A saga de ser gaiteiro
A casa do meu avô em BARRACÃOCITY era um pouco de tudo: salão de baile – alfaiataria – barbearia – Pronto Socorro – consultoria financeira. Nos “arrasta pés” eu sentava num banco e ficava observando os dançantes e a banda tocar. Banda nada, era um gaiteiro e deu. Se a gaita era Todeschini era um detalhe que fazia a diferença, sinônimo de qualidade, da gaita e do gaiteiro. Isso durava até eu encostar a cabeça no colo da minha mãe e….dormir! O baile acabava aí pra mim. Daí então eu amava gaita, eu e mais um milhão de pessoas da colônia e do sertão brasileiro, a julgar pelos artistas sertanejos. Surge um gaiteiro, ou gaiteira, a cada hora. Porque então eu não poderia alimentar o sonho de ser gaiteiro e constituir um conjuntinho básico para animar os bailões no salão do meu avô? Partiu…..para a execução do projeto. Ganhei, não sei de quem, uma gaita “marca diabo”, como diria meu avô, no entanto, para iniciação não era necessária uma Todeschini. Agreguei valor no meu projeto, convidei meu primo Henrique Antonio Francio para tocar pandeiro, assim, sem me dar conta, agreguei à gaita, produto de consumo de qualquer morador da colônia com o pandeiro “padogueiro”. Pela baixa qualidade da gaita e em razão “do couro do pandeiro não ser um autêntico couro de porco” (kkk), o resultado não foi esperado. Não apareceram empresários, nem contratantes, muito menos cachês. As horas de ensaio não foram compensatórias, o projeto foi por “água abaixo”.
Tentativa no violão
Já na cidade, a partir dos 12 anos, lá pelos 18, pedi ao Beto Valduga, estrela do conjunto ARPÈGE, professor emérito de violão, que me ensinasse a tocar. Ele olhou pra mim e, deve ter pensado – deduzi pelo olhar – “esse aí nunca vai aprender a tocar violão”. Mas iniciei o curso indo lá na mansão dos Valduga – infelizmente posta abaixo para dar lugar a um edifício. A primeira aula “passou batida”, mas na segunda o Beto olhou pra mim e disse “mas tu é canhoto tchê, nunca que tu vai aprender a tocar violão”. E completou dizendo “zefini”. E acabou aí o meu sonho de ser um violinista e cantor de serenata: “a lua vem surgindo cor de prata, no alto da colina verdejante, e a lira do cantor apaixonado, reclama na janela a sua amada! Oh linda imagem de mulher que me seduz, ai se eu pudesse tu estaria num altar, és rainha dos meus sonhos és a lira, és malandrinha não precisas trabalhar”! Aí então que eu tinha a canção e a letra decorada da minha primeira serenata, o Beto acabou com o meu sonho. Hoje sabe-se que há inúmeros violinistas canhotos por aí, famosos até, “era só ter invertido as cordas”, Beto. Tá me devendo.
Locutor de rádio
Meu pai, quando veio para a cidade, tornou-se um próspero comerciante, muito relacionado e influente. A Rádio Difusora era gerenciada pelo Aloar Grigio, voz de “Alberto Roberto”, jeito de Armindo Antonio Ranzolin, muito competente, uma figura referência na cidade, que tinha como secretária a Lady. Abriu uma vaga para locutor, aberta a concorrência, meu pai “mexeu com os pauzinhos” e, lá fui eu e mais cem candidatos para testes. Me postei com o Aloar diante do gravador, do tamanho de uma cômoda, e ele me deu um texto para ler. Depois ele rodou para mim a gravação e, inteligentemente, perguntou: “Henrique, tu contrataria alguém com esta voz”? E eu respondi, com toda sinceridade: “não”! “Então tá, diga ao teu pai que eu lamento muito”. E fui, porta afora, triste e cabisbaixo, por não conseguir o emprego que eu queria. Onde estava o problema? Eu tinha um desvio de septo, corrigido anos depois, a voz saia fanha, horrível. Anos depois acabei sendo dono de uma emissora de rádio. Passei a ter toda a possibilidade do mundo para ser locutor de rádio 12 horas por dia, mas me limito a escutá-la, RAINHA FM 90.9, por quê? Porque não tenho tempo para ser locutor! “Oh, destino cruel”, mais uma frustração. E assim, como diria a cantora italiana Ornella Vanoni, “meus sonhos se esvaíram”. E o que foi que aconteceu? “Labor omnia vincit”.
