes números”. O ano de 2020 tinha tudo para ser um bom ano, com a sequência do crescimento na abertura de vagas que vinha sendo registrada desde 2016, depois do baque de 2015 quando a economia nacional foi, literalmente, a pique.

Os números do caos

De janeiro a junho deste ano, de acordo com o Novo Caged, os empreendedores de Bento Gonçalves fizeram 7.838 contratações, a grande maioria nos dois primeiros meses, janeiro e fevereiro, antes de a pandemia da Covid-19 atingir proporções assustadoras a partir de março e abril. Nos mesmos seis meses, estes mesmos empreendedores realizaram 9.022 demissões, quase a totalidade já no “abre e fecha” decretado pelos governos do estado e municipal na tentativa de conter o avanço do coronavírus. Resultado disso é um saldo negativo de 1.184 postos de trabalho fechados.

São estes os índices que podem fazer de 2020 o ano mais violento, e negativo, da última década, se a crise da Covid-19 não der uma trégua ao ponto de os governantes flexibilizarem as medidas de restrição que, até agora, impedem a retomada da atividade econômica. Com base no que aconteceu até 30 de junho, o nível de emprego em Bento poderá chegar em 31 de dezembro com 15.676 admissões (matemática pura, sem considerar uma eventual queda no ritmo de geração de postos de trabalho), contra 18.044 demissões (um montante que pode ser maior se a crise persistir), resultando em um saldo negativo de 2.368 vagas fechadas.

Mesmo com o cenário se desenhando desta forma com relação a 2020, o presidente Capoani ainda se mostra otimista: “Este levantamento atualizado nos comprova o irreparável estrago convertido em um nível de desemprego alto atual. Porém, existe a convicção e entendimento que ainda temos condições de certa e gradativa recuperação e reparos até o ano de 2020 se encerrar. Claro, tudo vai depender dos governantes, principalmente a nível estadual, e não exigimos muito: apenas que nos devolvam o direito e mais, a dignidade, de poder voltar a trabalhar e continuar a cuidar da vida como sempre fizemos”.

Importante

Os dados do Novo Caged:

Admissões de janeiro a junho de 2020:

7.838

Demissões de janeiro a junho de 2020:

9.022

Saldo no período:

– 1.184

Saldo por setores:

Agropecuária:–1
Comércio: –171
Construção: –13
Indústria: –414
Serviços: –587

ADMISSÕES

4.633 homens
3.205 mulheres

DEMISSÕES

5.093 homens
3.929 mulheres

ADMISSÕES

3.746 com Ensino Médio completo
993 com Ensino Médio incompleto
889 com Ensino Fundamental Completo
844 com Ensino Fundamental incompleto
690 com Ensino Superior Completo
655 com Ensino Superior incompleto
21 analfabetos

DEMISSÕES

4.111 com Ensino Médio completo
1.157 com Ensino Fundamental incompleto
1.073 com Ensino Fundamental completo
1.013 com Ensino Médio incompleto
838 com Ensino Superior completo
819 com Ensino Superior incompleto
11 analfabetos

O desempenho na década:

Projeção com base nos números dos seis primeiros meses de 2020 – Fonte: Caged e Novo Caged

CIC diz que “2020 era para ser um marco do antes e depois”

Nos cinco primeiros anos da década – de 2010 a 2014 – o nível da empregabilidade em Bento Gonçalves mantinha-se em alta, sempre acima das 20 mil contratações e com picos além das 25 mil admissões. O saldo, resultado das vagas geradas e as demissões, era sempre positivo, com uma queda mais expressiva no ano de 2014 quando a economia do Brasil começou a sentir os reflexos da crise econômica internacional puxada pelo Euro, moeda oficial de 19 dos 27 estados que fazem parte da União Europeia.

Uma queda no consumo das famílias brasileiras da ordem de 4% por causa da retração da renda e mercado de trabalho, aliada às maiores dificuldades impostas pelo mercado financeiro para concessão de crédito tanto para pessoas jurídicas quanto físicas e um aumento da inflação superior a 10% agravaram em 2015 os problemas econômico-finaceiros que se iniciaram no ano anterior por conta de uma instabilidade política no âmbito do governo federal.

Em 2015 o número de admissões caiu de mais de 25 mil para 19.420, números que foram piores ainda em 2016 e 2017, ambos com pouco mais de 15 mil contratações pelas empresas de Bento Gonçalves. Nestes três anos é que foram anotados os índices negativos da década, com mais demissões do que contratações, com um pico de 1.935 vagas fechadas em 2015.

