Caso flagrado pela reportagem do Jornal Semanário em agência do Centro constatou quase duas horas para atendimento
A espera excessiva em filas de estabelecimentos bancários é algo vivenciado corriqueiramente por muitas pessoas, mas nem todos os que encaram essa situação entendem como a lei é regulamentada no Brasil. O tempo limite de aguardo, por exemplo, não está previsto em apenas uma “Lei da Fila de Banco”. O poder de legislar sobre o assunto é de responsabilidade das esferas estaduais e municipais, e cada localidade trata de acordo com as próprias particularidades.
Em Bento Gonçalves, a Lei 4.284/2008 prevê que agências bancárias – filas do caixa, caixas eletrônicos e outros setores em que há filas de espera – são obrigadas a atender em até 15 minutos em dias normais, até 20 minutos em véspera ou até dois dias após feriados, e em até 25 minutos nos dias de pagamento.
No entanto, Ivani Aparecida Catelan, doméstica, chegou em uma instituição prestadora de serviço às 11h33 da quinta-feira, 13 de janeiro, com a intenção única e básica de desbloquear seu cartão e foi atendida às 13h25. “Eu nem fui trabalhar, pois ia chegar com atraso, perdi a minha tarde. Inclusive chegou gente depois do que eu, e foi atendida antes”, critica. A situação foi denunciada no Procon da cidade.
Conforme a coordenadora do Procon municipal, Karen Izidro Battaglia, a infração independe do tempo excedido de espera. “Não importa se passaram 30 minutos ou duas horas, o descumprimento é o mesmo. Em situações que venham acontecer em horário de expediente do Procon, o consumidor pode ligar e o fiscal vai até a agência para registrar um auto de infração”, instrui.
No caso de Ivani, o órgão protocolou a denúncia e enviou o documento diretamente ao banco, que terá um prazo de impugnação de 10 dias sobre a lavratura. Após, tem 15 dias para apresentar defesa. Dada a sentença, a instituição pode recorrer. Contudo, Karen destaca que é muito difícil ser comprovado o porquê ultrapassou o tempo de espera.
Na cidade, segundo dados do órgão, de 2018 a 2020, foram registrados cinco notificações e sete autos de infração. “Não temos muitas denúncias dessa ordem, pois as pessoas não dão sinais de interesse. Se tomassem por praxe ligar e protocolar a denúncia quando acontecem esses casos, o número cresceria gradativamente”, observa.
Caso haja uma segunda reclamação de uma mesma agência, a diretriz Municipal indica que o descumprimento dos prazos de atendimento acarreta em multa de 100 Unidades de Referência Municipal (URMs), sendo que cada Unidade equivale a R$ 138,81. A Lei também dispõe que os estabelecimentos devem possuir um sistema de controle de senhas e horários, além de afixar avisos sobre o tempo máximo para atendimento em locais de fácil visualização do público.
A responsabilidade civil das instituições financeiras está prevista no artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, que define que o fornecedor de serviços responde objetivamente pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos verificados na sua prestação, só podendo ser rebatida por culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros.
O que fazer em caso de demora excedente?
Para provar o tempo de espera, ao entrar na agência pegue uma ficha de atendimento daquelas disponibilizadas pelos “totens”, com horário e serviço solicitado, se for correntista do banco digite seu CPF, pois na senha você já fica identificado. Ao final do atendimento, peça ao funcionário para protocolar a senha, sim, ela recebe uma autenticação mecânica parecida com a de pagamento, constando a data e hora.
De posse dessas informações, vá ao Procon, informe o desrespeito da instituição bancária, ou se preferir, procure o Ministério Público e ajuíze sua reclamação.
