O papel da mulher do campo tem ganhado visibilidade e valorização nos últimos anos. Mulheres de todas as idades assumem posições de liderança, enfrentam desafios diários e fazem a diferença no setor agrícola

O meio rural é historicamente marcado pelo trabalho árduo e pelo suor de gerações que cultivam a terra e alimentam o país. Nesse cenário, a mulher rural tem desempenhado um papel de crescente importância, não apenas na produção, mas na administração e inovação das atividades agrícolas. Em uma reportagem especial, entrevistamos quatro mulheres que compartilham suas experiências e a força com que enfrentam os desafios no campo: Diva Marcolin Flamia, Teresinha Mazzocco Paese, Gentilia Gonzatti e Ivone Riboldi Bellé.

Histórias de vida

Diva Marcolin Flamia, 58 anos, explica que trabalha na agricultura desde jovem, primeiro ao lado dos pais e, mais tarde, com o marido, também agricultor. “A principal motivação é o amor pelo que faço e a conexão com a natureza. Eu gosto muito da tranquilidade que temos aqui”, declara, destacando o orgulho de colocar alimentos na mesa dos consumidores. Os desafios, porém, são muitos: “O clima é um grande problema, com excesso ou falta de chuva e tempestades, que sempre afetam a produção. Além disso, a lucratividade é um desafio, pois os insumos são caros e nosso produto nem sempre é valorizado”, lamenta. A burocracia também dificulta a contratação de mão de obra temporária, essencial em determinadas épocas do ano.

Para Diva, a mulher rural tem papel fundamental no desenvolvimento sustentável da agricultura, pois, além do trabalho braçal, também administra as finanças e a casa, muitas vezes garantindo uma renda adicional. Ela observa que a presença feminina no campo mudou bastante com o passar dos anos. “Antigamente, a liderança era masculina. Hoje, vemos muitas mulheres que assumem esse papel, não mais como ajudantes, mas destacando-se em várias etapas do processo produtivo e de geração de renda”, afirma. Apesar dos avanços, ainda persiste uma divisão de papéis no campo, e algumas atividades são vistas como exclusivamente masculinas. “Muitas vezes, a mulher enfrenta jornada dupla, trabalhando no campo e cuidando da casa”, diz ela. Entre suas maiores conquistas, Diva cita o registro da agroindústria de vinhos coloniais, onde utiliza uvas cultivadas por sua família para produzir vinhos e sucos. A tecnologia, segundo ela, trouxe avanços importantes: “Tratores, fertilizantes e agrotóxicos menos prejudiciais ao meio ambiente facilitaram muito o trabalho”, destaca, Diva tem a expectativa de que as mulheres serão cada vez mais valorizadas no setor rural e encoraja as que estão começando: “É preciso persistência, mas é muito gratificante. Trabalhar no campo é uma ótima forma de estar em contato com a natureza e se encontrar consigo mesma”, conclui.

Contato com a natureza

Teresinha Mazzocco Paese, 69 anos, está há 60 anos no meio rural e considera a natureza uma motivação sagrada. “O que me motivou a trabalhar na agricultura foi estar em contato com a natureza, obra divina”, explica. Apesar dos sacrifícios, a renovação que sente a cada colheita a mantém firme na atividade. Ela acredita que a mulher provou ser capaz de igualar-se ao homem em suas tarefas, mas reconhece que ainda há um longo caminho até a igualdade plena no setor. “Ainda falta confiança de acreditar na mulher, mas tenho certeza de que chegaremos lá”, declara. Teresinha recorda ter enfrentado preconceito ao longo de sua trajetória, mas superou com perseverança: “Percebi o preconceito, mas dei a volta por cima, mostrando minha capacidade”, diz. Entre suas maiores conquistas, ela cita o orgulho de sua família e o espaço que conquistou na política local, como vereadora. Teresinha vê a tecnologia como uma aliada poderosa e espera que o futuro traga igualdade de oportunidades entre homens e mulheres. Seu conselho para as mulheres que iniciam no setor é claro: “Lutem para não serem ignoradas. Mostrem que somos capazes de enfrentar qualquer desafio; é só querer”, conclui.

Um caminho a perseguir

Gentilia Gonzatti, de 62 anos, lembra que a agricultura foi seu único caminho, pois as oportunidades de estudo eram poucas. Apesar das dificuldades, o orgulho pelo que faz é evidente. “A mulher rural assume o papel de dona de casa e agricultora. Representamos um número crescente de mulheres no campo”, afirma. Para ela, o maior desafio são os homens que ainda têm uma visão tradicionalista, julgando que as mulheres não têm a mesma capacidade de enfrentar os desafios. Ela se orgulha especialmente por ter criado os filhos sozinha, proporcionando-lhes uma boa formação. “Conseguir criar meus filhos numa boa formação foi a maior conquista da minha trajetória”, declara com emoção. Gentilia vê a tecnologia como um avanço essencial, tanto pelas máquinas que facilitam o trabalho quanto pelos recursos de comunicação e tem expectativas quanto a ação do Governo. “Espero que tenhamos apoio governamental para incentivos e capacitações específicas para mulheres, pois fazemos a diferença no meio rural”, conclui. Seu conselho é um incentivo à resiliência: “Agarrem-se com firmeza e não desistam facilmente. Com força de vontade, a mulher pode seguir na vida de campo”, pontua..

Herança de família

Ivone Riboldi Bellé, 63 anos, cresceu na agricultura, ajudando o pai no cultivo de uvas desde os sete anos. Ela valoriza as tradições familiares e reconhece a importância da renda que a viticultura proporciona. “Sempre temos decisões para tomar, mas resolvo um problema de cada vez. Isso torna o dia a dia mais leve”, conta. Para Ivone, a mulher tem um olhar único para a agricultura, contribuindo nas decisões de maneira rápida e serena. “A mulher é importante para o desenvolvimento e as tomadas de decisão”, afirma. Ela observa que, embora algumas coisas tenham avançado, a divisão de tarefas domésticas e do campo ainda não é equilibrada. “Os homens ainda têm maior participação, mas há cada vez mais incentivos para a inclusão feminina”, diz. Ivone também enfrentou preconceitos no passado, ouvindo que algumas atividades não eram para mulheres, mas hoje se sente plenamente aceita e respeitada. Ela se orgulha de administrar quatro propriedades e de lidar com os funcionários com uma postura de liderança.

Ivone reconhece o impacto positivo da tecnologia, especialmente com as inovações que acompanha pela cooperativa Aurora, como o caderno de campo digital e produtos de tratamento modernos para os vinhedos. Suas expectativas para o futuro são otimistas: “Acredito que o futuro será melhor, com mais tecnologias e novas técnicas que facilitarão nosso trabalho”, comenta. Ela incentiva as mulheres a perseverarem, ressaltando que o trabalho no campo, embora árduo, é gratificante. “Quando colocamos amor no que fazemos, colhemos bons resultados”, conclui.
Essas histórias revelam um quadro de superação, determinação e paixão pela terra. Com a ajuda da tecnologia e a quebra de barreiras de gênero, essas mulheres representam a força feminina que transforma a agricultura e inspira futuras gerações de agricultoras.