Jane Krüger

Na antiguidade, a mesa tinha um simbolismo fortíssimo onde a refeição desempenhava um papel crucial e esse traço permanece vivo ainda hoje em muitas culturas, infelizmente se perdendo no mundo VUCA contemporâneo.

Na sabedoria judaica, a mesa é um lugar com um significado que transcende o simples ato de se alimentar, pois leva consigo o símbolo de altar, no qual a família se reúne e vivencia este momento sagrado que emana o próprio significado do divino, onde D’us como pai, reúne à mesa seus filhos. Escravos, por obviedade, não tinham direito de fazer parte deste momento, somente filhos legítimos, herdeiros; filhos dignos.

Quem, por exemplo, não conhece a história do filho pródigo?! Aquele filhinho de papai que sai de casa com sua parte da herança (que desaforadamente a exige antes mesmo do pai partir), e que depois esbanja tudo o que recebe em festas e prazeres. Mas, bem como dizem por aí, assim como toda dor um dia passa, a alegria também. A bonança passou e o filho abastado, agora, se vê pródigo, sem nada! Sem ter o que comer, sem ter onde morar e agora, sem nenhum amigo para ajudar, se viu sem opção e só então, resolveu voltar para casa, ver o pai; se humilhar, pedir perdão e oferecer-se para trabalhar como um mero escravo, em troca de teto e comida.

O filho insensato sabia que não era mais digno de fazer parte da mesa do pai. Ao chegar perto da propriedade, cabisbaixo, muito triste e arrependido, caminhava a passos lentos e pesados. O fardo da culpa, da vergonha e da miséria deixavam todo seu corpo doído e fatigado. Ao avistar o filho de longe, o pai saiu correndo impetuosamente ao seu encontro, neste momento nada poderia contê-lo, os segundos pareciam eternos, a distância tão longa, mas cada passo dado era um passo para mais perto daquele por quem tanto chorara, esperara e sonhara. Seus braços abertamente estendidos encontraram o filho perdido e para sua completa surpresa, ao invés de o repudiar e julgar, o envolveram com muita saudade e bondade. O pai lhe beijou; intensamente amou e antes mesmo de dizer qualquer coisa, o perdoou. O pai agora voltava para casa aliviado, levando com alegria seu filho perdido que agora havia retornado. O pai então, rapidamente manda preparar um banquete. É servido do melhor para o pior, um banquete para quem estava em migalhas. O jovem miserável recebe um anel e roupas novas; o pai faz-lhe assentar-se à mesa, devolvendo ao filho em primeiro lugar a dignidade; ao recompor seu lugar junto à família, restaura a comunhão, anula a vergonha e em terceira instância, lhe dá a bênção de poder vivenciar o sentimento de pertencimento, que é imprescindível para uma vida saudável em todos os âmbitos. Todos nós precisamos saber que pertencemos a um lugar, a alguém, a uma família ou comunidade.

Esta breve história nos ensina não só o valor e significado profundo que a mesa tem, mas também nos mostra que não ter ninguém a quem pertencer é uma das experiências mais dolorosas que o homem pode viver. Sem esse precioso sentimento de pertencimento nos encontramos perdidos no caos do mundo em que nos encontramos. Diante disso, não calam as questões:

A quem pertencemos? E quem pertence a nós?

À quem nos ligamos? Com quem nos assentamos? Que aliança
formamos?

À quem? Para quem? E como?