Com regulamentação prevista para 2025, o mercado de apostas esportivas vive uma ascendente, mas também enfrenta questões como vício, manipulação no esporte e impactos financeiros na vida dos brasileiros

O mercado de apostas esportivas, conhecido popularmente como “bets”, tem ganhado destaque no Brasil nos últimos anos, tanto pelo crescimento expressivo quanto pelos desafios sociais e econômicos que representa. Com a regulamentação desse setor prevista para iniciar em janeiro de 2025, a expectativa é que o país finalmente tenha um controle mais rígido sobre as operações, trazendo mais segurança aos apostadores e ampliando a arrecadação de impostos.

Um levantamento do Instituto DataSenado revelou que cerca de 20,3 milhões de brasileiros acima de 16 anos já realizaram apostas esportivas, representando 13% da população nessa faixa etária. Entretanto, o estudo aponta uma preocupação alarmante: 42% dos que apostaram recentemente foram endividados, com contas atrasadas há mais de 90 dias.


O perfil dos apostadores indica que a maioria (68%) exerce alguma atividade remunerada, enquanto 32% estão desempregados ou fora da força de trabalho. Brasileiros com renda familiar de até dois salários mínimos lideraram as apostas (52%), seguidos pelos que têm rendimentos entre dois e seis salários mínimos (35%).

Além disso, o nível educacional também varia: 23% possuem até o ensino fundamental incompleto; 18% possuem o fundamental completo; 40% concluíram o ensino médio e 20% possuem ensino superior incompleto ou completo.

Desde que as apostas de cota fixa foram autorizadas no Brasil em 2018, o mercado cresceu de maneira descontrolada, explorado principalmente por empresas estrangeiras. Somente em 2023 o Congresso e o Executivo avançaram na regulamentação, sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Volmir Beal, sócio da Gabbardo, Beal e Rodrigues Advogados, explica. “Embora jogos de azar sejam proibidos no Brasil, as apostas esportivas de cota fixa foram legalizadas. Essas apostas consistem em prever resultados esportivos e estão enquadradas como uma modalidade lotérica. Essa distinção permite sua operação legal, desde que autorizadas pelo governo”, explica.

A partir de outubro de 2024, sites que não solicitaram autorização ao Ministério da Fazenda já estão proibidos de operar, com o mercado legal programado para abrir em janeiro de 2025. A expectativa é que a regulamentação reduza práticas ilegais e amplie a fiscalização, minimizando os danos sociais associados. O advogado, Eduardo Gabbardo Barbosa, diz que a regulamentação é essencial para evitar manipulação de resultados, lavagem de dinheiro e exploração de apostadores por plataformas ilegais. “A fiscalização rigorosa, aliada à educação sobre os riscos das apostas, é o caminho para um mercado mais saudável”, destaca.

Embora as apostas esportivas sejam promovidas como entretenimento, seus impactos sociais geraram preocupação crescente. Jogos como o “Tigrinho” ou apostas em eventos esportivos aparentemente inocentes se transformam em compulsões, levando as pessoas a gastarem esforços inteiros, reservas financeiras e até bens materiais. No campo esportivo, a situação também é crítica. Escândalos de manipulação de resultados e envolvimento de atletas em esquemas ilegais mostram como as apostas podem prejudicar a integridade do esporte.

Com a regulamentação, o governo busca mitigar os problemas associados às apostas, como a dependência e os golpes digitais, enquanto tenta aproveitar os benefícios econômicos desse mercado, que movimenta bilhões de reais anualmente. A estratégia inclui a divulgação de listas de sites autorizados, além de campanhas educativas para conscientizar a população sobre os riscos.
Porém, os especialistas alertam: o sucesso da regulamentação depende de uma fiscalização eficaz, da criação de redes de apoio a apostadores compulsivos e de uma mudança cultural que promova o consumo consciente desse tipo de entretenimento.

O mercado de apostas é, ao mesmo tempo, uma oportunidade econômica e um desafio social. Com a regulamentação prevista para entrar em vigor, o Brasil tem a chance de equilibrar esses dois aspectos e minimizar os danos causados por anos de descontrole.

A regulamentação prevê obrigações tanto para as empresas quanto para o governo, como o desenvolvimento de campanhas educativas, limites de apostas e ferramentas de autoexclusão. “Empresas devem alertar sobre os riscos do vício e evitar publicidade que incentive apostas irresponsáveis”, afirma Everton Mora Rodrigues, especialista em direito empresarial.

A voz de quem aposta
Bruno Alves, de 19 anos, compartilha como entrou no universo das apostas e os efeitos disso em sua vida. Ele começou ainda menor de idade, utilizando a conta de um irmão mais velho. “O que me atraiu foi a ideia de me divertir com algo que entendo. Sempre pensei, ‘eu sabia que isso ia acontecer’, e vi uma chance de ganhar dinheiro com isso”, declara.

Alves destaca que as apostas mudaram sua relação com os esportes, ampliando seu interesse por novas modalidades: “Antes, apostava apenas em futebol. Hoje, aposto em três ou mais esportes e me sinto mais próximo dessas modalidades”, explica.

Apesar disso, ele enxerga as apostas mais como diversão do que como algo profissional. “Nunca tentei levar isso a sério, mas sei que existe metodologia e controle psicológico que ajudam quem busca apostar de forma mais consciente”, indica.

O jovem também comenta a “adrenalina” que as apostas proporcionam, mas reconhece os riscos. “A frustração com a perda, o famoso ‘red’, é o que mais afeta os apostadores. Muitos tentam recuperar o dinheiro e acabam perdendo ainda mais”, declara.

Felizmente, ele afirma ter autocontrole, utilizando apenas dinheiro que não fará falta. “Já parei de apostar, conheço e sei desse meu autocontrole, mas depende muito se eu quero parar ou não. Se eu tiver que depositar para apostar, talvez não faça, mas caso a casa de aposta disponibilize algum bônus, gosto de tentar fazer e ver aquele dinheiro multiplicar”, conta.

Para Bruno Girondi, de 20 anos, as apostas sempre foram uma forma descontraída e divertida de se envolver com os esportes. “Comecei a apostar na brincadeira, com amigos, para tornar os jogos mais emocionantes. Era algo descontraído e divertido”, conta. Girondi, ao contrário de muitos, não viu as apostas como uma forma de renda extra ou diversão descontrolada. “Sempre soube colocar limites. Nunca senti que as apostas impactaram negativamente a minha vida”, afirma.

Em relação ao sentimento que as apostas podem causar, ele nunca sentiu que as apostas o levavam a agir de forma impulsiva ou compulsiva. “Nunca senti que as emoções me levassem a apostar mais ou de forma descontrolada”, explica.