Os dois anos seguintes, 2018 e 2019, mostraram uma reação da economia nacional e uma melhoria na oferta de vagas e ocupação da mão de obra. Uma tendência que tinha tudo para se manter em 2020 não fosse a crise do coronavírus. “Tudo se desenhava para isso. O entusiasmo, o vigor e preparação das empresas e até mesmo do governo federal nos seus propósitos e planejamento. O próprio governo estadual iniciava uma caminhada de conquistas significativas. Enfim, o ano de 2020 era para ser um marco do antes e depois no quesito de progresso econômico e consequente qualidade de vida”, avalia o presidente do CVIC-BG, Rogério Capoani.

Sobre quanto tempo vai levar para que o Brasil recupere os danos causados pela Covid-19, é uma incógnita, segundo Capoani. “O país está entrando em um patamar de endividamento de extremo risco, que para poder se recuperar, além de obrigatoriamente e de imediato termos a efetivação das reformas estruturantes – e aqui não podemos pensar em meia boca ou mal feitas – precisaremos de diversas outras medidas paralelas para tentar colocar este gigante Brasil nos trilhos novamente. Missão extremamente árdua e complexa. Uma coisa é certa, levaremos longo período para voltarmos a ter condições de competitvidade e crescimento a nível mundial”, afirma.

“Este era o ano da recuperação”

Presidente do Sindilojas de Bento, Daniel Amadio, comenta que 2020 seria um ano positivo “não fosse um problema gerado do outro lado do mundo que atingiu o planeta da forma como aconteceu”

A estratificação dos níveis de emprego tabulados pelo Novo Caged para Bento Gonçalves mostram que o sexo masculino – até porque constitui o maior volume da mão de obra ocupada – teve o maior contingente de trabalhadores demitidos no município. Foram 5.093 demissões, contra 3.929 mulheres que perderam o emprego principalmente em função da pandemia da Covid-19. Antes das demissões, no mesmo período foram contratados 4.633 homens e 3.205 trabalhadoras.

O presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Bento Gonçalves (Sindilojas-BG), Daniel Amadio, não tem dúvida: com certeza 2020 vai terminar com números violentos no que se refere ao fechamento de postos de trabalho. “A pandemia está proporcionando isso, pois a dificuldade de locomoção em virtude do isolamento, os protocolos que fecham estabelecimentos comerciais, a queda de renda nas famílias e a insegurança no futuro que retrai o consumo acabam gerando queda nas vendas. Em consequência disso o comércio com menos recurso disponível acaba reduzindo seus gastos em suas despesas fixas”, diz.

O custo de pessoal é a primeira despesa a ser olhada pelo empresário que precisa enxugar despesas. É eliminado o quadro obsoleto e o estabelecimento passa a atender com estrutura mínima. “Pela demora em voltar a normalidade, utiliza de suspensão de contrato ou redução de jornada e salário. Como o período ficou elástico acaba ficando inevitável o desligamento, e os números do Caged já vêm demostrando isso”, explica Amadio. Sobre a reversão do quadro, afirma que é preciso retomar a atividade econômica de forma gradual e controlada, principalmente os empreendimentos que tiveram as portas fechadas, “como medida básica de sobrevivência com possibilidades de vendas com os devidos cuidados, gerando receita para evitar que os negócios venham a sucumbir”.

O presidente também considera que é muito difícil prever quando a situação tende a ser normalizada. “Isso é muito do individual dos negócios, pois muitos resistentes e sem fôlego financeiro podem não permanecer abertos. Porém, acredito que os que conseguirem passar pela pandemia, sairão fortalecidos. No geral, penso que precisaremos de mais um ano, pós calamidade pública, para retornarmos aos números do final de 2019 e, daí, se normalizar, voltar a crescer acima dos números antes das quedas”, imagina o dirigente.

O uso das vendas eletrônicas são essenciais para passar por esse momento, pois colocam os comércios em condições de atender seus clientes de forma distanciada, sem contato direto.
Daniel Amadio
Presidente do Sindilojas de Bento Gonçalves


Para saber

No Rio Grande do Sul, segundo o levantamento divulgado pelo Novo Caged, foram registradas

448.292

admissões de janeiro a junho deste ano, contra

542.782

demissões. O saldo é de

94.490

postos de trabalho encerrados.

Em todo o Brasil, no mesmo período foram anotadas

6.718.276

admissões, contra um total de

7.916.639

demissões. Ou seja,

1.198.363

postos de trabalho fechados de janeiro a junho deste ano

Imagens: Reprodução MTE – Novo Caged – Arte JS