O transtorno que promove o desejo intenso de comer, mesmo após o indivíduo sentir-se saciado, se caracteriza como um problema psicológico que também influencia negativamente na saúde

Comer um alimento saboroso leva a uma momentânea e boa sensação de bem-estar. Há quem já tenha comido até ‘passar mal’ para que o sentimento de prazer que a comida proporciona demorasse mais a acabar, mesmo depois de não estar mais com fome. Mas apenas isso não é o suficiente para caracterizar um transtorno alimentar.

Segundo a psicóloga Patricia Dotta os transtornos são caracterizados por uma perturbação persistente ou no comportamento relacionado à alimentação que resulta no consumo alterado de alimentos e que compromete significativamente a saúde física ou o funcionamento psicossocial. “São descritos critérios para diagnóstico dos transtornos alimentares, existem vários. Por exemplo, o alimentar restritivo, evitativo, anorexia e bulimia nervosa, e o transtorno de compulsão alimentar”, cita.

A compulsão alimentar, de acordo com a profissional, pode ser caracterizada com episódios recorrentes de consumo dos alimentos em um período determinado de duas horas, por exemplo, de uma quantidade de definitivamente maior do que a maioria das pessoas consumiria no mesmo período sob circunstâncias semelhantes. O objetivo é aliviar ansiedade, estresse e preocupações do dia. “O segundo ponto é a sensação de falta de controle sobre a ingestão. Um sentimento de não conseguir parar de comer. Esses episódios estão associados a três ou mais aspectos, como comer mais rapidamente do normal, até se sentir desconfortavelmente cheio, em grandes quantidades de alimentos na ausência da sensação física de fome, se alimentar sozinho por vergonha do que está comendo e sentir-se desgostoso de si mesmo, deprimido ou muito ocupado”, destaca.

Patricia pontua que o impulso por comer preenche algo interno, que é considerado um problema quando ele segue os determinados critérios do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais. “Existe um sofrimento muito significativo decorrente da compulsão alimentar e normalmente ela tem níveis de gravidades que vão se basear na frequência dos episódios. Um nível leve seria de um a três por semana, moderado de quatro a sete, grave de oito a 13, e o mais extremo de 14 ou mais”, explica.

A psicóloga analisa que muitas vezes o compulsivo come por motivos externos. “Uma coisa interessante que a gente pode fazer é poder pensar ‘isso que estou sentindo é fome ou ansiedade?”, recomenda. Além disso, ela aconselha a prestar atenção no que se está comendo. “Muitas vezes a pessoa come e está mexendo no celular ou assistindo televisão. Não tem aquele momento de poder parar, mastigar, se desligar e ter essa relação com a comida. Também tem a ver com uma questão neurológica, o cérebro precisa entender a quantidade que está comendo”, realça.

Apesar de buscar o autocontrole, em casos graves é necessário procurar ajuda para um profissional avaliar se há um transtorno. “Psicólogo ou psiquiatra vão orientar essa questão através de uma medicação, principalmente para o controle dos sintomas de ansiedade, depressão e de estresse. Então, aos poucos, a compulsão tende a cessar”, sugestiona Patricia.

A nutricionista Franciele Valduga recomenda, primeiramente, que se identifique quais são os conflitos que levam a pessoa a apresentar os episódios, que em sua maioria, são psicológicos ou de fundo emocional. “Contudo, dar atenção à saúde intestinal pode ser um grande aliado, pois é no intestino que muitos hormônios são sintetizados, inclusive os que geram sensação de felicidade ou bom humor, como, por exemplo, a serotonina: consumo adequado de água, de fibras (frutas, vegetais e sementes). Também é interessante regular ou aumentar o consumo de polifenóis, encontrados no chocolate amargo, frutas vermelhas e roxas, suco de uva 100% integral, chá verde e outros”, indica.

A profissional pontua também que comer demais pode fazer mal para o organismo. “Quando ingerimos alimentos em demasia do que nossas necessidades diárias, pode ocorrer o aumento de peso e o aparecimento de doenças metabólicas: resistência insulínica, diabetes, hipertensão, problemas cardíacos, distúrbios hormonais, entre muitos outros”, conclui.

Tratamento

Segundo o Ministério da Saúde, o tratamento do transtorno de compulsão alimentar, quando assim se configura, envolve o acompanhamento com psicólogo, psiquiatra e nutricionista. O primeiro passo é avaliar critérios diagnósticos, investigar a possibilidade de transtornos associados e compreender a complexidade da temática. Também é importante o apoio da rede familiar e uma abordagem sem estigmas para entender melhor o que se passa com essa pessoa e, assim, direcionar adequadamente o tratamento.

Foto: Thamires Bispo