Com 7.470 vagas, município apresenta alta demanda, mas baixos salários e custo de vida elevado dificultam contratações de novos trabalhadores
Desde a crise climática de maio, a dinâmica do mercado de trabalho em Bento Gonçalves passa por mudanças significativas. Vanderlei Mesquita, coordenador da agência FGTAS/SINE de Bento Gonçalves, destaca que semanalmente cerca de 50 novas vagas são abertas, enquanto outras 450 são renovadas, mantendo uma média mensal de aproximadamente 500 oportunidades. Atualmente, a cidade soma 7.470 vagas, evidenciando uma ampla oferta que contrasta com a procura limitada. “A taxa de preenchimento das vagas está muito baixa, assim como a efetivação das contratações”, afirma, enfatizando a dificuldade em mobilizar candidatos.
As empresas enfrentam desafios para atrair e manter talentos, sendo o baixo salário uma das razões principais para a permanência de cerca de 400 vagas abertas semanalmente.
Setores com maior demanda e desafios
Os setores de transportes, frigoríficos e construção civil estão entre os que mais oferecem vagas. O coordenador ressalta que, devido aos eventos climáticos recentes, a demanda por trabalhadores em empreiteiras de estradas também cresce. No entanto, o preenchimento delas enfrenta entraves significativos. “Os setores de produção das empresas são os mais afetados, com uma vasta oferta de vagas e falta de mão de obra há meses”, explica Mesquita.
A dificuldade de encontrar mão de obra se acentua especialmente nas funções de produção, que enfrentam escassez de candidatos há meses. Ana Paula Boscardim Baschera, diretora da Asterh, reforça essa análise: “Os segmentos que demandam maior experiência e qualificação enfrentam dificuldades mais acentuadas, devido à escassez de profissionais especializados”, destaca. Para cargos que exigem alta qualificação, como em tecnologia, saúde e engenharia, a competição é intensa. “A formação de profissionais leva tempo e requer investimentos significativos, tanto de empresas quanto de instituições de ensino”, acrescenta Ana Paula.
Julia Basso, coordenadora de Recursos Humanos da Tomasi RH, compartilha uma visão semelhante, apontando que tanto indústria, comércio, quanto serviços enfrentam falta de candidatos, o que reflete um problema estrutural. “O custo de vida em Bento é elevado, o que impede a migração de profissionais de outras regiões, agravando a situação”, observa. Além disso, a demanda por motoristas e funcionários na área de transportes tem sido particularmente desafiadora.
Motivos para vagas permanecerem abertas
A permanência de vagas abertas por várias semanas é uma questão recorrente no município. Mesquita atribui essa realidade aos baixos salários, que, segundo ele, têm sido o principal motivo para a baixa procura por emprego. José Ari da Silva de Morais, coordenador de RH da Cinex, confirma que, atualmente, leva em média 33 a 35 dias para preencher uma vaga, um aumento em relação aos 30 dias habituais. “Estamos em um período onde a oferta de empregos é maior do que a procura, dificultando o preenchimento”, comenta.
Ana Paula destaca a busca por profissionais com habilidades específicas como uma das razões para a permanência de vagas. “A preparação de profissionais altamente qualificados envolve um tempo significativo, além de uma atualização contínua devido à velocidade das inovações tecnológicas”, aponta.
Estratégias de retenção
A preservação de talentos também tem sido um desafio para as empresas da região, especialmente após os impactos da crise econômica e climática. “A retenção de talentos em setores como comércio e turismo tem se tornado um desafio devido à incerteza econômica”, explica Ana Paula. A necessidade de adaptação constante para manter um ambiente de trabalho atraente e engajador tornou-se essencial. “Estamos tentando melhor remuneração e benefícios mais atrativos”, diz Julia.
