A pandemia de coronavírus trouxe consigo inúmeros reflexos nos maiores setores econômicos locais. Em alguns casos, serão necessários cerca de 18 meses para que as empresas voltem a funcionar como antes
Os setores produtivos bento-gonçalvenses sofrerão amargas perdas com a chegada do coronavírus. Mesmo se preparando para a retomada gradativa a partir da segunda-feira, 6 de abril, segundo alguns dirigentes, os reflexos serão sentidos por cerca de um ano e meio, e a redução no número de trabalhadores nas indústrias, momentaneamente, poderá atingir 30%.
Conforme o presidente do Centro da Indústria, Comércio e Serviços (CIC-BG), Rogério Capoani, a retomada ocorrerá mediante cumprimento de todo o protocolo de segurança da saúde dos funcionários. “As empresas precisam cumprir uma série de medidas que estão elencadas no Decreto publicado pela prefeitura. Para nós é muito importante esse movimento, porque é toda uma cadeia que volta a engrenar, e quanto mais cedo isso acontecer, melhor”, pontua.
O Presidente destaca que o comércio tem uma situação diferente, porque o município precisa seguir, juridicamente, o Decreto Estadual publicado em 1º de abril. “As portas do comércio, em geral, ficam fechadas até o dia 15, estando liberadas atividades do tipo venda online, tele-entrega e telebusca. Os serviços voltam com a indústria, apesar de muitos terem tido condição de trabalhar através de home office nesses dias. Importante citar a construção civil, que movimenta uma cadeia interessante com as lojas de materiais de construção, que poderão atender esse público, mediante contato telefônico, separação de material e entrega aos construtores”, explica.
Capoani diz ainda que os reflexos desta crise são inevitáveis. “É como numa grande guerra. Não tem como passar por uma batalha sem ter baixas. No âmbito socioeconômico, são empresas quebrando, com um risco mais iminente às pequenas. Realmente, é um estrago significativo”, diz.
Diante de toda a situação, Capoani relata que a classe empresarial ficou surpresa negativamente com a posição do último Decreto Estadual. “Acreditamos que tenha sido uma decisão infeliz, que vai ocasionar um estrago grande, principalmente porque obriga todos os municípios a cumprirem as determinações expostas. Quanto à questão das escolas, na nossa maneira de ver, é terrível, porque a educação, a alimentação e a saúde se interdependem. O município está tomando algumas medidas e é importante dizer que os 200 dias letivos serão cumpridos, com aulas até 22 de dezembro e sem férias de julho. Acredito que será mais fácil recuperar o dano causado à educação do que o causado ao emprego”, conclui.
Setor moveleiro
Responsável pela maior fatia econômica de Bento Gonçalves, o setor moveleiro é um dos que se prepara para a retomada das atividades na segunda-feira. Conforme o presidente do Sindicato das Indústrias do Mobiliário (Sindmóveis), Vinícius Benini, todas as fábricas estão se adaptando às normas estabelecidas pela Organização Mundial de Saúde (OMS), como também ao Decreto Municipal. “Iremos preservar os trabalhadores com mais de 60 anos e realizar de forma remota todas as funções que puderem ser exercidas em home office. Os refeitórios serão organizados em turnos visando respeitar o distanciamento mínimo, como também vamos reforçar os equipamentos de proteção individual e higiene pessoal”, garante Benini.
Conforme ele, o setor moveleiro no Brasil já estava com dificuldades na recuperação devido à baixa atividade econômica. “Hoje o cenário ainda é muito incerto para uma avaliação mais precisa, mas já esperamos uma queda de faturamento em torno de 50% no bimestre março e abril. Também dependemos da duração da crise, das ações de restrições de circulação de pessoas, do fechamento do comércio e da indústria e, ainda, dos efeitos das medidas econômicas. O impacto pode variar”, avalia o Presidente, que acredita que a situação deverá perdurar pelo menos até o fim do ano.
Ainda conforme Benini, as indústrias têm evitado demissões, optando pelas alternativas disponíveis. “Estamos esperando a volta da normalidade apenas no segundo semestre, com recuperação da atividade econômica brasileira a partir do 3º trimestre e PIB crescendo em 2021. Infelizmente, esperamos recuperar o nível de empregos de 2019 apenas em 2021”, lamenta.
Finalizando, o empresário crê que, apesar da demanda reprimida no momento, assim que a situação se normalizar as pessoas voltarão a consumir. “Embora o mobiliário não seja um item de primeira necessidade, esse período em isolamento pode gerar mais demanda futura ao setor. Estando mais tempo em casa, as pessoas puderam notar a necessidade de troca ou mesmo o desejo de reformar. Receamos pela vida, sem dúvida alguma, e considero que precisamos seguir avaliando o cenário dia após dia. Não existem decisões a longo prazo no momento”, finaliza.
