Especialistas apontam principais entraves que os eventos climáticos de maio provocaram na logística de organização e outros fatores que fazem parte deste momento

As eleições municipais ocorrem dia 6 de outubro, ou seja, faltam cerca de dois meses e meio para o dia que escolherá os novos gestores em todo o país. Com todos os problemas que a chuva acarretou para o Rio Grande do Sul, dúvidas cercam o evento, por conta das inúmeras cidades afetadas e pela destruição de pontos de votação. Além disso, a última eleição municipal foi marcada pela pandemia de Covid-19, em um momento onde sair de casa não era seguro, ocasionando, em Bento Gonçalves, por exemplo, alto índice de abstenções, com 19.910 eleitores faltantes no pleito, número maior que o candidato mais votado à prefeitura.

Para o chefe do 8º Cartório Eleitoral de Bento, Ricardo de Abreu, os desafios eleitorais seguem os mesmos dos outros anos, sem novas dificuldades


Segundo o chefe do 8º Cartório Eleitoral de Bento, Ricardo de Abreu, avalia que as dificuldades para as eleições municipais são semelhantes das anteriores. “Os desafios permanecem os mesmos, pois a logística do processo eleitoral envolve tanto a vistoria e requisição dos locais de votação como a convocação e treinamento de muitos cidadãos para atuarem a serviço do pleito. O processo de distribuição e recolhimento das urnas e de suporte técnico no dia da eleição também pressupõe um bom planejamento logístico”, explica.

Sobre os incidentes com a chuva, Abreu reforça que algumas regiões afetadas terão seus locais de votação alterados. No entanto, na Capital Nacional do Vinho, até o momento, não há indicativo de mudanças. “Em Bento, todos os eleitores de Tuiuty e de Faria Lemos votarão na respectiva sede do distrito. Em Santa Tereza, Monte Belo do Sul e Pinto Bandeira não serão necessárias alterações”, destaca.
Quando abordado sobre os números de abstenções maiores que os que elegeram o prefeito, Abreu entende que não necessariamente é um problema a ser enfrentado atualmente. “Na última eleição municipal o cenário era de pandemia o que certamente contribuiu com aumento da abstenção. Por isso, acredito que este percentual deve ser menor neste ano”, diz.

Ele conclui relatando que não vê quaisquer dificuldades em relação ao evento, mas aponta preocupações. “Não vejo as eleições como um desafio para Bento Gonçalves, e sim como uma oportunidade de escolher representantes que receberão poderes legítimos para atuar na gestão pública e em favor do interesse público. Um aspecto que talvez seja desafiador ou preocupante é a educação política dos jovens, pois percebe-se a cada ano que passa, um aumento na falta de interesse na política e, por consequência, de entusiasmo com relação a participação do processo eleitoral”, finaliza.

Principais desafios

O professor e pesquisador, Felipe Taufer, destaca como uma das dificuldades a descrença da população na política eleitoral

O professor e pesquisador no Programa de Pós-Graduação em Filosofia da Universidade de Caxias do Sul, Felipe Taufer, vê a situação das chuvas como um grande desafio para os candidatos contornarem. “São duas: uma ambiental e a outra econômica e social, mas elas estão internamente conectadas. Acredito que a principal dificuldade que qualquer candidato, seja ao Legislativo ou ao Executivo, enfrentará é a escolha sobre qual será a resposta prioritária aos efeitos e às causas da catástrofe ambiental que assolou o Rio Grande do Sul e, por tabela, Bento Gonçalves. Essa resposta não gira somente em torno de como a cidade lidará com deslizamentos de terra, impactos agrícolas (Faria Lemos, por exemplo) e reconstrução de vias, estradas e acessos. Ela engloba também que tipo de orientação política guiará os eventuais alocamentos de refugiados climáticos na cidade, já que o planejamento urbano deve possibilitar moradia segura e também combater a especulação imobiliária, medidas preventivas para lidar com riscos geológicos, sistemas de distribuição e tratamento de águas, transporte público, entre outras questões de planejamento”, explica.

Apesar das pré-candidaturas, até o momento anunciadas, estarem divididas, o professor não vê a situação como polarizada, visto que, os lados são bem semelhantes politicamente. “Tendo em vista que a maioria dos outros partidos possui um alinhamento ideológico significativo, ao menos nas assim chamadas “pautas culturais”, é possível dizer que a polarização eleitoral é um fenômeno inexistente em Bento. O que existe é uma disputa, dentro do espectro político da direita, pelo apoio do ex-presidente Jair Bolsonaro, o que contará bastante para qualquer um dos candidatos. Desmoralizado, o único partido mais ou menos significativo que caberia apenas pragmaticamente classificar à esquerda do espectro político, o PT, não possui qualquer apoio significativo da população”, constata.

Taufer tenta entender o que levou a última eleição municipal a ter números tão diferentes do normal, e explica que a abstenção de 22,25% ficou bem próxima da média de abstenção brasileira para municípios com até 200 mil eleitores. Mas, se comparada a região Sul, que foi em torno de 15%, ela é considerada alta. E ressalta que mesmo cidades menores do estado, não pertencentes à região metropolitana, com populações relativamente pequenas, apresentaram uma maior participação eleitoral. “Além disso, se lembrarmos que em 2020 Bento contou com oito candidatos a prefeito e que, desde as eleições de 2000, o seu número máximo de candidatos a prefeito não passou de cinco (foi o caso de 2012), é possível constatar que um dos elementos atípicos de 2020 foi um aumento expressivo da concorrência eleitoral”, realça.

Ele finaliza trazendo que nota as pessoas cada vez mais próximas da política, mas cansada do modo como é conduzida em anos eleitorais. “Creio que as abstenções e o eventual desânimo e interesse público são em relação à política eleitoral. Isso não quer dizer que a população tenha se afastado da política, pois ela é uma esfera da ação humana que, na maioria das vezes, não encontra expressão nas dinâmicas de representação partidária. As rejeições, polarizações, revoltas e levantes dos últimos anos apontam para uma maior politização da sociedade. Penso que aquilo que muitas vezes é percebido e classificado como um afastamento na política é um sintoma da falência de um modo de se fazer política”, conclui.