O que diz o MP
Segundo o promotor do Ministério Público, Alécio Silveira Nogueira, desde 2011 há uma ação civil pública contra três instituições bancárias locais. A ação resultou de um inquérito civil instaurado a partir de denúncias de usuários e de fiscalizações periódicas pelo Procon e foi julgada procedente em 2014, decisão mantida pelo Tribunal de Justiça nas apelações interpostas pelas instituições demandadas. Nogueira constata que a condenação só não é ainda definitiva, porque aguarda o julgamento de um agravo junto ao Superior Tribunal de Justiça, mas a decisão permite execução provisória.
Essa execução só ocorre para empresas em que já são réus. “Se outra instituição financeira estiver desrespeitando a Lei Municipal, será necessária a propositura de outra ação”, afirma.
De acordo com o Promotor, o cidadão pode remeter a notícia de fato diretamente ao Ministério Público Federal, em casos de empresas públicas federais, ou ao Ministério Público Estadual, em empresas privadas ou, ainda, ao Procon em qualquer hipótese.
“Geralmente se orienta que o Procon seja inicialmente acionado, pois é o órgão que pode verificar in loco se há demora sistemática ou não no atendimento pessoal na agência, relatório que será enviado ao Ministério Público pertinente se o problema persistir. Ganha-se, com isso, um tempo precioso”
Uma vez recebido esse relatório, duas situações podem ocorrer. “Caso o banco indicado seja um dos réus da ação já julgada, o MP pede, diretamente na ação referida, o cumprimento de sentença provisória, no sentido de aplicar imediatamente as multas fixadas no ato sentencial; se a hipótese for de outra instituição financeira, a instauração de um inquérito civil em que o primeiro passo é notificar a entidade, em relação à qual houve a reclamação. Não havendo acordo, o que é provável diante do entendimento geral dos bancos de que a lei municipal não lhes é aplicável, o caminho será o ingresso de ação civil pública similar à já intentada, a fim de obter o mandamento judicial de adaptação das entidades à legislação”, completa Nogueira.
Cuidado com vendas casadas
O Procon faz um alerta aos consumidores: a venda casada é expressamente proibida pelo Código de Defesa do Consumidor, artigo 39, inciso I, o que constitui crime contra as relações de consumo. Ela ocorre quando se vincula uma imposição de compra de um item não solicitado pelo cliente.
A venda casada, principalmente em bancos, é uma situação que decorre quando, ao contratar um produto financeiro, o cliente é informado que tem de pagar também por outro serviço. Como exemplo, em especial, a determinação de contratação de seguro, por meio de seguradora escolhida pela própria instituição financeira, principalmente em operações de empréstimo imobiliário.
A crítica se torna maior ainda uma vez que existem instituições públicas, ligadas à política habitacional do Governo Federal, de cunho eminentemente social. Outra irregularidade se dá a respeito da falta de informações claras para o cliente no momento da contratação e da imposição de abertura de conta corrente como exigência para a obtenção do financiamento imobiliário. “Muitas vezes o consumidor só toma conhecimento após algum tempo. Quando o tiver, deve imediatamente pedir o cancelamento, e em alguns casos ressarcimento dos valores pagos”, alerta a coordenadora local, Karen Battaglia.
Os consumidores que se sentirem lesados podem procurar o Procon para realizar denúncias e solicitar a devolução dos valores que, em alguns casos, podem ser em dobro.
Sobre intervalo intrajornada
O artigo 224 da Lei 13.467, de 13 de junho de 2017, prevê que, para funcionários que trabalham sob o regime de seis horas diárias, é garantido intervalo de 15 minutos. Para os que trabalham em jornada superior a seis horas, mesmo sem estar formalmente incluído na de oito horas, o intervalo, que era de 1h, passa a ser de pelo menos 30 minutos, mas pode se prolongar em casos específicos, como é o de mulheres grávidas.
Conforme o presidente do Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos Bancários de Bento Gonçalves (SEEB/BG), Valdir José Bussolotto, todos os funcionários das agências bancárias cumprem com o intervalo de, no mínimo, 15 minutos para o expediente de seis horas, e de 1h para oito de jornada.
Fotos: Franciele Zanon
Texto com colaboração de Mônica Rachele