Setor metalmecânico
Um setor que estava saindo de uma crise de mais de cinco anos não consegue enxergar de forma tão próxima a luz no fim do túnel. O presidente do Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico (SIMMME), Juarez José Piva, ressalta que a sensibilidade da área exige grandes investimentos para competir no mercado global. “Com essa pandemia já percebemos que o ano de 2020 está perdido. As empresas já apresentam uma situação falimentar. O segmento é composto por mais de 80% de micro, pequenas e médias indústrias sem capacidade de investimento, financiamento e completamente sem caixa. O desemprego vai atingir mais de 30%, entre empresas que encerrarão as atividades e que se adequarão à nova situação, com o agravante de que não conseguirão pagar as rescisões. Uma previsão de recuperação otimista é de aproximadamente 18 meses”, avalia.
De qualquer forma, as indústrias se preparam para a retomada às atividades na segunda-feira com muitas providências tomadas. “Já havíamos trabalhado medidas referentes à higienização e distanciamento, usando como exemplo os fatos que vinham ocorrendo no continente europeu. Os funcionários utilizam pesados equipamentos de proteção individual (EPIs), o que garante um grande isolamento. Hoje acredito que as pessoas estejam mais conscientes, se cobrando, e cobrando umas às outras”, afirma Piva.
Com relação ao retorno às atividades do setor industrial, atrelado à manutenção do fechamento das escolas, o Presidente demonstra uma certa preocupação, uma vez que muitos trabalhadores não têm onde deixar os filhos. “Estamos conversando e avaliando caso a caso. Este é um momento de flexibilidade. Oferecemos opções como férias, redução salarial de acordo com a jornada que poderão cumprir, como também banco de horas. É um momento de sensatez tanto dos colaboradores quanto dos empregadores, pois sabemos como a fase começou, mas não sabemos como vai terminar”, afirma.
O presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico (STIMMME), Deoclides dos Santos, acredita que as medidas que foram e vêm sendo adotadas são uma forma de zelar pela saúde dos trabalhadores e seus familiares. “As determinações do Poder Público, no sentido de restringir as atividades industriais e exigir das empresas o cumprimento de normas sanitárias, são uma forma de proteção às pessoas que precisam trabalhar para garantir o seu sustento e de seus dependentes. É verdade que os períodos de paralisação impactam de forma negativa no resultado das empresas, mas é preciso lembrar que alternativas estão sendo oferecidas para atravessar esse momento com a preservação dos empregos”, enfatiza.
Setor comercial
Mediante a decisão do Governador do Estado em estender a suspensão de atividades em estabelecimentos comerciais até o dia 15, o setor avalia a determinação como uma penalização. “No dia 31 de março trabalhamos arduamente para programar uma reabertura gradual a partir de 6 de abril. Construímos condições para isso, buscamos embasamento legal, preocupados com a saúde dos trabalhadores e financeira das empresas. À noite levamos um banho de água fria, com uma determinação que mostra que o Governo do Estado simplesmente impôs algo para que os prefeitos não tivessem mais condições de fazer qualquer tipo de alteração. Não podemos comparar o que está acontecendo em Porto Alegre, onde a população é de um milhão e meio de habitantes, com uma cidade pequena. Acho que foi radical, não respeitando particularidades. Com isso, o comércio absorve o prejuízo e paga a conta desse problema chamado Covid-19”, diz o presidente do Sindicato do Comércio Varejista (Sindilojas), Daniel Amadio.
O Presidente ainda não projeta uma proporção dos impactos que refletirão na economia da cidade. “Não vejo uma relação de média de sobrevivência das empresas. Isso depende de uma série de variáveis. O impacto na sociedade será muito grande. Existem algumas alternativas que estamos orientando os empresários, na questão de trabalhar eletronicamente com vendas, fazendo tele entregas, com as portas fechadas, para evitar aglomeração. Ajudaria sensivelmente, mas não no orçamento total”, pontua.
O presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL/BG), Marcos Rogério Carbone, salienta que boa parte do comércio local é composto por empresas de pequeno porte, que são muito mais sensíveis ao impacto econômico de um longo período de paralisação de atividades. “Mesmo que haja uma corrente de apoio, com medidas compensatórias como linhas de crédito e financiamento, muitas empresas terão sua saúde financeira severamente comprometida, com sério risco de fechamento. Outras lutarão para se adaptar a essa situação, precisarão cortar custos, com reflexo direto no enxugamento da equipe, ou seja, demissões”, frisa Marcos. Ele complementa: “Há um grande esforço por parte das entidades sindicais (patronal e de trabalhadores) em moldar a Convenção de Trabalho para oferecer recursos flexíveis – como concessão de férias, uso de banco de horas, elasticidade na jornada de trabalho, entre outros – que permitam atravessar esse momento sem aplicar o recurso extremo da demissão. Os esforços são, sem dúvida, para evitar o fechamento de postos de trabalho, mas é pouco provável que o comércio passe por essa crise sem uma onda de rescisões”, conclui.