Lei Romeo Mion prevê criação da carteira de identificação que assegura direitos a esse público
Mais uma conquista ao público autista é alcançada. A Lei 13.977/2020, denominada Romeo Mion, em homenagem ao filho do apresentador Marcos Mion, completou um mês de sanção do presidente Jair Bolsonaro no sábado, dia 8.
A diretriz prevê a criação e emissão gratuita da Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (Ciptea), que assegura aos portadores atenção integral, pronto atendimento e prioridade no acesso aos serviços públicos e privados, antes destinados a apenas a outras deficiências, em especial nas áreas de saúde, educação e assistência social.
A carteira será expedida, sem prazo definido, pelos órgãos estaduais, distritais e municipais que executam a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista.
Em Bento Gonçalves, o secretário Municipal de Esportes e Desenvolvimento Social, Eduardo Virissimo, expõe que “as Secretarias Municipais aguardam a publicação da lei pelos entes estaduais e federativos para implantar no município e obterem orientações de como se dará todo o processo de expedição da Ciptea”.
Após isso, a família deve apresentar um requerimento acompanhado de relatório médico com a indicação do código da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID). No requerimento deve constar nome completo, filiação, local e data de nascimento, número da carteira de identidade, número de CPF, tipo sanguíneo, endereço residencial e telefone, além de foto 3×4, assinatura ou impressão digital do interessado.
A carteira terá validade de cinco anos, mas a família deve manter atualizados os dados cadastrais do identificado. Sempre que renovada, o número de identificação deve ser mantido, para permitir a contagem das pessoas com transtorno do espectro autista em todo o território nacional.
Até que o Ciptea comece a ser emitida, a lei recomenda que os órgãos responsáveis pela emissão de documentos de identidade incluam nas cédulas informações sobre o transtorno do espectro autista.
O texto também colabora para o acesso à cultura para pessoas com autismo, obrigando cinemas a oferecer, uma vez por mês, sessões específicas para pessoas com autismo, com todas as adaptações necessárias para melhor acomodar esse público.
O Transtorno Espectro Autista (TEA) afeta aproximadamente 2 milhões de pessoas no Brasil.
Vitória para as famílias
Luís Henrique Tomazelli Gonçalves, de 14 anos, foi diagnosticado aos sete anos de idade com Síndrome de Asperger, um estado do espectro autista, geralmente com maior adaptação funcional. Desde então, diversas batalhas vêm sendo travadas, no entanto ganhas.
A mãe Adriana Tomazelli é educadora infantil e professora de séries iniciais e comemora a conquista. “É importante lançar o olhar sobre o autismo. Por muito tempo, ele [autismo] ficou desconhecido. A partir do momento em que foi colocado nas escolas e teve um nome, as pessoas se interessaram em saber mais. Mas ainda é muito pouco. Por isso, cada lei que vem favorece o foco sobre isso”, ressalta.
O autismo tem vários níveis de dificuldades, e mesmo dentro de um mesmo grau, cada autista é diferente. “Como a síndrome não tem traços físicos, a Lei vem de encontro à identificação às outras pessoas, e que essas possam compreender melhor eles”, acrescenta Adriana.
Muito se fala em ‘o autista vive no seu mundo’. Não, não é verdade. O autista está neste mundo e nós precisamos aprender a lidar com ele.
Fobias, ansiedade, dificuldades de relacionamento, interesses repetitivos e hipersensibilidade ou hipossensibilidade são algumas das características do autista. O adolescente relata a dificuldade que enfrenta devido ao transtorno. “Principalmente em filas de espera de atendimento, pois ainda não dá para pegar a preferencial. Então a carteira ajuda bastante, pois mostra que a pessoa tem autismo”, destaca.
Por ter um nível leve do transtorno, Gonçalves frequenta uma escola regular. No município, a Escola Municipal de Ensino Fundamental Especial Caminhos do Aprender atende 14 crianças de seis a 17 anos com Transtornos Globais de Desenvolvimento (TGD) moderado e grave.
A diretora Isabel Caon acredita que não existe uma ‘receita’ para ensinar crianças e adolescentes com TEA. “O trabalho pedagógico é individualizado de acordo com as características de cada um”, afirma. Isabel acrescenta que, infelizmente, há Lei para tudo. “Isso se torna uma obrigação. Mas basta olhar ao nosso redor e perceber que existem pessoas diferentes. Temos direitos, tendo deficiência ou não, cada um com a sua particularidade”, frisa.
Preconceito ainda existe
Gonçalves conta que a maior dificuldade não é em ser autista. “Sempre quando eu apresento, digo que sou autista, mas parece que não prestam atenção, então acho que eles não dão bola. Sinto que eles me excluem por eu questionar demais e apresentar um comportamento diferente”, lembra.
Adriana comenta que há ainda preconceito na sociedade. “Muitos acham que é frescura, que ele é birrento, é teimoso, pergunta demais e que isso atrapalha a aula. Não entendem ou não se propõem a entender que ele precisa das respostas para organizar o pensamento, por exemplo. É mais cômodo afastar o problema do que procurar ajudar”, lamenta.
A luta continua
A nova legislação estabelece que os estabelecimentos públicos e privados referidos na Lei nº 10.048/2000, poderão valer-se da fita quebra-cabeça, símbolo mundial da conscientização do transtorno do espectro autista, para identificar a prioridade devida às essas pessoas.
Os familiares que convivem com autistas, devem ficar atentos a essas situações para que o direito seja assegurado por completo.
Fotos: Franciele Zanon Gonçalves