De tempos em tempos, novas palavras viram modismos e, depois de grande saturação, vão para escanteio. Algumas se incorporam à língua e continuam com seu uso em alta, nem sempre dentro de contexto – às vezes é só para dar uma fachada de intelectualidade – como é o caso de “empoderamento”. Há também palavras ou expressões que ressurgem com força total, como “empatia”, “narrativa”, “resiliência”, “protagonismo”, “agregar valor” coisa e tal, que, repetidas à exaustão, acabam perdendo um pouco da sua essência.
Os estrangeirismos sempre estiveram na moda, mais ainda agora com a grave crise da pandemia. É o caso do polêmico “lockdown” que, graças às “lives” diárias e aos “podcasts”, se torna menos opressor. Antes destas, “coaching” andou na boca de meio mundo, se desgastando além da conta.
Mas isso é normal dentro de uma língua dinâmica como é a nossa. Inclusive uma pesquisa mostrou que os modismos linguísticos têm uma vida útil de 14 anos. Preocupante, porque isso me leva a uma expressão que está mexendo com minha cabeça não de um jeito bom. Trata-se de “liturgia do cargo”. A primeira vez que a ouvi, foi de um ministro do STF que, ao sentir-se ofendido com o tratamento “senhor” que lhe foi dispensado durante uma sessão, exigiu o “Vossa Excelência”, argumentando que se tratava de respeito à liturgia do cargo. Essa excessiva formalidade na área está enraizada na cultura forense e já provocou, em tempos idos, polêmicas e processos, como o episódio em que um trabalhador teve que se retirar da audiência porque calçava chinelos de dedos.
Desde então venho pensando se não seria por causa disso que há um vácuo entre Justiça e Sociedade… Se as sessões intermináveis e incompreensíveis dos togados com o emprego contínuo e desnecessário de “palavrões” – não esses que o povo entende – não estariam inibindo o acesso igualitário à Justiça… Se a perpetuação do “jurisdiquês” e o uso da ironia fina sob o manto da superioridade, não seria um dos fatores que fazem com que a sociedade desacredite do sistema…
O respeito é fundamental, mas para que ele seja real, acredito ser necessária a democratização das informações jurídicas, e isso só será possível quando as falas forem claras, precisas e livres do palavrório inútil, o tal verniz erudito, que parece ser um dos pilares da famosa liturgia de certos cargos.