Com forte presença digital e foco em equilíbrio entre vida pessoal e profissional, os jovens da Geração Z trazem mudanças significativas nas relações de trabalho, valorizando bem-estar emocional e propósito em suas carreiras

Com a chegada da Geração Z, nascidos entre 1996 e 2010 ao mercado de trabalho, um novo cenário começa a se desenhar, trazendo mudanças significativas nas relações profissionais e nas expectativas em relação ao trabalho. Segundo dados da ONU, em 2019, essa geração representava cerca de 31,5% da população mundial. Os jovens dessa geração cresceram em um contexto marcado pela rápida evolução tecnológica, pela internet e pelo acesso massivo às redes sociais. Essas influências moldaram uma visão de mundo que difere substancialmente das gerações anteriores, como os Millennials e a Geração X.

Diversidade dentro da Geração Z

Para compreender melhor essa tendência, Jonathan Henriques do Amaral, sociólogo e professor do IFRS – campus Bento Gonçalves, aborda uma visão crítica acerca do tema. Antes de analisar as razões por trás da preferência pelo trabalho, Amaral destaca um ponto crucial: a noção de “geração” pode ser problemática. “Pressupõe-se que todos os nascidos em um mesmo período histórico compartilham das mesmas experiências e aspirações, o que é um equívoco”, ressalta o sociólogo. Ele lembra que, além de fatores geracionais, é fundamental considerar a condição socioeconômica. “É preciso levar em conta uma série de fatores, como a condição financeira. Um jovem de classe baixa pode a começar a trabalhar mais cedo por necessidade, e não necessariamente porque não quer estudar. Fatores culturais também podem influenciar”, explica.

Na região de Bento Gonçalves, por exemplo, Amaral aponta a forte valorização cultural do trabalho como um possível influenciador nas escolhas dos jovens. A necessidade de independência financeira também surge como um fator importante, especialmente em um cenário econômico incerto. No entanto, ele pondera que ainda existem muitos adolescentes que buscam cursar o ensino superior, desmistificando a ideia de que todos os jovens dessa geração estariam mais inclinados ao trabalho. “Na nossa região, a cultura de valorização do trabalho é muito forte, e isso também pode influenciar na decisão de um jovem de priorizar o trabalho em detrimento do estudo. De qualquer forma, como professor de ensino médio, percebo que ainda há muitos adolescentes interessados em cursar o ensino superior”, destaca.

Mudanças na visão de trabalho

Em comparação com as gerações anteriores, como os Millennials e a Geração X, a Geração Z apresenta algumas diferenças notáveis na forma de encarar o trabalho. “Eles tendem a priorizar mais a vida pessoal e apresentam maior dificuldade em lidar com hierarquias”, observa Amaral. A frustração com o ambiente profissional também parece ser um aspecto mais presente nessa nova geração. Isso se reflete na busca por ambientes de trabalho mais flexíveis e alinhados com seus valores pessoais. “O desejo de independência financeira é apontado como um dos motivos para essa tendência. A própria necessidade financeira pode levar um jovem a deixar de estudar para trabalhar”, destaca.

A pressão por sucesso rápido, muitas vezes amplificada pelas redes sociais e pela cultura do “hustle” — que glorifica o trabalho constante e a busca incessante por resultados — tem um impacto significativo. “O excesso de dedicação ao trabalho pode levar a problemas de saúde física e mental, uma preocupação crescente entre os jovens. “Levando em conta que os mais jovens tendem a utilizar mais redes sociais, a probabilidade de serem influenciados por elas é maior, já que ficam mais expostos às informações que recebem dessas mídias. A cultura do “hustle” certamente é um problema, pois a produtividade de uma pessoa também depende do descanso e do lazer. Uma pessoa que só se dedica ao trabalho tem grandes chances de desenvolver problemas de saúde físicos e mentais, o que traz implicações negativas para o próprio trabalho. É preciso haver equilíbrio entre as demandas da vida profissional, o descanso e o lazer. No entanto, segundo alguns estudos, os membros dessa “geração” têm buscado priorizar seu bem-estar físico e psicológico. Ou seja, como em qualquer outra faixa etária, há uma diversidade muito grande”, alerta o sociólogo.

