Após mais de 170 dias desde que a realidade no mundo foi transformada por conta da chegada do novo coronavírus (Covid-19), a esperança se volta cada vez mais ao avanço da ciência rumo à cura da doença. O conhecimento sobre o vírus, suas peculiaridades e os desafios da medicina no combate a ele, já sofreram mudanças ao longo desse período.
O bento-gonçalvense, professor doutor, médico e pesquisador na Universidade do Extremo Sul Catarinense (Unesc), Felipe Dal Pizzol, afirma que nunca se investiu tanto em saúde como nos últimos seis meses. “A quantidade de dinheiro tanto para tratar doenças imediatas quanto para pesquisas em um único tema é algo inédito. Certamente já se gastou muito mais com câncer ou doença cardiovascular, mas em um período de tempo maior. Porém, a presteza com que os órgãos de liberação ética estão lidando com os projetos, investimentos dos governos e a rapidez com que os pesquisadores estão escrevendo as propostas e recrutando pacientes, sim, sem dúvida”, analisa.
Cerca de 27 profissionais de diferentes áreas do conhecimento da Associação de Medicina Intensiva Brasileira, Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia e da Sociedade Brasileira de Infectologia, participantes do estudo Coalizão Covid Brasil, se manifestaram sobre análises realizadas de evidências científicas que existem, até agora, para suportar ou não o uso de diferentes estratégias do tratamento da Covid-19. Uma dessas estratégias foi efetivamente o uso da cloroquina ou hidroxicloroquina e da associação destes com azitromicina. “Com as evidências científicas que existem, até o presente momento, a recomendação dessas três sociedades, desse painel de experts, é contra o uso dessas medicações com uma rotina na prática médica, porque as evidências de que ela funcione ou não são muito baixas. Existe um risco associado ao seu uso e, possivelmente, pelo menos até os estudos hoje publicados, o benefício é inexistente”, aponta.
De acordo com Dal Pizzol, a cloroquina é originalmente um medicamento antimalárico, pois inibe a duplicação do plasmódio, e também se percebe que tem efeitos anti-inflamatórios, então, se usa muito em doenças reumatológicas, como reumatóide e lúpus. “Cloroquina e o hidroxicloroquina são “primos” e parecidos em estrutura e funcionalidade, só que um é o metabólico do outro. Então, no ponto de vista prático, a cloroquina é mais tóxica que o hidroxi”, expõe.
Quantidade de dinheiro tanto para tratar doenças quanto para pesquisas em um único tema é algo inédito.
Felipe Dal Pizzol, pesquisador e doutor em bioquímica
Protocolo do Ministério
O Ministério da Saúde divulgou na quarta-feira, 20, o protocolo que libera no Sistema Único de Saúde (SUS) o uso da cloroquina até para casos leves de Covid-19. Até então, o protocolo previa a medicação para casos graves. A mudança no protocolo era um desejo do presidente Jair Bolsonaro, defensor da cloroquina no tratamento da doença.
O novo protocolo mantém a necessidade de o paciente autorizar o uso da medicação. O termo de consentimento, que deve ser assinado pelo paciente, ressalta que “não existe garantia de resultados positivos” que “não há estudos demonstrando benefícios clínicos”.
No documento consta ainda que o paciente deve saber que a cloroquina pode causar efeitos colaterais que podem levar à “disfunção grave de órgãos, ao prolongamento da internação, à incapacidade temporária ou permanente, e até ao óbito”.
A origem do coronavírus na visão de Dal Pizzol
O coronavírus existe há milhares de anos, já tivemos previamente epidemias e pandemias por eles ainda na década passada, sars e mers, são os exemplos mais recentes. “O Influenza também sempre existiu e ocasionalmente mutações nele fazem com que exista uma epidemia ou pandemia. Então, não tem porquê imaginar que com o coronavírus seja diferente. Parece muito mais provável que isso seja o ciclo natural, relacionado a hábitos da sociedade moderna, com maior exposição a animais silvestres. Temos que lembrar que o reservatório do coronavírus são os animais silvestres, principalmente morcegos. Sendo assim, a exposição a ambientes assim ou desmatamento e aquecimentos das cidades, fazem com que esses animais percam seu habitat natural, nos colocando em mais contato com eles. Então, possivelmente, essa é a explicação mais razoável”, destaca o pesquisador Dal Pizzol
Ele não descarta que possa existir uma criação em laboratório. “Mundialmente, existem laboratórios com alta segurança que estudam vírus altamente patogênicos e se há um rompimento de segurança pode haver contaminação não intencional. Mas, uma mutação e uma contaminação de pessoas intencionalmente, acho que é algo muito fora da realidade”, pondera.
Efeitos colaterais
Os paraefeitos são parecidos com outros medicamentos. Dal Pizzol sublinha que os efeitos são desde leves, como dor de cabeça, náusea e vômito, diarreia, dor abdominal a graves como arritmia, alteração da visão, principalmente quando usado a longo prazo. “Via de regra, são considerados, para esses usos convenciOnais, como medicamentos relativamente seguros. No entanto, não sabemos como são os paraefeitos em outra situação, como o caso da Covid-19”, ressalta.
O doutor garante que “as medidas de prevenção ainda são a melhor arma para combater a pandemia”. Do ponto de vista individual, lavar bem as mãos com água e sabão, álcool 70%, sempre que possível o distanciamento e o isolamento social são formas de evitar a propagação do vírus. Além disso, “manter o ambiente arejado, diminui a carga viral no ambiente, é comprovadamente eficaz e o lockdown, do ponto de vista governamental, existem evidências de que possam funcionar”, acrescenta.
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