Já falei da velha paineira de mais de trinta metros, que abraça os fundos do prédio onde trabalho, no texto Competição – trata-se de crônica sobre uma disputa entre colegas “exuberantes”, cuja vencedora sairia com o prêmio da “caixinha”, guardada a sete chaves. Dentre os céticos, havia uma colega magrela que desafiou o grupo bem nutrido nos seguintes termos: “Vou subir nessa árvore se vocês perderem um quilo!” Bom, ela não a escalou … Mas, nós vamos fazer isso agora. Sigam-me…
É preciso cautela… Estamos num terreno acidentado, onde a natureza fez um corte vertical. Logo abaixo, o movimento da rua é impressionante, motivo por que esta “barriguda” (a paineira, tá?!) foi motivo de muita polêmica por anos a fio: cai ou não cai? Não caiu. Ela continua lá, florindo e tecendo painas em todos os outonos, para desfrute de nossos olhos.
Estamos bem próximos… As raízes, meio expostas, denunciam a ação humana no ato de posse da terra. Toquemos o caule… Dá para sentir a vida que circula por este tronco cinzento-esverdeado cheio de estrias, que se bifurcou em dois e, um pouco acima, em mais dois. Para completar a “garra” nascida do chão, cresceu um galho direto da base. A epiderme é bastante rugosa, talvez pela idade, talvez pelas características da família “Malvaceae”. Ela já não tem muitos espinhos, o que permite o livre trânsito de insetos. Aliás, por aqui acampou também, por uns tempos, um bicho esquisito, com focinho e rabo compridos, patinhas ágeis, e grande apreciador de abacates.
Vamos começar a escalada! O quê? Vocês não sabem trepar em árvore? Nunca foram crianças? Não ouviram os pais quando diziam “Tira essa bunda da cadeira e vai brincar lá fora!”? Então, só lhes resta uma alternativa: me acompanharem com o coração…
Estamos no tronco. Sete metros acima, bifurcações sucessivas sustentam a galhada coberta de folhas. Paremos numa dessas divisões. Lá está o objetivo desta viagem…
Esperem um pouco! Temos que retroceder no tempo… Há algumas semanas, aconteceu um ritual nas redondezas. Vimos por essa janela que nunca há de se fechar. Duas pombas-rolas voavam uma ao redor da outra, arrulhando, pousando e se bicando, num indicativo de namoro. A união deu certo. E lá (agora, sim) está o objetivo desta viagem: o ninho, que guarda o milagre da vida.
Cheguemos mais perto. Quem está incubando os ovos neste momento é o macho, que deu um tempo à fêmea para ela se recompor – um bom banho, uma boa refeição, uma voada por aí para arejar as ideias… Mães não são de ferro!
“Plic! Plic! Plic!” Começou a chover. Ainda bem que as folhas formam um toldo sobre o pequeno lar, bastante ralo, mas suficiente para minimizar o baque dos pingos.
Bom, hora de “picar a mula”. Logo, logo, mamãe pomba estará de volta e não vai gostar de nos ver xeretando aqui. Mas eu garanto: daremos notícias quando nascerem os filhotes. Aguardem pela fumaça branca…