Uma das maiores preocupações de Amaral é o impacto de longo prazo para os jovens que optam por priorizar o trabalho em detrimento dos estudos. “No Brasil, os salários tendem a ser maiores com o aumento do nível de formação”, aponta. Além disso, o rápido avanço tecnológico está transformando o mercado de trabalho, criando novas oportunidades para aqueles com maior qualificação, ao mesmo tempo que elimina funções mais básicas.

Outro ponto importante levantado pelo sociólogo é o crescimento pessoal proporcionado pela educação. “O conhecimento permite ampliar a visão de mundo, independente da sua aplicação direta no trabalho”, afirma. Ao deixar de lado a educação formal, os jovens podem perder tanto oportunidades profissionais quanto experiências de crescimento pessoal que moldam a forma como se veem e como interagem com o mundo.

O papel das redes sociais no trabalho

Uma característica marcante da Geração Z é sua conexão com o mundo digital. Muitos jovens estão utilizando a internet e as redes sociais como plataformas para gerar renda, aproveitando novas formas de trabalho que surgem com o avanço das tecnologias. Amaral vê esse fenômeno como uma adaptação natural às transformações sociais. “Os mais jovens estão mais imersos nesse mundo das redes sociais e são mais propensos a se aventurar nessas novas possibilidades”, explica.

Essa nova realidade também afeta as instituições de ensino, que enfrentam o desafio de manter o interesse dos jovens pela educação formal em meio a um excesso de estímulos proporcionado pelas mídias digitais. “Os jovens estão acostumados a receber informações rápidas e fragmentadas, enquanto o processo de aprendizagem demanda foco e aprofundamento”, aponta o sociólogo. A busca por um equilíbrio entre essas duas realidades será essencial para garantir que a educação continue a ser relevante e atraente para as novas gerações.

Para Amaral, uma das soluções para equilibrar a balança entre trabalho e estudo seria o fortalecimento do ensino técnico no Brasil. “Investir no ensino técnico permitiria que os jovens ingressassem no mercado de trabalho já qualificados, sem precisar abrir mão dos estudos”, sugere. O sociólogo também menciona a importância de cursos de graduação tecnológica, que são mais rápidos e focados no mercado de trabalho, além de programas que desenvolvam habilidades relevantes para o ambiente profissional, como leitura, escrita e competências em informática.

Por fim, ao ser questionado sobre como a Geração Z está redefinindo o conceito de sucesso, Amaral reflete sobre a diversidade de aspirações. “Há jovens que seguem a cultura do ‘hustle’, mas também muitos que priorizam sua saúde e bem-estar, em detrimento do trabalho”, afirma. Ele sugere que, ao contrário das gerações passadas, muitos jovens hoje não buscam necessariamente cargos de liderança ou altos salários, preferindo um estilo de vida que equilibre vida pessoal e profissional.

Para entender as particularidades dessa geração no ambiente de trabalho, é importante refletir sobre as características que a definem e como essas moldam seu comportamento no mercado profissional. Conforme destaca a professora Dra. Silvana Regina Ampessan Marcon, do curso de Psicologia da Universidade de Caxias do Sul (UCS), “não podemos generalizar as informações, pois não existe padronização no comportamento humano, mas sim probabilidades”, comenta.

Um dos pontos centrais sobre a Geração Z é sua relação com o estudo e o trabalho. Embora muitos jovens demonstrem interesse em ingressar rapidamente no mercado, a busca por educação formal ainda é significativa. A professora Silvana aponta que a geração valoriza a qualidade e prioriza ambientes que ofereçam colaboração e troca de ideias. No entanto, o sistema educacional enfrenta desafios para se adaptar às demandas desse público, o que, em alguns casos, resulta em uma maior atração pelo trabalho do que pelo ensino superior. Para a professora, investir em projetos como o Projeto de Vida, exigido no Novo Ensino Médio, é crucial para engajar esses jovens na educação. “É preciso investir para que os alunos da geração Z frequentem o projeto ativamente. Para isso, novos comportamentos são necessários também dos professores”, diz.

