No TAC, as três empresas assumiram 21 obrigações de fazer e de não fazer para aperfeiçoar o processo de tomada de serviços
O Ministério Público do Trabalho (MPT) firmou na noite desta quinta-feira um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) com as Vinícolas Aurora, Garibaldi e Salton, que contratavam os serviços terceirizados da Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde Ltda, empresa flagrada mantendo trabalhadores em condição degradante em um alojamento em Bento Gonçalves, na sua maioria oriundos do Estado da Bahia, em operação de resgate realizada no último dia 22 de fevereiro.
A investigação do caso está sob responsabilidade do Grupo Especial de Atuação Finalística, força-tarefa composta por procuradores do MPT no Rio Grande do Sul e na Bahia: Ana Lúcia Stumpf González, Greice Carolina Novais de Souza Ribeiro, Franciele D’Ambros, Francisco Breno Barreto Cruz, Lucas Santos Fernandes e Manuella Britto Gedeon.
O acordo foi firmado após mais de oito horas de audiência telepresencial com os representantes legais das três vinícolas. No TAC, as três empresas assumiram 21 obrigações de fazer e de não fazer para aperfeiçoar o processo de tomada de serviços, com a fiscalização das condições de trabalho e direitos de trabalhadores próprios e terceirizados, e impedir que novos casos semelhantes se repitam no futuro. Outro objetivo expresso no documento é monitorar o cumprimento de direitos trabalhistas na cadeia produtiva. As obrigações pactuadas passam a valer imediatamente.
A assinatura do TAC garante o cumprimento imediato de suas obrigações com a mesma força de uma sentença judicial, e de modo mais rápido. O acordo estabelece, no entendimento do Ministério Público do Trabalho, um paradigma jurídico positivo no Estado e no país no sentido da responsabilidade de toda a cadeia produtiva em casos semelhantes. A apuração do MPT no caso prossegue no que diz respeito à responsabilização da empresa prestadora, a Fênix, que rejeitou a possibilidade de acordo.
Termos do acordo
O acordo foi elaborado levando em consideração responsabilidade que o setor econômico tem de fiscalização e monitoramento de toda a cadeia de produção. Entre as obrigações, ficou estabelecido que as empresas devem zelar pela obediência de princípios éticos ao contratar trabalhadores diretamente ou de forma terceirizada: abster-se de participar ou praticar aliciamento, de manter ou admitir trabalhadores por meios contrários à legislação do trabalho, de utilizar os serviços de empresas de recrutamento inidôneas. As empresas também se responsabilizar por garantir e fiscalizar a áreas de alojamentos, vivência e fornecimento de alimentação.
Outras das disposições contemplam a obrigatoriedade de as empresas só firmarem contratos de terceirização com empresas com capacidade econômica compatível com a execução do serviço contratado, de fiscalizar as medidas de proteção à saúde e à segurança do trabalho adotadas pelas terceirizadas e também exigir e fiscalizar o regular registro em carteira de todos os trabalhadores contratados para prestação de serviços, bem como os pagamentos de salários e verbas rescisórias.
Também fica determinado como papel das empresas no acordo promover, entre outras empresas do setor vinícola e entre associados de suas cooperativas, estratégias de conscientização e orientação, contemplando seminários sobre boas práticas e cumprimento de legislação sobre direitos trabalhistas e direitos humanos, inclusive abordando temas de segurança, saúde e medicina do trabalho e trabalho em condições análogas à de escravo.
O descumprimento de cada cláusula será passível de punição com multa de até R$ 300 mil, cumulativas, a cada constatação.
Ao todo, a atuação do MPT já garantiu reparações em mais de R$ 8 milhões, tanto aos trabalhadores atingidos quanto à sociedade. Nos termos do TAC, as três vinícolas deverão pagar ao todo R$ 7 milhões de indenização por danos morais individuais e por danos morais coletivos – além das verbas rescisórias já pagas pela Fênix (mais de R$ 1,1 milhão). O prazo para a realização dos pagamentos de danos individuais será de 15 dias a contar da apresentação da listagem dos resgatados. Os valores do dano moral coletivo serão revertido para entidades, fundos ou projetos visando a recomposição do dano.
Pelo acordo, as três empresas também deverão garantir o pagamento das indenizações individuais aos trabalhadores resgatados em caso de impossibilidade por parte da empresa contratante, de propriedade de Pedro Augusto Oliveira de Santana.
Consequências à contratante
A empresa contratante Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde Ltda, após haver quitado R$ 1,1 milhão em verbas rescisórias acordadas em um TAC emergencial elaborado no momento do resgate, recusou-se, após duas audiências, a firmar termo de ajuste de conduta. O MPT agora está tomando com relação à empresa medidas judiciais – a primeira delas foi o pedido do bloqueio judicial de bens do proprietário Pedro Santana até o valor de R$ 3 milhões.
O juiz Silvionei do Carmo, titular da 2ª Vara do Trabalho de Bento Gonçalves, aceitou o bloqueio de bens de nove empresas e 10 pessoas envolvidas no caso. O magistrado acatou pedido liminar em ação civil pública ajuizada pelos procuradores, do MPT. A liminar foi deferida na sexta-feira, 3, em segredo de justiça. Nesta quinta-feira, 9, após diligências iniciais, o magistrado retirou o sigilo do processo.
O bloqueio de bens foi determinado pelo juiz como limitado a R$ 3 milhões, recurso estimado para garantir o pagamento de indenizações por danos morais individuais, bem como das verbas rescisórias e demais direitos de trabalhadores que não estavam presentes no momento do resgate. Despacho publicado nesta quinta indica a existência de bloqueio de R$ 70 mil em contas bancárias dos réus. Já houve também a restrição de 43 veículos, cujos valores serão avaliados. O juízo ainda aguarda o resultado dos atos de restrição de imóveis em nome dos envolvidos.
Foto: Márcio Schinoff