Capital do Vinho conta com quatro obras selecionadas para o festival, no certame regional; são três videoclipes e um curta-metragem, o internacionalmente premiado “O Menino na Terra do Sol”
Na última semana, o CineSerra divulgou a lista de produções audiovisuais selecionadas para a 7ª edição da mostra competitiva que está programada para ocorrer entre 6 e 19 de abril, com sede em Caxias do Sul e exibições em Garibaldi, Gramado, Flores da Cunha, Nova Petrópolis, Torres e Porto Alegre. Mais uma vez o total de projetos inscritos bateu recordes. Foram 125 obras, das quais foram selecionadas 52, 31 no certame estadual e 21 no regional.
Se na última edição a Capital do Vinho contou só com um representante — a produção “Tão longe do começo”, de Kelvin Alves —, desta vez, assim como fez em 2016, a cidade voltou a contar com quatro trabalhos. Na categoria videoclipe foram selecionados: “O Império dos Parreirais”, de Beto Malheiros; Lábios Mentirosos, da Rainha de Espadas; e “La Valse de Mes Port”, que embora cadastrado como Pinto Bandeira devido à locação, é uma obra dos bento-gonçalvenses da Trebbiano.
Além de Bento Gonçalves, também chama a atenção o número crescente de projetos inscritos por cidades menores, tanto no certame estadual, no qual há 14 obras, quanto no regional, onde tiveram oito. Apesar de assinalar a predominância de trabalhos de Porto Alegre e Caxias do Sul como consequência direta do maior número de produtoras localizados nos dois maiores municípios gaúchos, o diretor artístico do CineSerra, Leandro Daros, acredita que essa pluralização é a maior conquista do festival. “O segmento tem uma força grande, pois tem muita gente produzindo, entrando no mercado audiovisual ou querendo entrar. E é, justamente, essa área dos curtas e médias-metragens, onde o pessoal começa, fazendo seus trabalhos, desenvolvendo sua linguagem. Vemos que a cada edição tem nomes novos participando, inclusive de muitas cidades que nem fazíamos ideia que poderia vir alguma produção. Isso é o mais bacana”, finaliza.
O menino na Terra do Sol retorna a casa
Após rodar por alguns dos mais respeitados festivais nacionais e internacionais de cinema, o filme da Alba Arte, produtora dos irmãos bento-gonçalvenses, Michel e Dandy Marchetti, encerra seu ciclo de exibições em casa, no CineSerra. Entre os principais circuitos percorridos, a obra foi exibida no Festival de Cinema de Gramado, o mais importante da América Latina, e no Los Angeles Brazilian Festival, o maior evento voltado a trabalhos brasileiros fora do país, onde saiu vencedora de duas categorias, melhor curta-metragem e melhor ator júnior, conquistado por Eduardo Giovanella de Almeida.
Livremente inspirado no livro homônimo do escritor Flávio Luis Ferrarini, O Menino na Terra do Sol conta a história de Nini, um menino tímido do interior que vive a solidão e aventuras da infância, enquanto sonha em ser escritor. Com ambição, reconhecimento e produção de cinema, o curta levou quase dois anos de pré-produção e 10 dias de gravação, em Flores da Cunha, com um elenco de 13 pessoas, mais de 40 figurantes e 24 pessoas da equipe técnica. Uma experiência engrandecedora, como destaca o diretor Michel Marchetti. “Achamos cenários incríveis como que parados no tempo, mas tivemos que reconstruir muitas coisas também. Tivemos que refazer todo o interior de uma escola, dos estojos às classes da época. Foi necessário varrer o estado para achar 20 delas. Sem falar nos figurinos, na audição para as personagens, e na busca de recursos. Foi algo muito legal mesmo”, destaca.
Apesar de já terem desenvolvido dois documentários, “Memórias do Vale dos Vinhedos” (2015), e “Talian: la nostra vera lengua madre” (2015) — obra que, inclusive, lhes rendeu os prêmios de melhor documentário e edição no 4º CineSerra — “O Menino da Terra do Sol” é o primeiro filme oficial da produtora. Para o diretor, poder se apresentar novamente no festival, agora, com uma ficção já aclamada por outros públicos, é a cereja do bolo nessa trajetória. “Ficamos muito felizes com esse retorno. É uma história que agradou pessoas por onde passou, mas o público que se identificará mais, sem dúvida, será o daqui. Pois é uma obra que reflete nossa história, cultura, arquitetura e modo de falar. Nossa maior alegria, portanto, será apresentar aos donos da história para que eles se identifiquem com o que está na tela”, diz.
