Bandidos encapuzados invadiram condomínio na madrugada de segunda-feira, 2 de março, no intuito de matar jovem, mas acabaram acertando o filho de seis anos
Na madrugada de segunda-feira, 2, bandidos invadiram um apartamento no bairro Ouro Verde e atiraram contra Leonardo de Oliveira Garcia, de 26 anos. Mas o que não esperavam é que os tiros atingissem o filho da vítima Felipe Martins Garcia, de seis anos, que não resistiu aos ferimentos e morreu pouco depois de dar entrada no Hospital Tacchini. Este foi o sexto homicídio do ano em Bento Gonçalves. Garcia foi atingido no ombro e passa bem. A mãe da criança, que estava no imóvel no momento do crime, não se feriu.
A delegada titular da 1ª DP, Maria Isabel Zermann Machado ouviu os pais da criança na manhã de segunda. Conforme ela, a mãe confirmou que o pai já esteve envolvido com o tráfico, em Porto Alegre, mas não estavam mais ligados ao crime. “Ela disse que vieram para cá para trabalhar, que não tinham nenhuma desavença. Inclusive já estavam trabalhando e foram pegos de surpresa pela situação”, afirma.
Ainda segundo a Delegada, a mãe contou, em depoimento, que o apartamento foi invadido por dois encapuzados. “Segundo ela, o Leonardo entrou em luta corporal contra os invasores e, neste momento, um deles fugiu. Durante a briga, o elemento começou a efetuar disparos, de pistola calibre 9mm, os quais acertaram a vítima no ombro. Quando os bandidos foram embora é que o casal entrou no quarto onde a criança dormia e viram que ela tinha sido atingida com um tiro na cabeça. Como as vítimas foram levadas para o hospital por vizinhos e entraram outras pessoas no apartamento, a perícia acabou sendo prejudicada”, enfatiza a Delegada.
De acordo com o delegado da 2ª Delegacia de Polícia de Bento Gonçalves (2ª DP), Álvaro Luiz Pacheco Becker, o pai da vítima não tem significativas passagens pela polícia. “Posse de entorpecentes em 2013, receptação, ameaça. Tem algumas passagens, mas nada tão significativo. Agora, a 1ª Delegacia de Polícia (1ª DP) fará as investigações na tentativa de elucidar a motivação do crime”, salienta.
Relembre o caso
Foram poucos os condôminos que ouviram ou viram o que ocorreu. Uma das pessoas, com necessidades especiais e moradora do bloco em frente, conta, à sua maneira, que acordou com os gritos e foi à janela ver o que estava ocorrendo. Foi quando viu três homens encapuzados fugindo pela lateral do prédio, (à BM, outras testemunhas afirmaram que eram quatro) que dá acesso a um matagal. O marido da testemunha, que acordou logo em seguida, ressalta que a cena foi muito triste. “Ver a mãe gritando com a criança no colo não tem explicação. Um vizinho ajudou a levar para o hospital. Colocou todos no carro e saiu em disparada”, frisa.
Muitos moradores preferem não se manifestar. Dizem apenas não saber de nada, não ver nada, não ouvir nada. Mas asseguram que estão cansados da situação. “Estamos aqui há sete anos, oito, dez, e não sabemos nem quem são nossos vizinhos. É um entra e sai de gente sem explicação. O portão fica aberto o tempo todo. Não temos guarda há uns seis anos. Lá atrás (do conjunto habitacional) é tudo aberto. Aqui tem gente idosa, gente ordeira e trabalhadora. E estamos desse jeito, com toda uma população denegrida por causa de meia dúzia de bandidos”, dizem em conjunto. A informação de que os moradores não se conhecem foi confirmada em conversa com o síndico do condomínio. “Eram moradores novos, estavam aqui há menos de dois meses. Nem tinham se apresentado para mim ainda. Não sei de onde vieram”, disse.
Segundo informações de uma funerária local, o corpo da criança foi levado para Alvorada, onde foi sepultado na terça-feira, 3. O menino estava matriculado na Escola Municipal de Ensino Fundamental Maria Borges Frota, o CAIC do Bairro Ouro Verde, a qual frequentou pouco mais de uma semana, uma vez que as aulas iniciaram no dia 17 de fevereiro.
Rotina de medo
A falta de segurança num local onde vivem mais de mil pessoas preocupa não somente os moradores mais antigos, mas, principalmente os mais idosos e os pais e mães de família, que têm filhos pequenos. “É muito difícil conviver com essa situação e, mais difícil ainda é não ter para onde ir”, diz um senhor de 74 anos, morador do local desde 2014.
A fala é confirmada por uma jovem, de 33 anos, que têm dois filhos e vive no local há três anos. “Jogaram toda essa gente aqui sem a menor assistência. Tem muita gente idosa, muitas crianças, muitos doentes. A gente precisaria de uma unidade de saúde aqui dentro, de uma creche, de um CRAS (Centro de Referência em Assistência Social). Isso é desumano. Tem ratos lá perto da lixeira do tamanho dos nossos cachorros. Não temos segurança. Não temos zelador. Se não cuidarmos da frente dos nossos apartamentos, isso aqui vira o caos. É a gente mesmo que faz a limpeza. A gente vive a base de calmante. É depressão, ansiedade, insônia. Ou se toma remédio ou não se dorme”, conta, com tristeza.
Outros moradores reclamam que lá dentro ninguém se conhece. “Não temos convívio, nem sabemos de onde as pessoas vem. É muita rotatividade de gente. Um entra e sai que ninguém explica. Entre os mais antigos nunca aconteceu nada. O problema é essa gente que chega e ninguém sabe da onde. Tem gente que invade. Acho que proprietários aqui deve ter uns 20”, enfatizam.
Fotos: Fábio Becker