A Geração Z também se destaca por sua habilidade multitarefa, rapidez de pensamento e afinidade com ambientes dinâmicos. Essas características são especialmente valiosas para as empresas, que veem nessa geração um potencial inovador. “Jovens dessa faixa etária buscam simplificar processos e aumentar a produtividade”, o que, segundo a professora, reflete diretamente no desempenho das equipes.

As diferenças geracionais no ambiente de trabalho

Comparada às gerações anteriores, a Geração Z tem uma abordagem diferenciada em relação ao trabalho. Enquanto a Geração X, (Nascidos entre 1965 até o final da década de 1970) por exemplo, valorizava a estabilidade e o respeito a hierarquias bem definidas, os jovens de hoje, são mais flexíveis e focados em otimizar tarefas, evitando processos burocráticos. Diferente da Geração Y (Nascidos entre o final da década de 1970 e início da década de 1990) que desafia as hierarquias, quer crescer e evoluir com certa rapidez. Não se preocupa em ficar muito tempo na mesma empresa como é o caso da geração X. A geração Y é empreendedora, arrisca com mais facilidade naquilo que acredita ser importante para si e valoriza muito o seu conhecimento. De acordo com a professora Silvana, “a Geração Z é realista, prática e busca satisfazer suas necessidades financeiras e pessoais, além de ser avessa a extremismos, respeitando as diferenças e utilizando o diálogo como ferramenta”, pondera.

Essa nova mentalidade também afeta a forma como a Geração Z lida com questões como independência financeira. Diferente das gerações passadas, eles não se preocupam apenas em ganhar dinheiro, mas buscam um equilíbrio entre realização profissional e qualidade de vida. “São empreendedores, muitas vezes desprendidos de questões materiais, e priorizam fazer o que lhes faz sentido”, ressalta a psicóloga.

Pressão por sucesso e ansiedade

Um dos pontos mais debatidos sobre a Geração Z é o aumento da ansiedade e do estresse. Embora alguns jovens optem por priorizar o trabalho, a professora Silvana destaca que isso não é uma regra. “Eles priorizam o que lhes faz mais sentido no momento”, explica. A pressão por sucesso pode ser tanto interna quanto externa, mas está diretamente ligada ao desejo de alcançar suas metas rapidamente.
O mercado de trabalho, por sua vez, está se adaptando às expectativas dessa nova geração. Flexibilidade, autonomia e propósito são algumas das exigências dos jovens profissionais. Empresas que conseguem alinhar suas missões aos valores da Geração Z têm mais chances de atrair e reter talentos. Além disso, muitos jovens têm utilizado a internet e as redes sociais como plataforma para gerar renda, explorando o empreendedorismo digital como uma alternativa ao emprego tradicional. “A Geração Z busca mais do que um simples emprego; eles almejam propósito. Muitos desta geração querem trabalhos que ofereçam um impacto positivo na sociedade e oportunidades de contribuir para algo maior são altamente valorizados. Empresas que conseguem articular uma missão clara e alinhada com os valores desta geração têm mais chances de atrair e reter talentos”, destaca.

A Geração Z tem mostrado que o sucesso não se limita ao ganho financeiro. Para muitos, o bem-estar emocional, o impacto social e a busca por propósito são prioridades. Isso tem levado as empresas a repensarem suas políticas de gestão de pessoas, buscando maior flexibilidade e inovação. A educação, por sua vez, precisa se adaptar para manter o interesse desses jovens, promovendo um ambiente que valorize a colaboração e a troca de ideias.

Como conclui a professora Silvana, “compreender a dinâmica da Geração Z no ambiente de trabalho é essencial para as organizações que buscam não apenas atrair, mas também manter esses profissionais engajados e produtivos”, finaliza.