“Esperamos que o pessoal da Serra assista, se identifique e veja como aquele período foi significativo para nossa história e para o que somos hoje. Ganhar algo ou não é secundário”, Michel Marchetti
Videoclipes
Império dos Parreirais, Beto Malheiros
Uma ode em letra e imagem a Capital do Vinho. Assim é a composição de Beto Malheiros que dá a Bento Gonçalves o grandioso título de “Império dos Parreirais”. Ao todo, foram cerca de sete dias de captação de cenas, em quatro dos mais famosos cartões postais de Bento Gonçalves: o Caminho de Pedras, o Vale dos Vinhedos, a Igreja Santo Antônio e a Pipa Pórtico. Locais que mais que enaltecerem as belezas do município, representam a história contadas pelos versos que se traduzem, sozinhos, em um cartão de visitas. “A música é uma homenagem a nossa querida cidade, e pincela um pouco sobre a história de nosso povo e de seu modo de vida. Colhemos imagens dessa história e gravamos em locais que a representam. Quando alguém menciona Bento, lembra inevitavelmente desses lugares”, destaca Malheiros.
Inscrito, meramente, como “descargo de consciência”, como o músico mesmo destaca, a seleção para o CineSerra é vista como uma importante maneira de ganhar visibilidade e notoriedade junto ao povo bento-gonçalvense, ao qual a canção é dedicada. “Canto música regionalista. Esta foi a primeira música mais pop, por isso surpreendeu muito a aceitação quando lancei o videoclipe, e agora mais essa surpresa com a seleção dele para o festival. Ganhar ou não algo no festival é o de menos, o prêmio é ter sido indicado. Já fomos premiados”, exalta.
Lábios Mentirosos, Rainha de Espadas
As emoções e histórias transbordam o que é cantado e contado ao longo dos três minutos e vinte e três segundos de duração de Lábios Mentirosos. Primeiro “videoclipe profissional” da Rainhas de Espadas, dos atores aos figurantes, as gravações contaram exclusivamente com um elenco de familiares e amigos dos integrantes da banda. Da mesma forma, os sets de filmagem foram bastante pessoais: a casa dos pais da vocalista, Quellin Parisotto, e o palco do Ferrovia Live, bar onde o grupo costuma se apresentar.
Toda essa ligação afetuosa e clima familiar somado a emotividade de Quellin, explicam o carinho com que as filmagens foram conduzidas e a emoção em ver a obra pronta. Primeira pessoa a ver o videoclipe finalizado, ainda nos computadores da Âncora, produtora por trás do projeto, ela chorou ao ver o resultado. A segunda vez em que o viu, junto aos atores, chorou outra vez, e da mesma forma, o fez no evento de lançamento, que reuniu mais de 230 pessoas. “A emoção toma conta, pois é uma sensação incrível ver um trabalho concretizado. O videoclipe foi uma grande experiência e que nos deu muita alegria, além de criar boas expectativas quanto ao futuro, pois hoje, o audiovisual se tornou algo muito importante para as bandas”, destaca.
Ansiosa, Quellin conta que ficou monitorando o anúncio e que vibrou ao ler o nome da banda entre os indicados. “É uma oportunidade muito grande de mostrar nosso trabalho para mais gente não só de Bento, onde somos mais conhecidos. Ganhando ou não, o importante é termos sido escolhidos. Para uma banda independente, esse tipo de oportunidade é maravilhosa”, assinala.
La Valse de Mes Ports, Trebbiano
Contar histórias e transmitir sentimentos sem usar palavras. Esse é o desafio vivido por bandas como a Trebbiano, grupo bento-gonçalvense que mescla estilos como jazz, blues, valsa, milonga, rock, entre outros, em um som integralmente instrumental. Com o primeiro disco lançado oficialmente em 2019, a banda já conta com quatro videoclipes. Para o contrabaixista Gabriel Ambrosi, o audiovisual serve justamente como uma forma de ajudar a traduzir os sentimentos expressos nas composições para o público.
Nesse sentido, para La Valse de Mes Ports, a banda gravou em uma vinícola para retratar a mistura de emoções vividas pelos imigrantes que fizeram de Bento a cidade que ela é hoje. “O vídeo é muito importante para criar associações e fazer com que as pessoas compreendam o que queremos transmitir. Essa música, por exemplo, traz a temática da migração em nossa região e da cultura italiana. O clipe transita por momentos de explosão, de felicidade, e por outros, mais introspectivos, traduzindo o que os imigrantes sentiam na época, suas dificuldades, êxitos, sucessos, enquanto construíam sua nova história aqui”, explica.
Gravado em Pinto Bandeira em apenas um fim de tarde, o audiovisual acabou representando a cidade no CineSerra, uma vez que o festival leva em conta a locação. Segunda vez que a banda inscreve trabalhos no festival, essa á primeira em que são selecionados para a mostra, motivo comemorado por Ambrosi. “É uma conquista poder levar um som instrumental para o grande público. Sabíamos que seria um desafio chegar aonde chegamos e estamos quebrando barreiras. Todos estão bem animados”, conclui.