A história de dedicação, trabalho em equipe e os sacrifícios diários de dançarinos tradicionalistas que viajam entre Bento Gonçalves e Farroupilha em busca da vitória no maior evento de cultura gaúcha

A rotina de ensaios para o Encontro de Artes e Tradição Gaúcha – ENART exige muito mais do que talento e dedicação, especialmente para os dançarinos de Bento Gonçalves que viajam frequentemente até Farroupilha para treinar no CTG Ronda Charrua, um dos grupos da região que participa da competição. Com o apoio da patronagem e a união entre os integrantes, eles conseguem enfrentar diversos desafios, mas também colhe frutos em termos de aprendizado e preparação.

William Silva, um dos dançarinos que mora em Bento Gonçalves e viaja semanalmente para os ensaios, explica como o grupo organiza o transporte e os custos: “Nos organizamos em grupo para irmos para o ensaio, temos nove dançarinos que moram em Bento e dançam no Ronda, então nos ajudamos com os custos e transporte para os ensaios”, diz. Para ele, um dos maiores desafios é equilibrar o tempo entre a dança e outras responsabilidades. “Muitas vezes, o maior desafio é a questão dos horários, por conta do trabalho, estudos, família. A dança é nossa vida, então dedicamos muito tempo para o CTG, e isso acaba sobrecarregando as outras atividades”, completa.

Maria Antônia Coelho, de 19 anos, é assistente administrativa e 1ª Prenda Adulta do CTG Ronda Charrua, e também compartilha sua visão sobre os desafios: “A rotina para os ensaios é bem puxada, porém se torna leve com os amigos que estão sempre juntos indo e vindo entre Bento e Farroupilha. Também é cansativa, por conta do deslocamento e dos horários, mas o esforço vale a pena”, declara.
Para Silva, o segredo para manter o foco está na maturidade e no comprometimento com o grupo. “A dança é uma paixão que trazemos dentro de nós, mas não podemos deixar de seguir com nossos trabalhos e vida pessoal. Todos temos maturidade e responsabilidade, e isso ajuda muito a manter a disciplina”, afirma.

Na quarta-feira, 13, foi o último ensaio do grupo antes da ida a Santa Cruz do Sul Foto: Ronda Charrua

As viagens constantes também agregam ao espírito de equipe, que é essencial para a preparação para o ENART. Maria Antônia explica que o compromisso com o grupo é fundamental: “O deslocamento agregou fidelidade aos compromissos assumidos. Sabemos o quanto foi difícil durante todo o ano essas idas e vindas, mas tudo isso construiu uma imensa lealdade com nossos colegas de grupo. Para que os ensaios funcionem bem, é importante que todos se façam presentes, mesmo com as dificuldades de distância”, pontua.

Sobre a estrutura dos ensaios no Ronda Charrua, os dançarinos destacam o apoio da patronagem e dos instrutores, como o coordenador Rodrigo Gil e os ensaiadores Gian Soares e Paula Zanco, que desempenham papel essencial na preparação. “Nossa estrutura conta com o apoio da diração do CTG e dos pais, sempre ali junto com os dançarinos. Ensaiamos no mínimo três vezes por semana durante o ano todo, em busca de fazer o melhor trabalho possível”, explica Silva.

Além disso, Maria Antônia destaca a organização da preparação: “Os ensaios são muito bem planejados e regidos pelos responsáveis do Ronda Charrua: instrutores, coordenadores e patronagem. Eles regem tudo para que nós, dançarinos, nos preocupemos o menos possível”, comenta.

As expectativas para a competição são altas entre os dançarinos. “Minhas expectativas são ótimas, creio que nosso trabalho foi bem construído ao longo de todo o ano. O ENART é o palco dos sonhos que esperamos por longos meses”, afirma Maria Antônia. Silva, por sua vez, compartilha a mesma confiança: “São as melhores possíveis, trabalhamos forte para esse ano e vamos em busca do título. Se tudo der certo, vamos trazer o troféu para a Serra novamente”, complementa.

