Ok, eu era maior que ela, estava armada e não hesitaria em matá-la. E ninguém me condenaria por isso. Mas, junto ao instinto de defesa, veio o medo ancestral, intenso e irracional, que me deixou paralisada com o chinelo na mão. Devo ter ativado o gene de alerta herdado há milhões de anos, quando o homem primitivo tinha que se defender dos “aracnideossauros” que infestavam as cavernas.
Está certo! Ainda não foram achados esqueletos de aracnideossauro… Vai ver é porque não tinham esqueleto, “mas que existiram, existiram”.
A cena: o monstrinho devia ter uns dez olhos, todos focados em mim, tentando me hipnotizar. Suas patas peludas mantinham equilibrados uma cabeçona redonda e um bundão oval, unidos por uma cinturinha de dar inveja à Paula Fernandes. Como foi que observei? Eu estava apavorada, não cega!
À menor piscadela, o bicho atritava as garras da frente, uma na outra, assim como eu faço para afiar as facas de cozinha. A predadora estava a fim de jantar e provavelmente não se importava com o nível de colesterol do banquete. Diante de tamanha ameaça, resolvi criar coragem e desgrudar os pés do chão. Fui até a área de serviço para trocar de arma, já que o chinelo de nada me ajudaria.
Munida de vassoura, retornei ao quarto. Foi só me ver, que o bicho disparou para o alto da parede, a uma distância matematicamente calculada. A solução era trocar de arma novamente. Agora tinha que ser o “Flit” paralisante.
“Ah-há!”, murmurei, já com o frasco na mão. Mas assim que ergui o braço, aquela coisa horrorosa escalou o restante da parede e se abrigou na fresta que dá para o teto. Só duas patonas ficaram a descoberto, por pura provocação. Que remédio! Desisti. E escolhi outro quarto para dormir.
No dia seguinte, lá estava ela, no mesmo lugar, me abanando em “slow motion”. E a noite chegou outra vez. E o que ela fez? Foi descendo, descendo… Quase vomitei o coração, que fazia“tuc, tuc, tuc” que nem os “tuque-tuque” do Vale dos Vinhedos. “Meu Deus! Cadê os homens desta casa?”, falei em desespero.
Obrigada a enfrentar o medo, esvaziei a lata de “Flit” na predadora. A aranha tentou reagir, mas o banho de espuma cobriu-a inteiramente. Suspirei aliviada. Com uma pipoquinha básica, sentei na poltrona do papai e dei um clik para continuar assistindo ao Homem Aranha III.