Apenas em uma loja do município, que comercializa armamentos, a procura pelos arsenais apresentou crescimento de 30% nas vendas. Tendência também é realidade no restante do país.
Desde que assumiu o mandato, o presidente Jair Bolsonaro vem assinando uma série de decretos que flexibilizam e ampliam o acesso às armas de fogo para a população brasileira em geral. Desde então, como possível reflexo, a demanda para aquisição e registro de arsenais está em constante crescimento.
Na região da Serra Gaúcha, dados cedidos pela Delegacia de Polícia Federal (PF) de Caxias do Sul, que abrange 57 municípios, incluindo Bento Gonçalves, mostram que durante todo ano passado, foram feitos 1.317 registros de novas armas para residência ou local de trabalho. Isso significa uma média de 109 armas novas por mês. Em 2020, até o dia 28 de agosto, foram 1.171 aquisições, ou seja, cerca de 146 mensais.
Os números também apontam crescimento das autorizações para porte de armamento, que é a liberação para transitar em vias públicas com a arma de fogo. Em todo ano de 2019 foram 94 registros deferidos. Uma média de sete autorizações mensais. Esse ano, igualmente até o dia 28 de agosto, foram 76, portanto, cerca de nove liberações ao mês.
Especificamente na Capital Nacional do Vinho, quem percebe essa realidade é o comerciante da loja Construpesca – Loja de artigos esportivos, Henrique Vinicius Dick, 34 anos. Ele revela que em 2019, quando em comparação com 2018, período anterior as flexibilizações, a procura por armas cresceu na loja.
Contudo, Dick assume que este ano está sendo ainda melhor e acredita que a pandemia do coronavírus pode ter influenciado positivamente no aumento das vendas. O acréscimo até o momento foi de 30%. “Nos dias em que estivemos abertos, a venda de armas foi ótima. O povo parou um pouco em casa, pensou e voltou a comprar armamento. Está sendo um ótimo ano, muito melhor que ano passado”, constata.
Questionado se existe um perfil de quem mais está adquirindo as armas, Dick afirma que 70% da procura é feita pelo sexo masculino e 30% pelo feminino. Já a faixa etária varia entre 29 e 45 anos. Além disso, acrescenta que entre as armas de fogo mais comercializadas na loja, está a Pistola 9 milímetros G2C.
RS na mesma direção
A realidade do Rio Grande do Sul não é diferente. Entre janeiro e junho deste ano, foram registradas 7.579 novas armas, o que representa aumento de 242% a mais do que no mesmo período do ano passado, quando foram feitos 2.216 registros novos.
Aumento de 200% no Brasil
Dados do Sistema Nacional de Armas (Sinarm), apontam que no Brasil, a venda de armas controladas pela PF saltou de 24.663 unidades no primeiro semestre de 2019, para 73.985 durante o mesmo período deste ano. O aumento representa quase 200% e é o maior registrado desde 2009.
Na conta acima, não está incluso o armamento adquirido por colecionadores, atiradores e caçadores (CACs) e nem por órgãos militares estaduais de segurança pública, como policiais militares e bombeiros.
Das 73.985 armas comercializadas no primeiro semestre deste ano, 45.733 ou quase 62% foram compradas por cidadãos. Outros 23% do total, 17.111 foram compradas por órgãos públicos não militares. Os outros 11% foram para servidores públicos autorizados a portar armas pessoais devido ao risco no exercício da profissão.
Ter arma é ter segurança?
A pergunta foi feita ao professor de direito e processo penal da Universidade de Caxias do Sul (UCS), advogado e Capitão da Reserva da Brigada Militar (BM), André Roberto Ruver. Na avaliação dele, estar armado não significa diretamente estar mais seguro. Entretanto, ele acredita que “oportuniza aquele que possui arma, chance de não se ver vilipendiado, humilhado e ofendido, desde o seu direito a vida, a sua incolumidade física a defesa de sua família e do seu patrimônio”, opina.
Questionado se as pessoas têm preparo para o porte ou posse de uma arma, Ruver afirma que é preciso aperfeiçoar critérios. “Principalmente para o porte, salientando que a legislação traz filtros importantes que, por si só, limitam tais possibilidades”, avalia.
Opiniões divididas
A reportagem do Jornal Semanário foi às ruas de Bento conversar com a comunidade para descobrir a opinião de quem é favorável ou contra o armamento da população e porquê.
Foram ouvidas dez pessoas, com idades entre 17 e 65 anos. Dessas, cinco defenderam o uso de armas como instrumento de defesa familiar. Por outro lado, quatro pessoas responderam ser contra, também baseados na segurança. Uma única pessoa foi imparcial no questionamento.
Confira as opiniões:
Eduardo Francisco Policarpio, 23 anos, barbeiro
Sou a favor, porque hoje em dia, vivemos um momento onde está muito fácil o acesso de armas para o pessoal que vive no crime. A gente trabalha bastante para conquistar certas coisas, como telefone, carro, casa, para qualquer um entrar e fazer o que quiser, então por esses motivos, sou a favor do armamento.
Dione Elias Ávila dos Santos, 43 anos, metalúrgico
Sou a favor porque é bom, a população tem que ter um amparo, porque hoje nem em todos os lugares as pessoas têm o amparo da brigada militar.
Janaina Turchiello, 37 anos, técnica em enfermagem
Sou a favor, não em geral, para todo mundo, mas acho que quem tiver um conhecimento, um grau de instrução, deve ter arma sim, porque é uma forma de proteção, acho bem interessante, todo mundo deveria ter, pessoal do interior principalmente.
Ilda Josefina Pegoraro Pastorello, 54 anos, autônoma
Sou a favor, com certeza. A criminalidade está cada vez maior e a gente tem que se proteger. Sou totalmente a favor, porque os criminosos andam armados e nós temos que proteger nossas famílias, nossos lares.
Jair Cavalli, 65 anos, aposentado
Sou a favor ao armamento da população de bem, porque a pessoa que sabe usar uma arma e que tem condições de ter, pessoas de caráter, idôneas e que saibam usar na hora que precisa, para defesa pessoal, pois vejo que isso inibe bastante os assaltos a mão armada, a invasão de domicílios, então isso é bom para proteção das pessoas, elas têm direito a essa proteção, entendo que seja o correto.
Janete Faretto, 60 anos, funcionária pública
Sou contra, porque não precisa, arma é para os ladrões, de repente vão te assaltar e vão te matar, então sou contra o armamento.
Ana Carolina Pasine Ferreira, 29 anos, operadora de máquina
Sou contra, primeiro porque tenho filhos, acho que é muito inseguro ter uma arma em casa, não penso só em mim, mas na população inteira, então sou contra.
Camilly Eduarda Pimentel, 17 anos, estudante
Sou contra, porque penso que quando acontece alguma coisa, como brigas no transito, a pessoa já vai tirar a arma para tentar acertar a outra pessoa, por isso que não sou a favor.
Juarez Bento, 43 anos, pedreiro
Sou contra, porque hoje em dia têm muitas pessoas que tomam remédio para depressão, que são fracas de memória, tem problemas na família, então se tiverem uma arma em casa, fica mais fácil para cometerem um crime, então sou contra.
Francisco Roberto Claus, 61 anos, assessor
Violência gera violência, mas em outros casos, acho que é interessante ter uma arma para defender a própria família, os filhos. Com o momento que estamos vivendo no país, fico em cima do muro às vezes, porque ter uma arma, gera violência e é perigoso, mas não ter também é perigoso. Então é bem difícil. Não sou contra quem quer ter, mas eu não compraria para mim, não teria em casa.