Consolidada como a quinta data mais importante do ano para o varejo, a Páscoa deve ser menos doce em 2020. Em meio às incertezas econômicas e medidas de isolamento adotadas por governos estaduais e municipais, as previsões das entidades representativas do setor não são nada boas para os comerciantes. Segundo estudo publicado recentemente pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), as vendas típicas da data devem registrar uma queda histórica de 31,6% em relação a 2019, o que representa uma perda estimada de R$ 738 milhões. As explicações se embasam, sobremodo, na aversão ao crédito por parte do consumidor para o compra de produtos não essenciais, bem como a queda de fluxo de clientes em lojas.

De acordo com os dados elencados pela CNC, no Rio Grande do Sul a movimentação de consumidores em estabelecimentos como supermercados já caiu 39% em comparação com o fluxo médio (Foto: Franciele Zanon)


No Rio Grande do Sul, com o decreto do Governo do Estado que, entre outras restrições, proibiu a abertura de grande parte das lojas até 15 de abril, as expectativas vão ao encontro da média da CNC. Na prospecção do Sindicato do Comércio Varejista (Sindilojas) Porto Alegre, a redução prevista para o comércio gaúcho fica entre 30% a 40%. Embora não tenham sido realizados levantamentos semelhantes com foco na Capital do Vinho e nem na Serra Gaúcha, o Presidente do Sindilojas Regional Bento Gonçalves, Daniel Amadio, acredita que o impacto no comércio local deve se enquadrar nestas estimativas. “Acionei o nosso setor de pesquisa da Fecomércio, mas não teve um estudo relativo a Páscoa neste ano, até pelas restrições de trabalho, contratações de equipe, entre outros. Mas o que a economista chefe me passou é que teremos um ano muito ruim. Há muita insegurança e péssimas expectativas”, lamenta.


Segundo Amadio, após um 2019 de recuperação tímida do setor, as projeções eram de que uma melhora significativa dos números fosse iniciada justamente na Páscoa de 2020. “Mesmo a queda substancial de 2014, puxada pela crise econômica, não chega perto da redução que teremos agora. Antes disso, estávamos esperando um crescimento de 3% ou 4% descontado a inflação”, destaca. Ainda de acordo com ele, a queda histórica se dá, basicamente, pela soma de três restrições: o fim das confraternizações familiares devido ao isolamento; a recessão das compras pela insegurança financeira diante de um cenário econômico incerto no futuro; e, por último, a restrição da oferta de produtos com o fechamento de lojas.

“O que podemos recomendar é o uso de ferramentas virtuais para aproximação com os clientes. Que os lojistas busquem seus bancos de dado e façam contatos, ofereçam seus produtos e serviços de tele-entrega e condições de pagamento eletrônico. Levando em conta os decretos baixados, essa é a única maneira que vejo de atender o consumidor e, de repente, conquistar alguma venda”, Daniel Amadio

Embora sejam considerados serviços essenciais, ou seja, que seguem funcionando durante a pandemia, os supermercados também devem ter suas vendas de Páscoa afetadas. Sócio proprietário de uma rede de supermercados, Juliano Zandonai assinala que apesar de não poder estimar de quanto será a perda, ela certamente ocorrerá. “Estamos antecipando junto às indústrias o que pudermos em termos de verba, ações e promoções e trabalhando desde cedo com campanhas para despertar o interesse dos consumidores em comprar os itens de Páscoa”, comenta ao ser questionado sobre as estratégias para minimizar a queda.


Em retorno ao Semanário, a entidade representativa do setor, a Associação Gaúcha de Supermercados (Agas) preferiu não se pronunciar sobre as expectativas de vendas. “É um posicionamento institucional não falarmos da data. Nossa preocupação no momento é com o abastecimento de itens de necessidade básica aos gaúchos”, sublinhou. A Agas, no entanto, confirmou uma queda de 40% no número de clientes na última semana.

Em meio à crise, o bom exemplo

O mês deve ser mais danoso, porém, às lojas especializadas em chocolates, as quais se preparam desde cedo para atender a demanda do feriado. Proprietário de uma fábrica do ramo localizada no Vale dos Vinhedos, Lauri Rasia é um exemplo disso. De acordo com ele, a redução de vendas deste ano deve chegar a 90%. “O Vale dos Vinhedos está deserto e nove entre cada dez clientes nossos são turistas”, diz. Ele pontua, ainda, que é a segunda vez que a pandemia atrapalha seu negócio, uma vez que contava com um estande na Movelsul, evento que foi adiado.


Para conseguir algum retorno, a empresa tem trabalhado fortemente com o contato direto com os clientes pelas redes sociais e aposta, de forma exclusiva, em delivery para a Páscoa. Uma semana antes da data, o empenho tem apresentado algum resultado. “Tem ajudado um pouco. Todos os dias têm entrega para vizinhos e amigos, mas é bem limitado”, sublinha. Com a fábrica fechada desde 19 de março e cerca de 90% do estoque intocado, Rasia conta que os produtos próximos da validade estão sendo doados. Nesta semana, gesto simbólico, cerca de 100 kits com trufas serão entregues aos profissionais da UPA que têm atuado no combate da pandemia do Coronavírus.