Esta semana, nos despedimos de Luis Fernando Verissimo, um dos maiores cronistas brasileiros. Gaúcho, filho do também imortal Érico Verissimo — autor da saga O Tempo e o Vento —, Verissimo deixa um vazio irreparável na literatura nacional. Parte cedo, aos 88 anos, mas com um legado que o eterniza entre os grandes.
Luis Fernando provocava risos com ironia, escrevia com leveza sobre o cotidiano, as relações humanas, os encontros e desencontros da vida. Seus textos curtos eram repletos de humor inteligente e criatividade. Dominava a arte de falar do comum com profundidade rara. Verissimo acompanhou um Brasil em constante transformação. Cem anos atrás, nos tempos de seu pai, mais de 70% da população era analfabeta. Érico só alcançou o devido prestígio após sua morte, enquanto Luis Fernando, inicialmente conhecido como “o filho do Érico”, conquistou, em vida, seu próprio espaço — e a admiração de milhões.
Hoje, paradoxalmente, o Brasil atinge as menores taxas de analfabetismo da história, mas ainda enfrenta seu maior desafio: formar leitores. Ensinar a decifrar palavras é apenas o começo. O essencial é ensinar a ler o mundo — a interpretar, refletir, dialogar com ideias. Para isso, é preciso exemplo. Um professor ou um pai que não lê não ensina leitura. É como um personal trainer sedentário ou um nutricionista que não cuida da própria saúde.
Nossas crianças e jovens escrevem mais do que nunca, mas com graves deficiências. Leem, mas não interpretam. Perdem-se na ansiedade das redes sociais, no vício do imediatismo, na distração permanente do TikTok. A Finlândia já reconheceu o problema: após priorizar a alfabetização digital e observar retrocessos, voltou ao básico — lápis, borracha, caderno. A escrita manual molda o pensamento. Hoje, poucos conhecem o cheiro de um jornal fresco, o prazer de folheá-lo com calma, acompanhado de um café. A escola deveria apresentar nossos “influenciadores” literários — autores como Verissimo, especialmente os gaúchos —, não apenas para conhecer os célebres da nossa história, mas para se inspirar neles. Quem sabe, formar novos nomes para as futuras gerações.
Educação é o que separa um país da barbárie. Leitura é o que acalma a mente, desperta a criatividade, amplia o repertório para a vida. Na minha família, fui a primeira professora. Eu e meu irmão fomos os primeiros — e até agora, os únicos — a concluir uma faculdade. É sobre esse índice que falo. Como Estado, temos evoluído nos indicadores de proficiência. O caminho é longo, mas a educação é a única salvação. Não é a política. É a leitura. Não é a tecnologia. É o exemplo. Não é o discurso. É a prática.
Verissimo se foi, mas deixou um legado eterno. Ninguém sai o mesmo depois de ler um bom texto, um livro, uma crônica, um jornal. Uma de suas melhores crônicas, O Lixo, sempre me inspirou. Nela, um casal de vizinhos analisa o lixo um do outro, descobrindo o que o outro vive pelos resíduos que descarta. No fim, decidem unir os lixos e jantar juntos. Um retrato genial da vida. Escrevi certa vez algo inspirado nela, fazendo analogia aos carrinhos de supermercado.
Verissimo, assim, não morre nunca. Aquele que nos fez rir, hoje nos faz chorar. Aquele que sai da vida, mas escreveu livros, permanece para a eternidade.Obrigada, Mestre.