As cardiopatias congênitas, alterações estruturais ou funcionais do coração que se manifestam durante a formação embrionária, representam um desafio significativo para a medicina moderna

Diani S. W. Espíndola, Cardiologista

Em um esforço contínuo para conscientizar a população e aprimorar o cuidado pré-natal, a cardiologista Diani S. W. Espíndola, traça um panorama da condição e a importância do diagnóstico precoce e do acompanhamento especializado para garantir o melhor prognóstico para esses bebês.
As cardiopatias congênitas não se limitam apenas a problemas nas artérias, veias ou no músculo cardíaco, elas também abrangem as arritmias fetais. Diani esclarece que essas anomalias surgem nas primeiras semanas de gestação, influenciadas por uma complexa interação de fatores. “ Referimos como fatores de risco as inúmeras doenças genéticas que podem ter relação com o desenvolvimento das cardiopatias congênitas, sendo que elas, bem como também doenças maternas, podem aumentar a chance de o feto ter cardiopatia fetal, como doenças autoimunes (Diabetes, Hipotireoidismo, etc). Fatores ambientais como ingestão de medicamentos ou exposição parental a produtos teratogênicos (drogas ilícitas, etc) também aumentam a chance de o feto desenvolver cardiopatia congênita”, esclarece.

Acompanhamento desde o inicio

O papel do pré-natal é, portanto, insubstituível para a detecção precoce dessas condições. A cardiologista ressalta a relevância dos exames sanguíneos, que podem levantar a suspeita de doenças genéticas associadas, e dos exames de imagem, como o ultrassom morfológico e, crucialmente, o ecocardiograma fetal. “O ecocardiograma fetal é o exame crucial para avaliação de cardiopatia congênita fetal, pois nele há a avaliação detalhada das estruturas, fluxos e ritmo cardíacos, aumentando a chance de diagnóstico durante o desenvolvimento fetal.”, afirma.
A temporalidade da realização desse exame é um ponto-chave. Embora a triagem cardíaca inicial possa ser feita por via transvaginal em fases precoces, doenças evolutivas ou arritmias podem não ser detectadas nesse estágio. Por isso, a recomendação é que o ecocardiograma fetal seja realizado por um profissional com amplo conhecimento em cardiopatia congênita, idealmente no início do terceiro trimestre da gestação, mas podendo se estender até momentos antes do nascimento. “Existem doenças cardíacas que se estabelecem com a evolução da gestação, por isso, após ter sido realizado o ultrassom morfológico fetal, sugerimos a realização do ecocardiograma fetal por profissional com amplo conhecimento em cardiopatia congênita, para então ser avaliada esta estrutura principal do desenvolvimento fetal no tempo ideal”, salienta a médica. Em casos de alto risco, como a detecção de translucência nucal aumentada em exame obstétrico prévio, o ecocardiograma fetal pode ser antecipado para o início do segundo trimestre, entre a 18ª e 22ª semanas. As diretrizes da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) de 2020 corroboram essa prática, indicando o ecocardiograma fetal para gestações de alto e baixo risco, incluindo situações como Diabetes Mellitus Gestacional diagnosticada no primeiro trimestre e anomalia fetal extra cardíaca.

O caminho após o diagnóstico
Uma vez diagnosticada a cardiopatia congênita intraútero, o seguimento dependerá diretamente da gravidade da condição. Há casos que demandam intervenção cirúrgica logo nas primeiras horas de vida do recém-nascido, enquanto outros permitem um acompanhamento mais gradual, com ecocardiogramas fetais seriados e pós-natais. “Quando o diagnóstico de uma cardiopatia grave é feito intraútero, a gestante é encaminhada ao Centro de Referência em Cardiologia Pediátrica e Fetal para programação do nascimento neste local a fim de agilizar o acompanhamento e tratamento no pós natal imediato. Ainda, existem cardiopatias congênitas graves que necessitam de intervenção intraútero, como, por exemplo, procedimento de abertura de válvulas”, explica a Dra. Diani.
O prognóstico para esses bebês está intrinsecamente ligado à gravidade da cardiopatia. Quanto mais grave a anomalia, mais desafiador o cenário. No entanto, a cardiologista traz uma mensagem de esperança: “atualmente as técnicas cirúrgicas e de cateterismo cardíaco têm sido aprimoradas e novos estudos estão sendo feitos para a obtenção de melhores resultados, melhorando a vida dessas crianças e a forma como elas podem se adaptar a esses procedimentos. A detecção precoce e o acompanhamento adequado são fatores decisivos no desfecho pós-natal. É indiscutível que uma criança com cardiopatia grave deva nascer em um local habilitado a fazer o tratamento adequado nas primeiras horas de vida”, defende a cardiologista

O desafio dos casos não diagnosticados
Infelizmente, nem todos os casos de cardiopatia congênita são diagnosticados durante a gestação. Nesses cenários, o manejo com medicações específicas, como a Prostaglandina endovenosa, pode ser vital para estabilizar o recém-nascido e permitir seu transporte a um Centro de Referência, embora o tempo seja um fator crítico. A Dra. Diani sublinha a importância da transparência com a família. “Os pais devem estar ciente de todas as possibilidades para cada caso, por isso, quando há um diagnóstico intraútero costumo conversar com a família sobre todos os riscos, preparando-os para desfechos favoráveis ou desfavoráveis”.
Como mensagem final, a médica faz um apelo fundamental a todas as futuras mães de Bento Gonçalves e região: “Gostaria de sugerir que toda gestante converse sobre o ecocardiograma fetal com a sua médica ou seu médico obstetra, para que possa ser orientada e indicada a melhor forma de acompanhamento pré-natal, caso a caso, do bebê e do coraçãozinho em desenvolvimento. Essa simples conversa pode ser o primeiro passo crucial para assegurar um futuro mais saudável para muitas crianças”, finaliza.