Nunca vi tamanha prova de amor e solidariedade humana como no caso das enchentes que acometem o Rio Grande do Sul. Me sinto, deveras, até mal por fazer pouco demais. As pessoas me surpreenderam.
O mês de maio foi, de longe, o mais chuvoso dos últimos 108 anos pelo menos, de acordo com o Climatempo. Já choveu mais de 450 mm, inclusive superou a marca de setembro passado e de maio de 1941 cujo volume de chuva também era superior a 400 mm.
Não bastasse a tragédia das águas que ocasionaram enchentes e deslizamentos, também ressurgiram doenças praticamente erradicadas há anos, como a leptospirose, que eu só tinha ouvido falar no livro Carandiru.
É desmedida a rede de solidariedade e o trabalho de voluntários que estão reerguendo as cidades junto a seus representantes com presteza. Essa é a hora de guardar nossa dor no bolso pra poder curar a dor do outro.
Desolador assistir o que sobrou, se é que sobrou algum resquício de vida. Os tons de verde, viraram marrons. Casas, jardins, parques, vias tonalizaram-se de cor de lama. O silêncio tomou conta. Os rios, mesmo baixando, seguem o curso mostrando sua força e o estrago que causaram ao redor. Não sobrou nada.
Como disse o gaúcho Carpinejar, estamos tocando o barco literalmente, já que não há outros meios de locomoção em muitas áreas. Após a pandemia, em que há pouco a saúde mental foi se reestabelecendo, agora outro baque. É difícil dar o próximo passo.
Dá saudade e dor de luto ao mesmo tempo: saudade porque nunca mais vou ver a paisagem como era e dói saber disso. Quem ainda vai veranear na prainha? Luto porque é a dor de perda de praticamente todo estado. Cidades que viraram um nada. Casas que não sobraram. Vidas que se perderam da forma mais trágica. Fotos que rolaram esgoto abaixo. Lembranças do pôr-do-sol do Guaíba que vai demorar pra brilhar de novo.
Todos unidos pela mesma tragédia. Não há distinção entre pobres e ricos, entre cores, entre partidos, entre gênero. Uniu parelho. Desestabilizou um estado inteiro. Dói na gente. Dói em todos. Ninguém merecia. Vamos continuar tocando o barco em frente. Até que pare de chover e voltemos a usar os próprios pés como meio de locomoção e caminhar, sem fim, rumo a uma vida nova. Recomeçar. De novo.