Minha vida alviazul
Nos meus 12-13-14-15-16 anos, não lembro bem, além das minhas “picaretagens”, eu era auxiliar de alfaiate (meu pai). Fazia as entretelas, passava a ferro roupas, varria a alfaiataria, era balconista da loja “A EXPOSIÇÃO” que meu pai tinha na frente da alfaiataria, exatamente ali onde esta a HOT POINT na Saldanha Marinho. Meu pai era Alviazul (Esportivo), vinha do Barracão, de terno e gravata, certamente montado numa mula, para assistir os jogos do Esportivo, quando o estádio era no terreno da família Salton, ali onde hoje é o SUPER CAITÁ. Quando o Esportivo ganhava jogo, na segunda, os jogadores vinham na loja para apanhar a premiação: vitória contra o Lageadense valia uma camisa; vitória contra o Santa Cruz valia uma camisa; vitória contra o Encantado valia uma gravata; vitória contra o Fortes e Livres de Muçum valia um par de meias. Nos jogos contra o Santa Cruz e Lageadense raramente meu pai dava premiação, era difícil ganhar. Lembro que, pela loja, desfilavam Glenio, Julinho, Casquinha, entre outros, não me lembro quem mais, era uma romaria e uma farra no comentar dos lances dos jogos. Na montanha eu acessava o gramado munido de minha “maquineta” Kodak fazendo ensaios jornalísticos. Jogando na Montanha o Lageadense tinha um goleiro chamado Assis (tipo Danrlei) que “pegava tudo” e um zagueiro tipo Kannemann, de nome Edvi que, o tempo todo, tentava “quebrar” os jogadores do Esportivo. Era violento, e eu, com raiva, joguei a minha máquina na cabeça dele porque ele tirou Julinho de combate. O Juiz pediu para a Brigada me retirar de campo, dois brigadianos me carregaram e a torcida gritava “Larga! Larga! Larga”! Me tiraram de campo, perdemos o jogo, o Julinho foi todo enfaixado de branco, cabeça, tronco, membros e, foi levado, eu acompanhando, para uma foto no PAVONI, estúdio que ficava onde é o Shopping Bento. A foto foi enviada para os jornais da capital e do país. Saiu na imprensa: “carnificina no Estádio da Montanha”. “Por baixo dos caracóis dos teus cabelos”, quero dizer, por baixo das bandagens do Julinho não tinha nada, só marcas da chuteira do Edvi. E como tinha! Conhecem aquele ditado “minha vingança será maligna”? Pois é, foi maligna. Aos 16-17-18-19 anos, sei lá, não sei como, uma coisa puxa a outra, me colocaram como vice-administrativo do Esportivo. O Presidente era Vitale Camilo, o Vice de Futebol Roberto Vargas Ross, que depois, pelo afastamento de Camilo, acabou sendo Presidente. O técnico? Era o Enio Andrade. Minha passagem pelo Alviazul, daqui para diante, conto em capítulo mais adiante. Quero falar também sobre o lançamento do livro de Fabiano Mazzotti e Alceu Sauvi Souto, contando a vida dos 100 anos do Esportivo. Um trabalho minucioso, de investigação jornalística, está toda a existência do Alviazul ali retratada, um resgate histórico valioso e fundamental para consolidar toda a luta no sentido de dar sustentabilidade e glória ao Clube.