Uma vez, na década de 80, chique era fumar. Homens, mulheres, adolescentes demonstravam empoderamento ao acender e tragar um. Graças a campanhas de conscientização, valor alto da tributação e consciência da população, ganhamos a batalha contra o fumo. O que não esperávamos é que, décadas mais tarde, trocaríamos de vício sem sequer nos darmos conta. Sem dúvida nenhuma, esse é o item que mais tiramos do bolso por dia e que boa parte da população mundial tem um em seu bolso.
Para esse instrumento ser tão viciante, estudos de psicologia, neurologia e até de cassinos são usados pelos ‘experts’ da tecnologia. O objetivo é um só: nos tornar dependentes! O cigarro estava nas novelas de TV, nos filmes, na música, nas propagandas, já que 30% a 40% da população, pelo menos, no Brasil, fumava século passado. O cigarro foi a coisa mais viciante que a humanidade já inventou até então. Hoje, ele foi abominado e é até difícil de imaginar que as pessoas podiam fumar em boates, restaurantes, escolas, transportes e demais lugares públicos sem punição.
Quando olhamos para trás, nos surpreendemos ao perceber como as pessoas se deixavam escravizar por algo tão nocivo. No entanto, desde o surgimento e o fácil acesso ao smartphone, nos tornamos mais dependentes que o cigarro fora outrora. O smartphone já vicia mais gente e de forma mais intensa que o cigarro. Vivemos grudados neles jogando, cuidando a vida alheia, acessando informação.
Entretanto, o que pouca gente sabe é que por trás dos ícones que acessamos e aplicativos que baixamos, as empresas da tecnologia fazem um esforço consciente para nos manipular e, claro, conseguem. “A internet é a maior máquina de persuasão e vício já construída”, diz Aza Raskin, ex-programador do Google. O rolar do dedo pela tela também é outro fator pensado para alimentar o vício de ter sempre conteúdo em mãos. É o chamado rolagem infinita, que mexe com a sua cabeça de modo a torná-lo viciado. “Só Deus sabe o que estamos fazendo com o cérebro das crianças”, afirmou Sean Parker, um dos fundadores e primeiro CEO do Facebook, num debate em 2018.
Primeiro, você provavelmente é bem mais dependente dele do que imagina. Segundo, na prática é difícil conter o uso do celular. O que está havendo é um sequestro de atenção e consciência num nível tão intenso que, até na rua, na praia, durante o sono, precisamos estar conectados. É muito difícil estarmos em um cômodo distinto de nosso aparelho celular. Com isso, comprovadamente, aumentam casos de TDAH em crianças, distraídas pelas horas em excesso nas telas. Perdemos a conexão do mundo a nossa volta. Difícil olharmos as paisagens no dia a dia. Tudo se remete a uma mísera tela.
Mais estudos mostram que o uso excessivo de smartphone está ligado ao aumento das taxas de ansiedade, depressão, além de déficit de atenção, inclusive com alterações na estrutura do cérebro. Especialistas dizem que estamos em uma epidemia de distração. Filhos que mendigam atenção dos pais. Casais que não dialogam mais. Pais que perdem seus filhos em um quarto. Avalanches de pacientes em consultórios psicológicos. O celular virou uma espécie de caça-níquel. Ele elevou os índices de pornografia infantil. De adultério. Golpes se intensificaram. As fake news tomaram uma proporção inimaginável.
Tão pequeno o dispositivo para tanto poder que possui. Esse eletrônico, como as drogas ilícitas, fazem o cérebro liberar dopamina mesmo que não haja um comportamento benéfico. As notificações fazem o cérebro liberar cortisol, hormônio ligado ao estresse. Hoje, há um conceito que se chama “economia da atenção”. Seu princípio central é o seguinte: a informação consome atenção. Logo, quanto maior a oferta de informação, maior a escassez de atenção. Entre 2003 e 2016, o número de casos de transtorno de atenção e hiperatividade (TDAH) em crianças e adolescentes cresceu 43% nos Estados Unidos.
E mesmo quem não tem TDAH já sentiu isso na pele: parece cada vez mais difícil manter a atenção focada num livro, filme ou até vídeo. Posso dar algumas dicas – especialmente a pais de crianças – a fim de evitar que você tenha que trocar a tela do celular pelo consultório do psiquiatra. – desative as notificações, deixe apenas de pessoas importantes ativadas; – afaste-se do celular quando precisa se concentrar em tarefas específicas, uma dica é o método de concentração Pomodoro; – tenha regras claras e rígidas e faça cumprir: proiba celular na mesa ou na hora de dormir. – tenha hobbies junto à família;- – limite o tempo de uso do celular.
O Instagram, por exemplo, pode avisar e bloquear depois de uma hora por dia conectado; – deixe o celular em modo silencioso, especialmente as notificações e mensagens; – evite usar o Whats Web no seu computador. Ele vai roubar todo o seu tempo e a sua produtividade; – supervisione o acesso; – seja a mudança que você quer ver no mundo, o exemplo a seus filhos e estudantes. Eduque os usuários para o uso saudável dos dispositivos eletrônicos. Sempre tem um começo. Comece agora mostrando quem manda em quem. Se é feio e faz mal à saúde fumar, você não imagina a droga que está consumindo sem perceber. Apague essa ideia!