Sempre culpadas de tudo. Estado falido? Culpa das professoras. Orçamento quebrado? Culpa das professoras. Má qualidade de ensino? Culpa das professoras. Repetência? Culpa das professoras. Falta de atendimento individualizado? Culpa das professoras. É tanta (des)culpa que daqui a pouco, as professoras serão responsabilizadas pela maluquice do norte-coreano e fanfarronice do norte-americano. Estamos mesmo sem norte.
Refletindo sobre esse fardo imputado injustamente aos professores, lembrei de um texto que faz parte de “Confissões de um Vencedor” (2007). Como já relatei anteriormente, as histórias são baseadas em fatos reais e narradas em primeira pessoa, pelo personagem Zé da Mata. A palavra é tua, Zé!
“Na cidade, tive experiências de vida e, no acampamento, aulas de verdade, que me ensinaram a aprender em dobro.
Nesse tempo, conheci pessoas que eram donas de grande coração. Havia sempre lugar para mais alguém. Entre elas, uma professora. Baixinha, gordinha, de fala mansa, ela representava o idealismo do mestre.
As aulas aconteciam numa sala cedida de um prédio de poucos andares, de acesso fácil, desde que fosse pelos meio naturais: porta e escadas. Mas mãos-leves preferem as vias menos convencionais e por isso são ágeis escaladores. Eles não se intimidam diante de meia dúzia de obstáculos.
Numa noite, a mestra se desdobrava numa aula de matemática, expondo o sistema de medidas. De repente, sua bolsa, que estava na medida exata de uma mão furtiva, vinda sabe lá de onde, deslizou para além das grades.
Todo mundo ficou aí vendo de boca aberta. Sem ação.
Depois do espanto, veio a reação. Mas, tarde demais. A bolsa já devia estar no prego.
A professora, aconselhada a registrar a ocorrência, precisou responder a algumas perguntas:
– A senhora viu o meliante? – questionou o homem diante da máquina de escrever (que seria logo substituída pelo computador).
– Rapidamente – respondeu ela.
– Descreva o que viu! – ordenou.
A professora pensou por uns instantes e depois respondeu:
– Bom, eu vi três: falange, falanginha, falangeta…
O homem ergueu a cabeça incrédulo.
– Falanges roubando bolsa de professora?
– Inacreditável, não é verdade? – disse ela.
– Uma quadrilha inteira?! Brincar com a autoridade dá cadeia, minha senhora! – alertou ele.
Com a calma que a caracterizava, ela explicou:
– Meu senhor, vou ser mais didática…
– Pois seja! – gritou ele, irritado.
– Como já lhe disse, só vi três: o vizinho, o pai-de-todos e o fura-bolos…
Enfim “a ficha caíra”. Primeiro, o escrevente ficou indignado, depois até sorriu. Mas, no final, ainda deixou escapar uma farpa:
– Professoras! Pensam que sabem tudo!”