Prefeitura está solicitando a municipalização da Escola Estadual Bento Gonçalves. Entretanto, em Audiência Pública, realizada na noite de quinta-feira, 19, direção, professores, pais e alunos lotaram auditório do educandário para manifestar contrariedade ao projeto
Integrantes da direção da Escola Estadual de Ensino Fundamental General Bento Gonçalves da Silva foram pegos de surpresa com uma notícia. A Secretaria Municipal de Educação (SMED) deu entrada em um processo, solicitando a municipalização do educandário. Caso isso venha a ocorrer, o local deixa de ser gerido pelo estado e passa a ser mantido pela prefeitura. Contudo, além dos funcionários, pais e alunos também se mostram contrários à iniciativa.
O coordenador da 16ª Coordenadoria Regional de Educação (CRE), Alexandre Misturini, recebeu um ofício do prefeito, Diogo Siqueira, contendo a intenção e solicitação da troca de mantença – nome técnico da ação. A justificativa contida no documento diz respeito ao déficit de vagas na região central da cidade. “Aproximadamente 500 vagas de Ensino Fundamental, do 6° ao 9° ano e mais 200 de Educação Infantil”, revela.
Já a secretária de Educação, Adriane Zorzi, afirma que o processo aconteceu a partir da solicitação de pais, que buscaram auxílio na Câmara de Vereadores. “Como a escola está com salas ociosas, poderia atender os inúmeros alunos que buscam vagas próximas ao centro da cidade”, responde.
O diretor do colégio, Leonildo de Moura, conta que ficou sabendo da intenção há cerca de dez dias, quando chegaram os ofícios solicitando a cedência. Moura foi chamado pelo coordenador da 16ª CRE, Alexandre, para conversar a respeito. Posteriormente, levou a situação ao conhecimento da comunidade escolar, que se posicionou contra.
Também de acordo com o diretor, o vereador Ari Pelicioli (CIDADANIA), levou para a Câmara de Vereadores o pedido de municipalização. “Ele fez a solicitação, dizendo que tinha dados importantes que fariam com que fosse relevante o pedido de municipalização”, afirma.
A reportagem do Jornal Semanário acesso ao documento. Na justifica de pedido de municipalização está escrito que “o Estado não está abrindo vagas para novas turmas, cabendo ao Município absorver estas. Ainda, sabe-se que algumas salas estão vazias, mesmo com a necessidade de ampliação de vagas”.
No segundo trecho do ofício consta que “o melhor neste momento, seria municipalizar a escola. Transferir o comando para o Município e, em contrapartida, o Município assumiria as vagas do Estado”.
Durante a manhã e tarde de sexta-feira, 20, a reportagem tentou, inúmeras vezes, contato com o vereador Pelicioli. Entretanto, nenhuma ligação foi atendida. Da mesma forma, as mensagens enviadas também não foram respondidas.
Educandário estruturado
Como o educandário está bem estruturado, o diretor não vê motivos para justificar a mudança. “Com tantos espaços que o município tem, por que propor uma situação dessas para uma escola que tem recursos humanos completo, que não faltam professores? Temos em torno de 38 docentes e 400 alunos matriculados, atendidos diariamente. Os recursos financeiros estão em dia”, defende.
Outro ponto mencionado é quanto ao cenário da educação municipal, que não consegue suprir a crescente demanda de vagas. “O município se encontra em situação precária. Segundo o que consta nas reportagens, faltam professores, funcionários”, declara.
O diretor também cita que todas as vezes em que foram procurados pela prefeitura para fazer parceria com a chamada cessão de uso (modalidade em que a Prefeitura paga para utilizar outros espaços), para atender a demanda, sempre foram solícitos. “Já tivemos três turmas de Educação Infantil, por anos. Foi um processo que deu certo”, menciona.
Por fim, o diretor externa a preocupação com o que pode vir a ocorrer. “Não sabemos quais são os interesses reais de tudo isso. Se o município está tão preocupado em fazer essa reestruturação na educação, que faça nos lugares em que ele é responsável e deixe que as escolas do Estado sejam supridas e mantidas pelo Estado”, declara.
Audiência Pública
Na noite de quinta-feira, 19, foi realizada uma Audiência Pública no auditório da Escola Bento Gonçalves. Às 19h o diretor Leonildo deu início ao evento. Começou o discurso agradecendo a presença de toda comunidade, que lotou o auditório. Direção, professores, pais e alunos estavam carregados de faixas e cartazes, manifestando apoio para que o educandário permaneça sob gestão do Estado. Além disso, o diretor declarou surpresa por nenhum representante da Smed ter comparecido na ação.
O segundo a subir ao palco, o coordenador da 16ª CRE, Misturini, explicou ao público presente o porquê da realização da Audiência. “O fato de estarmos aqui é que preciso escutá-los, saber da vontade de vocês. O processo é democrático. Assim que recebi o ofício, chamei o diretor, ele foi o primeiro a saber”, disse.
Na ocasião, Misturini também contou qual a justificativa contida nos documentos. “Tenho aqui o ofício do prefeito (Diogo Siqueira) e também o que o vereador Ari Pelicioli encaminhou ao prefeito. No ofício diz que existe uma demanda excedente de 211 alunos de pré-escola e 557 no Ensino Fundamental. Essa demanda seria alocada com a municipalização. Além de assumir todos os nossos alunos e nossas modalidades de ensino, iria colocar nas nossas salas ociosas, a pré-escola. Aumentaria as vagas de 6° a 9° ano”, afirmou.
Por fim, o coordenador explicou o próximo passo. “Essa manifestação de vocês, que está bem clara aqui, de que não querem a municipalização, vai constar em ata. Toda essa documentação reunida vai ser enviada para Porto Alegre, para apreciação do Conselho Estadual de Educação, que toma a decisão final”, disse.
Demais manifestações
A vice-diretora da Educação de Jovens e Adultos (EJA), Neilene Lunelli, afirma que o sentimento é de revolta, principalmente porque os funcionários da escola não foram consultados a respeito do assunto. “Se querem colocar alunos excedentes, temos sala, dá para fazer sessão de uso, como era feito”, sugere.
Neilene ressalta que todos os envolvidos vão lutar para que a municipalização não se torne realidade. “A comunidade escolar, que é uma família, não quer que se municipalize. Estamos aqui por amor e vamos batalhar para que a escola permaneça estadual”, garante.
Presentes na Audiência Pública, Diana Rodrigues, mãe de dois alunos, foi enfática ao dizer que não concorda com a possível mudança. “Sou contra. O município tem que cuidar do que eles já têm ao invés de querer algo que é estadual, que o andamento está muito bom. Essa é a segunda casa dos meus filhos. Os professores são maravilhosos. Temos uma convivência muito boa com a escola”, garante.
Estudante do 7° ano, Bernardo Borges, matriculado no educandário há sete anos, não gostou da ideia de municipalização. “Acho a escola muito boa, não precisa da municipalizar”, disse. O colega, Kevin Cristian Lindoso, tem a mesma opinião. “Sou contra, porque a escola é melhor do jeito que está”, opina.
A diretora central do Centro dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul (CPERS Porto Alegre), Juçara de Fátima Borges, também compareceu ao evento, para prestar apoio ao ensino estadual. “Estamos aqui para dar apoio e lutar para que não haja a municipalização, até porque, a própria comunidade escolar não quer. Já está faltando profissionais na rede municipal, por que a prefeitura quer mais uma escola? Queremos que a escola permaneça como é”, opina.