O esforço físico é outro desafio constante, com os dançarinos sentindo o impacto das viagens frequentes. Maria Antônia admite que as viagens trazem consequências, mas ela tenta se preparar tanto física quanto mentalmente: “A viagem influencia, sim, mas sempre tento manter o psicológico e o físico preparados para os dias de ensaio, minimizando falhas e erros que possam vir a acontecer”, diz.

A motivação para continuar vem, principalmente, do amor pela dança. “Gostar de dançar, estar com amigos, é o que me motiva. Esse é o meu energético, minha motivação”, conta Silva. Para Maria Antônia, a motivação vai além do físico: “Dançar é mais do que uma atividade, é um sentimento e uma expressão da alma. Se não fosse o amor que tenho pela dança e pela cultura gaúcha, não sei se aguentaria essa rotina puxada”, declara.

Em relação aos custos envolvidos, Silva revela que a indumentária e os deslocamentos exigem um grande investimento. “É um valor alto, não consigo colocar na ponta do lápis quanto gastamos, mas é um grande investimento para dançar em um grupo desse porte”, diz. Para reduzir os custos, o grupo se mobiliza em ações como a venda de ingressos para jantares e almoços. “Trabalhamos bastante para não precisar tirar do bolso os valores. É um trabalho conjunto do grupo todo em prol da invernada”, explica.

Desafios na coordenação e preparação para o ENART

Sabrina Prior, coordenadora da invernada adulta do Ronda Charrua, fala sobre o papel crucial da coordenação na preparação do grupo para o ENART. “Hoje somos dois coordenadores, além de mim tem o Luciano Pontel, e acredito que, além de todo o gerenciamento financeiro e organizacional, precisamos manter o grupo coeso, unido, e com foco no principal objetivo, que é o ENART”, afirma. Ela destaca que, embora nem sempre seja simples, o grupo se mantém unido. “Nem sempre é fácil lidar com as pessoas, mas como diria nosso instrutor, Rodrigo Gil, faríamos tudo de novo, sempre pensando no coletivo”, cita.
Em relação ao custo da preparação para o ENART, Sabrina revela que os investimentos são elevados. “Os gastos deste ano já passam dos R$200 mil. Temos investimentos como roupas, instrutores, a parte musical, acessórios, hotel, alimentação, deslocamento e coreógrafos”, detalha. Para arrecadar esses valores, o CTG Ronda Charrua realiza eventos que geram recursos importantes. “A nossa principal renda são os eventos. Neste ano, realizamos quatro Cafés Coloniais com ensaio aberto ao público, além da nossa pré-estreia, que contou com mais de 800 pessoas. Tivemos também vários patrocinadores, que foram fundamentais para alcançarmos o nosso objetivo”, explica.

O compromisso de todos, desde os dançarinos até os patrocinadores, é fundamental para o sucesso do grupo. Sabrina destaca a importância do legado do CTG Ronda Charrua, que se mantém firme ao longo dos anos. “Isso se dá por conta do legado que vem se mantendo ao longo dos anos, patronagens, colaboradores e dançarinos que se empenham diariamente para manter a tradição do Estado viva dentro do Ronda”, afirma.

A proposta temática da apresentação deste ano é uma história envolvente sobre a família Fialho e Silva. Sabrina explica: “Esse ano, o Ronda Charrua irá retratar a história desta família, onde resumidamente fala da amargura do patriarca por não ter tido um filho homem, sendo rude com sua esposa e cinco filhas. No final da história, ele se arrepende e busca o perdão da esposa, mostrando o verdadeiro amor que sente por elas”, conta.

Sobre a preparação para se manter entre os melhores do estado, Sabrina destaca o trabalho árduo do grupo: “Esse sempre é o maior desafio: se manter entre os melhores. Não tem uma fórmula perfeita para que isso aconteça. Para nós, tem que ter muito trabalho e comprometimento. Esse ano, tentamos fazer isso ao máximo, extrair o melhor de cada um. Não sabemos se vai dar certo, mas estamos trabalhando duro”, comenta.

