Ação beneficia 14 mulheres de diversas idades e profissões que se encontram semanalmente para aprender a técnica do bordado, expressando na arte suas vivências
A ação “Memórias Bordadas”, projeto financiado pelo Fundo Municipal de Cultura de Bento Gonçalves reúne 14 mulheres de 23 a 70 anos, com diferentes rendas e profissões: professora, secretária, higienizadora, cuidadoras de idosos, aposentadas e donas de casa. Há mulheres com neuro divergência, necessidades especiais, de diferentes raças e religiões. Nem todas são de Bento Gonçalves, com procedências de outras cidades gaúchas como Nova Prata e Santa Rosa, além do estado do Pará e até do Haiti.
Em encontros semanais, elas estão aprendendo a técnica do bordado livre, expressando no tecido, ponto a ponto, suas memórias e vivências. A proposta é promover a leitura a partir de mediações literárias, além de criar uma nova possibilidade de geração de renda. Até final deste mês, serão 14 encontros, todos na Praça CEU, no bairro Ouro Verde.
A cada encontro, novas reflexões a partir das leituras trazem à tona memórias significativas para cada uma delas, que são compartilhadas numa roda de conversa enquanto fazem o trabalho manual. Selecionadas entre 30 inscritas, estas mulheres têm diferentes ocupações, o que gera uma troca ainda mais rica em torno das experiências que cada uma tem a compartilhar.
Segundo a proponente do projeto, Neiva Morello Michelin, a importância do projeto Memórias Bordadas está em trazer ao presente uma herança cultural, a técnica do bordado, aliada às reflexões propostas pelas histórias contadas. “As histórias e memórias relatadas são representadas nos bordados, posteriormente. Esse é um momento de trocas que possibilita o empoderamento feminino e a transformação social”, destaca a organizadora, que também é mediadora literária e instrutora de bordado.
Os encontros da ação na Praça CEU vão até 28 de agosto. Depois disso iniciam as exposições dos bordados, que também estarão em formato de livro. A produtora cultural do projeto, Eunice Pigotto, destaca que esse é um livro único. “Vai ser uma única reprodução que ficará disponível junto às exposições , então ele não vai ser impresso, não vai ter essa característica. É um livro em um formato grande e todo feito de tecido, sendo que cada uma das participantes vai escolher cinco bordados produzidos na oficina para compor o livro”, salienta. As exposições vão ocorrer na Praça CEU, de 4 a 16 setembro; no Centro Cultural Tuiuty, de 17 a 30 de setembro; na 39ª Feira do Livro de Bento Gonçalves, de 9 a 20 de outubro e no Museu do Imigrante, de 5 a 11 de novembro.
Contação de histórias
Além de bordar e trocar experiências através da prática artesanal as participantes recebem um exemplar de cada livro selecionado para a contação de histórias. Ao todo, serão utilizadas seis obras literárias, totalizando 107 exemplares para as 14 mulheres participantes. “A contação de histórias acontece a cada dois encontros, porque cada participante recebe um exemplar do livro para realizar a leitura em casa. No encontro seguinte, retomamos para novas reflexões a partir da leitura individual. Assim, as lembranças são ativadas e registradas nos bordados”, destaca Neiva.
O registro de cada encontro e das memórias que o processo despertar será tecido socialmente, através das linhas e agulhas em uma prosa de afeto, resultando no livro único. Além do livro, a mostra também vai expor estandartes bordados por cada uma das mulheres com suas memórias mais significativas e um vídeo com momentos do projeto.
As participantes
As falas das participantes da oficina revelam a profundidade e a riqueza da experiência que cada uma vivencia. Wandirlei Terezinha Machado Charao, de 71 anos, compartilha que a experiência tem sido excelente. Para ela, além do contato interpessoal e da oportunidade de fazer novas amizades, o projeto oferece um espaço para o crescimento pessoal. “O bordado em si está me desenvolvendo, me descobrindo,” diz Wandirlei, destacando a diferença entre criar um bordado aleatório e trabalhar com um tema específico, o que ela considera gratificante e realizador.
Angela Maria Bissolotti, professora de Educação Básica, de 34 anos, expressa seu entusiasmo pelo projeto, declarando que está apaixonada. “Poder rememorar estas vivências trouxe luz a tantos momentos incríveis da minha vida”, reflete. Ela também valoriza as histórias compartilhadas nas oficinas, que, segundo ela, a engrandecem como pessoa. “Poder ouvir histórias contadas de maneira majestosa, tanto nos livros escolhidos, quanto às trazidas pelas participantes, me engrandece como pessoa e me faz compreender a grandiosidade da existência de cada uma das amigas que estão no projeto. As memórias de cada uma vão tomando forma através dos pontos, o que faz com que compreendamos ainda mais a pluralidade do grupo”, observa.
Marivani Cenci, de 54 anos, descreve sua experiência como incrível. Ela compara o ato de bordar a criar uma obra de arte, utilizando linhas coloridas e agulha. Para Marivani, as histórias contadas durante as oficinas evocaram lembranças de sua infância, que foram então bordadas, tornando as tardes com o grupo de mulheres terapêuticas. Além disso, ela compartilha sua trajetória artística, iniciada há mais de sete anos, que inclui pintura a óleo e outras técnicas. Para Marivani, a arte do bordado preencheu um vazio. “Me identifiquei pela arte pois queria que a sociedade me enxergasse com um olhar diferente. Ser deficiente físico muitas vezes, faz com que as pessoas sejam excluídas. A arte do bordado veio para preencher um espaço em branco que hoje é cheio de cor”, revela.
Feito à mão e com o coração, o bordado tece muito mais do que imagens. Sendo assim, este projeto foi pensado para proporcionar às mulheres uma oportunidade de refletir sobre suas vidas enquanto bordam, colocando no tecido suas aspirações e experiências. O bordado também é uma maneira de proteger a herança cultural ao mesmo tempo em que capacita para uma atividade que pode gerar renda digna e segura, desenvolvendo o empreendedorismo.
A equipe conta, ainda, com a participação da bordadeira Deise Ceccagno e da assistente de produção Daíze Correa Figueredo. As ações estão sendo compartilhadas pelo Instagram @projetomemoriasbordadas.