Este ano tinha tudo pra ser o melhor ano. Tinha. Bebê no forninho aguardava, ansiosamente, para vir ao mundo e, no mais, eu ostentava uma família completa e reunida sempre com muitos sorrisos ao redor da mesa. Festejava o simples, o nascer da vida, os bichos de estimação que nos acompanhavam, pedia sempre saúde, agradecia pelo resto. Nos fins de semana, a mesa ficava cheia, ainda faltavam cadeiras que minha mãe completava com banquinhos. E íamos na casa dos vizinhos. E no sítio. E ríamos da vida, planejando os próximos passos. Parecia um sonho. No entanto, falhou. Foi interrompido. Hoje, falta um pedaço que para sempre faltará. A vida é uma dicotomia: noite e dia, tristezas e alegrias, chegadas e partidas, saúde e doença, nascer e morrer. Uns vêm para a nossa alegria e outros vão, inesperadamente, para abalar nossa estrutura sólida. A vida não avisa, ela contraria. Pais podiam ser eternos se não fosse pedir muito. Mas não são. Só entende quem os perde. Dá um vazio. Falta um abraço de parabéns.
Sobram cadeiras na mesa. O sorriso quente dá lugar à expressão morna. O ronco do carro silencia. O cheiro de grama cortada, some. O arame repleto de roupa de futebol, vira apenas um traço. A vida muda do avesso. Entre risos e lágrimas, é preciso seguir em frente, mas seguimos diferentes. E, de novo, o maldito ou bendito tempo pra ajudar a sarar a cicatriz. O tempo que não nos deixa apagar da memória.
Ele que, às vezes, nos trai. Que passa depressa demais nas alegrias e é lento nas tristezas. Só o tempo e as pessoas que amamos nos permitem seguir adiante equilibrando esses momentos. Só a fé nos permite ser fortes. Só os filhos nos dão forças diante da perda dos pais. É o ciclo da vida. Dói, mas é assim para todos, embora achemos injusto, cedo demais, castigo. E seguir, dia após dia, torna-se como uma escada, repleta de degraus, que só vislumbramos o próximo passo. Cansa, mas um dia chegaremos no topo. O importante é apreciarmos a escalada. Como diz o poeta “penso que cumprir a vida seja simplesmente compreender a marcha, ir tocando em frente”. Tocar em frente, seguir quando a única opção é continuar.
De vez em quando, vão cair muitas lágrimas, vamos sentir falta do cheiro, do toque das mãos, do barulho da risada, da companhia. Mas estamos aqui também de passagem. Todos vão. Essa é a dicotomia da vida. Uns chegam para outros irem, e nós também vamos partir. Quando sabemos que a única certeza da vida é que as coisas mudam, isso te alivia ou te conforta?