Caro bom velhinho,
Espero que esta carta lhe encontre bem!
Aliás, há quanto tempo, não é mesmo?
Da última vez que lhe escrevi, pedindo insistentemente para não se esquecer da minha Caloi, a tão sonhada primeira bicicleta me acordou com aquela buzina tipo campainha, cuja cor verde, entremeio àquele pequeno pinheirinho com barbas acinzentadas, tomou conta de meus olhos, emudeceu a minha voz, desenhou meu melhor sorriso Colgate, opa, Kolynos e foi, por alguns anos, uma paixão acorrentada de ciúmes por todo lugar em que a estacionava.
De lá para cá, nunca mais lhe escrevi.
Sei que irás me entender, afinal, bom velhinho, não sei se fazes algum tratamento de pele – vives sempre corado e sem maiores rugas –, qual o chá que tomas, que tipo de exercício te mantém forte, a carregar tanto peso, e de que dieta te alimentas – será que é a mediterrânea? Entretanto, lhe conheço há mais de 50 anos, e continuas o mesmo, jamais “envelhece”. Contudo, as suas crianças sim e acontece algo que jamais imaginávamos ocorrer até a época dos dentes de leite, seguindo o ciclo de banguela, saindo da fase dentuça e passando pela fase da “aborrecência”, a cada ano, mesmo que imperceptivelmente, não bastasse nos distanciarmos, nos tornamos papais-noéis de nós mesmos.
A propósito Papai Noel, mesmo que fiques decepcionado pela falta de notícias por todo este tempo, espero que entendas e tenhas sentido saudades das minhas cartas, pois, de minha parte, não são poucas as saudades dos papéis de carta que lhe escrevi.
Lembro-me bem. Lá estavam delineados grandes sonhos nas escolhas simples em formato de brinquedos e, se não me engano… até mesmo lhe confidenciei o nome daquela menina, minha colega da primeira série, recordas, a qual namorei até a quarta… embora ela nunca soubesse.
Sim, lhe confesso, aos poucos descobri suas artimanhas para dar a volta ao mundo sem deixar rastros e, assim, com o passar do tempo, os papéis de carta se tornaram lembranças, pois foram substituídos pelo papel das escolhas, escritas ou não, são agora remetentes e destinatários do próprio destino.
Ah… Papai Noel, os presentes, tão ansiados naquela noite que parecia congelar os ponteiros às 23:59, não chegam mais pela entrada da chaminé daquele fogão à lenha que imaginávamos ser uma grande e bela lareira daqueles filmes de que és protagonista às vésperas do Natal. Não é de hoje, sonhos acordados, perseguidos dia a dia, chegam pelas próprias escolhas na árvore da vida e numa velocidade, que agora, parece uma corrida dos ponteiros entre si, onde tudo passa muito rápido pela janela do tempo…
Daquele sonho distante e realizado da bicicleta verde do outrora jardim da infância, outros tantos sobrevieram, seguiram e seguem um após outro; estes por sua vez, não perdem a cor, tão pouco enferrujam, amadureceram pouco a pouco e a cada novo ciclo passaram e passam a ser conquistas pessoais, que vão se acumulando na árvore da vida, a qual, esta sim envelhece na incerteza de seu tempo, talvez mais, talvez menos…é da natureza.
E antes que eu me esqueça Papai Noel, desculpe me estender, sabes bem, sempre fui assim, não é? Mas por favor, pelo menos neste Natal, reconsidere minha idade como sendo uma espécie de infância acumulada e…sem mais delongas, lá vai meu pedido: ao passar pelo céu, dê um alô, um oh, oh, oh, seguido de um grande e apertado abraço às Estrelas que por aqui passaram, diga-lhes que jamais esqueceremos que todas as conquistas depositadas ao pé das nossas raízes, vieram embrulhadas pelo primeiro presente que deles recebemos, o AMOR, e, por último, se não for pedir demais, peças ao PAPAI de todos os Noéis que, por mais escuro que possa parecer o mundo lá de cima nos últimos tempos, que jamais a ESTRELA MAIOR deixe de brilhar em nossos corações!
FELIZ NATAL e ILUMINADO ANO NOVO!