Na Cinex, o foco está em manter um ambiente de trabalho que favoreça a retenção. “Investimos em programas internos de capacitação e recrutamento interno para promover o crescimento dos colaboradores”, explica Morais. A empresa também oferece um período de mentoria de 15 dias para novos funcionários, visando uma integração eficiente e redução da rotatividade.
Expectativas de melhora e perspectivas futuras
O mercado de trabalho do município vislumbra um período de crescimento, especialmente com a proximidade da colheita das uvas, quando a demanda por trabalhadores em vinícolas aumenta. “Os próximos meses devem ter um aumento nas contratações, principalmente no setor vinícola, que sempre precisa de mais mão-de-obra nesta época do ano”, projeta Ana Paula.
Ainda assim, as empresas precisam elaborar estratégias mais robustas para atrair e manter profissionais qualificados, como observa Julia: “Precisamos buscar pessoas de outras regiões e incentivá-las a morar na cidade para suprir a demanda de mão de obra”, pontua. Ana Paula complementa que, embora haja otimismo no horizonte, ainda será necessário abordar questões como a adequação salarial e a qualificação da força de trabalho local.
Desafios e adaptação às expectativas dos candidatos
O mercado de trabalho está em transformação e exige adaptação contínua. “Os candidatos hoje buscam mais do que um bom salário; eles valorizam qualidade de vida e desenvolvimento profissional”, aponta Morais. Com isso, empresas como a Cinex têm promovido ações como pesquisas de satisfação, utilizando metodologias como o Great Place to Work para ajustar suas políticas de RH e se manterem atrativas.
A escassez de mão de obra e a dificuldade em preencher vagas refletem um mercado aquecido, mas com desafios significativos. As estratégias adotadas pelas empresas variam desde a oferta de salários acima do mercado até benefícios como plano de saúde e premiações por assiduidade e indicação, conforme explica Julia. “O comprometimento dos candidatos e a disposição de ‘vestir a camisa’ da empresa têm sido critérios fundamentais”, conclui.
Além da escassez de profissionais, o mercado competitivo é outro fator que tem dificultado o processo de recrutamento. A maioria dos profissionais qualificados já está empregada, o que aumenta a competição entre as empresas por esses talentos. Morais destaca que os candidatos de hoje buscam muito mais do que apenas uma compensação financeira. “Eles valorizam a qualidade de vida, o equilíbrio entre vida pessoal e profissional, e as oportunidades de desenvolvimento dentro das empresas”, explica.
Outro desafio significativo é o ambiente de trabalho, que se tornou um critério decisivo para os candidatos. A segurança, o bem-estar e a possibilidade de se sentir à vontade e feliz no local de trabalho são fatores que impactam diretamente a escolha do candidato. Além disso, a reputação da empresa no mercado também desempenha um papel fundamental, muitas vezes superando até mesmo a questão salarial. “A visibilidade e a credibilidade da empresa no mercado têm sido determinantes na atração de talentos”, afirma Morais.
A adaptação das políticas de recursos humanos para se alinhar com as novas expectativas dos candidatos é uma ação crucial para as empresas. Morais explica que a Cinex tem se dedicado a entender as necessidades de seus colaboradores e ajustar suas políticas com base nesses insights. “Em 2024, implementamos uma pesquisa de satisfação com nossos colaboradores utilizando a metodologia Great Place to Work, o que resultou em nossa certificação e forneceu insights valiosos sobre como podemos melhorar ainda mais”, explica.
Além disso, a Cinex tem adotado benefícios flexíveis, permitindo que os colaboradores personalizem suas vantagens conforme suas necessidades. “Oferecemos benefícios como mobilidade, saúde, alimentação e educação, garantindo que nossos colaboradores escolham o que melhor atende às suas preferências e estilo de vida”, destaca Morais. A empresa também tem investido no clima organizacional, promovendo um ambiente de trabalho mais participativo, com ações sociais para engajar e aumentar a satisfação dos colaboradores.