A coordenação do grupo também enfrenta desafios nos ensaios. “Conseguir tirar o melhor de cada um a todo momento e aglutinar todos para o mesmo propósito. Essa é uma das maiores dificuldades que enfrentamos”, afirma Sabrina. Contudo, a pressão para representar a região e manter o alto nível de desempenho é convertida em atitudes positivas. “Essa cobrança é convertida em atitudes e pensamentos positivos. A adrenalina da apresentação faz com que o dançarino tenha o incentivo e o foco no objetivo, que é sempre dançar bem e conseguir transmitir algo que emocione as pessoas”, diz.
O espírito de equipe é essencial para que todos os dançarinos se sintam motivados e parte do processo. Sabrina enfatiza: “O fundamental para que o espírito de equipe aconteça é a transparência com todo mundo, onde os dançarinos, coordenadores, instrutores, etc, consigam entender o objetivo. Assim, todos se sentem úteis no processo”, afirma.

Por fim, Sabrina revela que o grupo sempre aprende com cada competição. “A cada competição aprendemos algo novo, pois nunca o contexto é o mesmo. O principal é estar focado e concentrado no que cada um tem que fazer”, conclui.

Sobre o Enart

O Encontro de Artes e Tradição Gaúcha (ENART) é um evento a nível estadual, considerado o maior festival de arte amadora da América Latina, descendente do antigo estadual FEMOBRAL (popularmente MOBRAL). É promovido pelo Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG), realizado desde 1986, sendo que desde 1997 ocorre no Parque da Oktoberfest em Santa Cruz do Sul.

É realizado anualmente, em três etapas: regionais, inter-regionais e final. Envolve competidores de todo o estado do Rio Grande do Sul, e espectadores de todo o mundo. Estima-se haver mais de dois mil concorrentes por ano, somente na categoria de Danças Tradicionais (entre força A e força B) e mais de 60 mil espectadores na fase na final.

Programação

A abertura oficial está marcada para as 17h30min, com a chegada da imagem de Nossa Senhora Medianeira e uma apresentação do DTG Poncho Verde, de Panambi, campeão da Força A do Enart 2023. Durante o fim de semana, as competições se intensificam com eliminatórias e finais de algumas modalidades. No domingo, o evento chegará ao ápice com as finais das danças tradicionais, apresentações de danças gaúchas de salão e atrações inclusivas, como a dança gaúcha de salão adaptada para pessoas com deficiência intelectual ou múltipla.

Depois de conhecidos os campeões, o Enart se encerrará com a apresentação do CTG Paixão Côrtes, de Caxias do Sul, vencedor do Festival Gaúcho de Danças (Fegadan) 2024. Na sequência, haverá a dança da integração e a cerimônia de encerramento, prevista para as 19h30min.

Ordem de Apresentação dos concorrentes da região

Modalidade: Declamação Masculina
13º FLÁVIO SOCCOL, do CTG Gaudério Serrano

Modalidade: Gaita botão até oito baixos
28º RICARDO ADRIANO NOSKOSKI, do CTG Herdeiros da Bombacha

Modalide: Gaita botão mais de oito baixos
15º RICARDO ADRIANO NOSKOSKI, do CTG Herdeiros da Bombacha

Modalidade: Gaita Piano
6º RICARDO ADRIANO NOSKOSKI, do CTG Herdeiros da Bombacha

Modalidade: Solista Vocal Feminino
12º CAROLINI NUNES FERNANDES, do CTG Laço Velho

Modalidade: Solista Vocal Masculino
18º HONÓRIO LUIS ANZOLIN TESSARO, do CTG Rincão da Roça Reúna

31º LUCAS CONTINI, do CTG Paisanos da Tradição

Modalidade: Danças Tradicionais Adulta Força A
Bloco 5: CTG RONDA CHARRUA