Jane Krüger
Ser vovó. Então, aconteceu! Enfim, aconteceu. Semana passada meu primeiro netinho nasceu, Antônio Krüger Tramontin Toledo. Como eu esperava por isso! A gravidez da minha filha teve várias complicações, já estávamos preparados para o pior, mas nunca perdemos a esperança de que poderíamos ser surpreendidos com um final feliz, ou melhor dizendo, com um começo feliz. E, Baruch Hashem, graças a D’us, assim foi. A Esther teve um parto rápido e logo esse bebê tão lindo e perfeito (toda avó e mãe acham sua prole linda e perfeita, não tem jeito) estava em seus braços.
Claro que, depois dos dias de hospital, vieram pra casa e aí começou outra saga: não descia o leite. Corre a avó fazer todo tipo de chá e comida para descer o bendito alimento.
Desceu! I Ufaaa! O leite desceu. Mas logo depois, apareceu outra questão, agora vem leite demais! Empedra peito, dor, febre… aiii…mais um pouco de sofrimento. Tá, mas me diga, o que é a vida senão sofrer? Já dizia o adágio, ser mãe é padecer no paraíso. E o que é ser avó então? Acredito que seja, padecer continuamente no paraíso (risos à parte).
Verdade seja dita, se não nos esquecêssemos destes primeiros dias de nossas vidas, pelo menos dois princípios teríamos para sempre arraigados em nós. Primeiro, não existe bem algum que não chegue até a gente isento de algum tipo de dor ou sofrimento. Veja bem, nascer dói, crescer dói. Estudar dói. Trabalhar às vezes dói e para quem é preguiçoso, dói tudo o tempo todo. No entanto, só aprendendo a lidar com a dor, tolerando os momentos de desconforto, podemos depois também ter a alegria de desfrutar de nossas conquistas, nossos crescimentos no mais amplo sentido da palavra e assim amadurecer, florescer.
Segunda grande lição que deveríamos gravar e nunca apagar, apesar de nossa teimosa e constante humana habilidade de se orgulhar e assoberbar: a humildade. Analisemos, a gente é recebido nesta vida por mãos que nos carregam, nos acolhem e aninham. Primeiro, os médicos, os enfermeiros, depois os pais, avós, etc. É também pela mão de pelo menos algumas pessoas que somos conduzidos em nossos últimos instantes aqui. Somos dependentes uns dos outros desde o nascer até morrer. Não podemos nascer desassistidos e também não vamos ao túmulo desacompanhados. Sim, de fato, precisamos de ajuda para nascer e também para morrer e assim, descansar em paz. Para que tanto orgulho então?
Me diga, para onde nos conduz esse narcisismo exacerbado que hoje entre nós é cultivado?
Pois então, meus seis dias de vovó, incontinentemente me tornaram uma pessoa mais ciente de quanto trabalho já dei para meus pais, avós, especialmente para minha mãezinha que me ajudou assiduamente em todos meus partos e suas quarentenas, e isso gera em mim tanta gratidão perante a mais clara certeza da beleza da vida, da bênção de poder servir a própria família e ali, com coisas que parecem tão simples e que talvez para alguns, afazeres assim, sejam até mesmo desconsiderados e tidos como irrelevantes. Contudo, eu sei, construímos um legado com a sopinha que fazemos, com a mesa que arrumamos para a família poder sentar e desfrutar de mais uma refeição reunida, do tradicional banho de camomila que damos em nossos bebês, da fraldinha que trocamos, do tempo que nos dedicamos em cuidar e zelar. E para respaldar minha fala, vem o afamado romancista e dramaturgo, Victor Hugo, dizendo “A mão que balança o berço é a mão que governa o mundo”.
Ah, que bom seria se todos os pais e avós parassem e refletissem acerca do seu papel no seio familiar. Quem sabe, logo entenderiam que ao parar seus “importantes afazeres e negócios” para ninar uma criança, para cuidar da família, muito mais do que nutrir ou cuidar de um ser, estão se dando ao trabalho de cuidar e governar um mundo inteiro e por fim, compreenderiam, o futuro está bem ali, em suas mãos, que estão a embalar o destino do mundo.
Jane é PhD, Pesquisadora do LABÔPUC/SP, Psicanalista e Escritora