Essas iniciativas fazem parte do compromisso da Cinex em personalizar a experiência de trabalho, sempre com o objetivo de oferecer mais do que salários competitivos. Morais conclui: “As empresas precisam ir além das compensações financeiras. É essencial oferecer uma cultura organizacional positiva, benefícios atrativos e oportunidades de crescimento para atrair e reter talentos no mercado de trabalho atual”, conclui.
Novas demandas do mercado de trabalho
Joseane Coinaski, Analista de Recursos Humanos da Anderle Transportes, explica como a empresa tem adaptado suas práticas para atrair e reter talentos. “Recrutamos principalmente para cargos de assistente nas áreas administrativa, financeira e comercial, além de motoristas para a frota, conforme a demanda”, afirma ela. Ao ser questionada sobre diversidade e inclusão, a analista destaca que a empresa adota uma abordagem aberta, sem especificação de gênero ou idade nas vagas. “Divulgamos as oportunidades nas redes sociais para alcançar o maior público possível, sempre promovendo um ambiente interno de respeito e harmonia”, diz.
Sobre as qualidades valorizadas nos candidatos, ela enfatiza a importância do relacionamento interpessoal, dizendo: “Não nos restringimos às habilidades técnicas; procuramos entender as aspirações do candidato e se seus valores pessoais estão alinhados com os da empresa.”
Joseane também compartilha os desafios enfrentados no atual mercado de trabalho, como a escassez de perfis adequados para determinadas vagas e a competição com outras ofertas no mercado. “A localização da empresa também influencia, já que estamos um pouco distantes da cidade”, aponta.
Por fim, a empresa adota diversas iniciativas para se adaptar às novas expectativas dos candidatos. “Investimos em ações internas de engajamento e bem-estar, criamos um ambiente acolhedor e, este ano, implementamos uma plataforma de gestão de RH, que oferece mais de 300 cursos gratuitos e auxilia na integração e desenvolvimento contínuo dos colaboradores”, conclui.
Case de Sucesso
Marilise dos Santos Cruz da Silva, Gerente Administrativa da Anderle Transportes, detalha como iniciou sua jornada na empresa em 2019, após uma indicação, assumindo o cargo de recepcionista. “Minhas primeiras responsabilidades incluíam atender ao telefone, receber visitantes, organizar materiais para as unidades e dar suporte a alguns setores, além de organizar o congresso anual”, explica.
Ela destaca que, ao longo dos anos, desenvolveu habilidades essenciais, como comprometimento, responsabilidade e proatividade. “Sempre gosto de aprender e nunca tenho medo de encarar novos desafios”, afirma Marilise, enfatizando a importância dessas qualidades para o crescimento profissional.
Marilise ressalta que a empresa investe em programas de desenvolvimento de carreira, indicando cursos e oferecendo auxílio financeiro. “Temos suporte para cursos, graduação, pós-graduação e uma plataforma de cursos online”, menciona. Ela aproveita essas oportunidades ao iniciar cursos e ingressar na faculdade para aprimorar seus conhecimentos e alcançar novos patamares.
Sobre os desafios enfrentados, ela conta: “Percebi que tinha o conhecimento, mas não a formação. Então, comecei a investir em cursos e na faculdade para me desenvolver mais”, diz. Marilise também destaca a transparência da empresa em processos de promoção. “A Anderle é muito justa. Quem é dedicado e busca conhecimento tem sua chance”, diz, compartilhando seu exemplo de ascensão de recepcionista a Gerente Administrativa em cinco anos.
Ao aconselhar quem deseja crescer na carreira, Marilise declara: “Precisamos saber o que queremos e trabalhar com amor e dedicação, buscando sempre conhecimento. Desenvolver habilidades de comunicação e construir uma rede de relacionamentos sólida também é essencial.” Ela enfatiza que ser proativo, adaptar-se às mudanças e buscar feedback contribuem significativamente para o sucesso. “Crescer exige criar seu próprio caminho e aceitar desafios que expandem seus limites”, conclui.