Professor universitário e desenhista renomado, graduado em Artes Plásticas pela UFRGS e pós-graduado na Escola de Comunicação Visual (MFA – Mestrado) da Syracuse University, em Nova Iorque, o alegretense, hoje morador de Bento Gonçalves, ingressou no novo curso no primeiro semestre deste ano

Sem nunca largar os pincéis e o caderninho de desenho que o transformaram em um dos mais reconhecidos desenhistas e aquarelistas do país, aos 84 anos, o professor universitário aposentado, Joaquim da Fonseca, inverteu de papel. Ele largou o quadro negro e os projetores para se sentar à classe em meio aos estudantes.


Mais que uma prova de que nunca é tarde para aprender algo novo, a história de Fonseca também ensina que, tampouco, os sonhos envelhecem. Apesar de o estudo ser uma forma de ocupar o tempo vago e se manter ativo em uma idade avançada, a volta à vida acadêmica tem um significado bem mais profundo. É o reencontro com um sonho de juventude, adormecido por mais de sessenta anos: cursar Arquitetura e Urbanismo.

Retrato da praia de Imbé, em um de seus cadernos de desenho

Estudante, mestre, artista e, outra vez, estudante

Com o dom nato do desenho, veia artística herdada e incentivada pela mãe, e um apreço ímpar pela observação das paisagens urbanas e pela vida cotidiana, o destino de Joaquim parecia mesmo traçado entre o caminho da arte e o da arquitetura.


Nascido em Alegrete, o jovem ingressou no então Instituto de Belas Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), na década de 1950. Na época, dividido entre suas paixões e possibilidades, cursou Artes Visuais, onde foi aluno de nomes consagrados no meio como Ado Malagoli e Aldo Locatelli. “Eu não tinha concluído todo o segundo grau ainda. Para ingressar em Arquitetura tinha que terminar o curso científico, e na Escola de Artes eu podia entrar diretamente. Como fui deixando o científico para depois, acabei postergando também o vestibular de arquitetura. Aí me envolvi com trabalho, casei… enfim, fui deixando passar”, comenta.


Uma vez formado em Artes Plásticas, Joaquim trabalhou como ilustrador, diagramador e chefe de redação da extinta Revista O Globo, e também como diretor de arte da MPM Propaganda, uma das mais famosas agências de publicidade da história no Brasil. Mais que o contato com personagens como o pai e filho, Érico e Luis Fernando Verissimo, com os quais trabalhou no período, a experiência o levou de volta a UFRGS, agora, como professor.


Lecionando, teve a oportunidade de cursar uma pós-graduação na Escola de Comunicação Visual (MFA – Mestrado) da Syracuse University, em Nova Iorque, onde foi apresentando a uma de suas maiores paixões, a aquarela.

Neste período, também se reaproximou do ex-colega de trabalho, Luis Fernando Verissimo, que vivia na cidade, além de mais uma vez, como que por casualidade, ter novo contato com o retrato da arquitetura e da vida urbana. Com o amigo, lançou a “Traçando”, coleção de seis livros de crônicas, com textos de Verissimo e ilustrações de Fonseca. “O Luis Fernando morou em várias cidades do mundo e, como cronista, escreveu muito sobre elas. Então, dei a ideia de publicarmos seus escritos que saíram nos jornais em forma de livros, com ilustrações minhas. Ele já tinha vivido nessas cidades, e eu fui até elas para fazer esses desenhos”, destaca.


De volta ao Brasil, Fonseca retornou seu ofício na UFRGS, onde se aposentou. Em 2009, seguindo sua esposa, a jornalista Francisca de Moura, que havia sido transferida, foi morar por quase uma década em uma das cidades mais icônicas da arquitetura moderna no Brasil, Brasília. Na Capital Federal, sob as influências arquitetônicas de nomes como Niemeyer, eternizou em aquarela os edifícios e vida na cidade em obras que se encontram, por exemplo, expostas no Gabinete de Arte da Presidência da Câmara dos Deputados.


Sem se acostumar com a vida e com o estilo de vida de Brasília, o casal esperava, ansioso, o retorno ao Rio Grande do Sul. Oportunidade que chegou com a transferência de Francisca para Bento Gonçalves.

Em Bento Gonçalves

Umas das aquarelas de Fonseca expostas em seu próprio apartamento

Emolduradas nas paredes do apartamento do casal, no quarto andar de um edifício no Centro da Cidade, e expostas na Casa do Artesão e do Artista Plástico de Bento Gonçalves, as aquarelas de Fonseca são mostras da continuidade de sua paixão pelas artes. No entanto, desde o primeiro semestre deste ano, essa vocação que o fez rodar o mundo e ganhar a vida, ficou em segundo plano.


Ingresso no Campus Universitário da Região dos Vinhedos da Universidade de Caxias do Sul (UCS), hoje, mais de seis décadas depois, voltou à encruzilhada de onde tudo começou. Após percorrer um longo período na trilha das artes plásticas, enfim, começa a caminhar, mesmo sem ambições profissionais, o caminho da Arquitetura e do Urbanismo. “Mantenho-me desenhando, mas estou mais voltado para a faculdade. Minha intenção, primeiro, era realizar um projeto que tinha desde cedo; segundo, me manter ocupado. Se eu não tiver uma ocupação, um interesse, acabarei me entregando como tantos outros colegas da minha idade que estão com problema da saúde ou morrendo. Afinal, aos 84 anos, já estou vivendo só de inhapa”, brinca.