Em homenagem ao Dia do Artista de Teatro, o Semanário entrevistou um ator e uma atriz da Epopeia Italiana, que contaram um pouco sobre as experiências vividas no meio
A história das representações teatrais no Brasil remonta ao período colonial, quando os primeiros registros de apresentações teatrais datam do século 16, com a chegada dos jesuítas. Como um instrumento de aculturação sobre a população dos povos originários, eles utilizavam o teatro como uma ferramenta de evangelização e ensino da língua portuguesa. Na época, destacava-se o padre José de Anchieta, que escreveu peças em português e tupi-guarani para catequizar os indígenas.
No século 19, o teatro no Brasil começou a se estruturar de forma mais profissional, com a construção de teatros em grandes cidades como Rio de Janeiro e Salvador. A chegada da família real portuguesa em 1808 impulsionou o desenvolvimento das artes cênicas, com a criação da Casa da Ópera e posteriormente o Teatro São João (hoje conhecido como Teatro João Caetano). Durante esse período, as peças encenadas eram principalmente de autores europeus, mas também começaram a surgir autores brasileiros, como Martins Pena, conhecido como o “pai da comédia de costumes” no Brasil.
A partir do século 20, o teatro brasileiro passou por uma série de transformações, influenciado pelos movimentos modernistas e pela busca de uma identidade nacional nas artes. Nomes como Nelson Rodrigues e Ariano Suassuna se destacaram com obras que exploravam a realidade social e cultural do país. O teatro também se tornou um espaço de resistência política, especialmente durante a ditadura militar, quando grupos como o “Teatro Oficina” e o “Arena” desafiavam o regime por meio de suas produções.
O Dia do Artista de Teatro é celebrado no Brasil em 19 de agosto. Essa data foi escolhida para homenagear todos os profissionais envolvidos na produção teatral, desde atores e diretores até cenógrafos e ilustradores. O dia é uma forma de reconhecer a importância do teatro na cultura brasileira e valorizar aqueles que dedicam suas vidas a essa arte, que continua a ser um meio poderoso de expressão e reflexão social no país.
O teatro em Bento Gonçalves
O principal espaço para apresentações teatrais em Bento Gonçalves é a Fundação Casa das Artes. Este centro cultural multifuncional é crucial para o desenvolvimento das artes cênicas na cidade, oferecendo uma infraestrutura moderna para espetáculos de teatro, música, dança e outras manifestações culturais.
Refletindo a herança cultural da cidade, fortemente influenciada pela imigração italiana, o município é reconhecido por sua tradição vinícola, em meio a isso, o teatro floresce em representação, em um cenário vibrante da Epopeia Italiana.
Giovani Ballestrin Guerra e Mariluz Frozza se dedicam a transportar o público para uma das passagens mais marcantes da história brasileira: a imigração italiana. Trabalhando no parque cultural Epopeia Italiana, eles revelam como o amor pela história e o teatro se entrelaçam em sua vida e carreira.
Epopeia Italiana
O parque cultural Epopeia Italiana, em Bento Gonçalves, não apenas reconta a saga da imigração italiana no Brasil, mas a vive intensamente através de seus atores. Giovani Ballestrin Guerra, 31 anos, e Mariluz Frozza, 38, são exemplos dessa dedicação. Ambos interpretam personagens que carregam a força e a história dos imigrantes italianos, trazendo a narrativa à vida para o público que visita o parque.
Guerra, que trabalha na Epopeia Italiana há oito anos, sempre foi apaixonado pelo teatro. “Desde criança gosto de teatro, e quando surgiu a oportunidade de trabalhar na área, decidi me arriscar”, revela. Para ele, interpretar personagens que fazem parte de uma história tão rica e significativa é uma missão que carrega com orgulho. “Como amante da história, é sempre gratificante poder passar a informação de um fato tão importante da nossa história, ainda mais podendo transmitir essa informação com veracidade e fazendo com que o público tenha uma outra perspectiva sobre a imigração”, conta.
Já Mariluz, que começou sua carreira aos 14 anos, vê no teatro uma forma de realização pessoal. “Segui este caminho por ser meu sonho de infância. O teatro salvou minha vida”, conta. Hoje, ela interpreta uma personagem que ressoa profundamente com sua própria história. “Sinto orgulho e muita gratidão por fazer uma personagem guerreira, cheia de fé e coragem. Alguém de uma história real, que está no meu sangue também”, afirma.
Ambos enfrentam desafios únicos em suas interpretações. Guerra destaca a importância de ler o público e ajustar sua performance para criar o máximo impacto emocional. “O maior desafio é a leitura do público, saber onde e qual parte do texto ser usada da melhor maneira para descontrair ou para emocionar”, explica. Mariluz, por outro lado, fala sobre a dificuldade de manter a concentração enquanto interage diretamente com o público. “O desafio é estar 100% concentrada, pois a história não é contada num palco e sim no meio das pessoas, que interagem comigo ao mesmo tempo”, conta.
Com raízes profundas na história que interpretam, tanto Guerra quanto Mariluz sentem uma conexão pessoal com seus personagens. “Tenho descendência italiana por ambas as partes da minha família”, diz ele, lembrando com carinho da avó que ainda fala a língua vêneta. A atriz também compartilha dessa herança, sendo a 4ª geração descendente na família.
A preparação para entrar no clima da época é um processo que ambos levam a sério. O ator se apoia na convivência com descendentes italianos para trazer naturalidade à sua interpretação, enquanto a atriz utiliza técnicas teatrais e memórias de infância com sua avó para capturar a essência de sua personagem. “Mas principalmente meu sentimento de amor por aquilo que faço”, acrescenta Mariluz.
Um dos momentos mais impactantes para Guerra é a cena da saída do navio, onde o texto aborda as dificuldades enfrentadas pelos imigrantes. “É o momento mais dramático do espetáculo”, diz. Mariluz, por sua vez, destaca a cena que apresenta no Cenário de Bento Gonçalves, em que a vitória dos imigrantes, graças à fé, coragem e empenho é celebrada. “Isso é valioso, pois enche de orgulho tanto as pessoas que conhecem quanto as que não conhecem a história”, afirma.
O impacto emocional no público é inegável. “Muitas pessoas me abraçam chorando por saber que nossos antepassados sofreram”, compartilha Mariluz. Guerra vê o reconhecimento do público como uma prova de que sua missão foi cumprida.
Ambos os atores destacam como suas interpretações evoluíram ao longo dos anos, com a ajuda de treinamentos e a própria experiência adquirida. Guerra acredita que a vivência e os aprimoramentos contínuos moldaram um personagem mais sólido. Já Mariluz fala sobre como o amadurecimento e a confiança em seu potencial a ajudaram a crescer em sua arte.
Para o público que visita o espetáculo, ambos desejam que cada detalhe seja notado e apreciado. “Acredito que todo o espetáculo merece a atenção do público, como o figurino, os cenários, cada detalhe da ambientação da época”, afirma Guerra. Mariluz concorda, destacando a atenção aos detalhes nos cenários por onde o público passa.
Entre as muitas experiências marcantes dos bastidores, Mariluz lembra com carinho de um passeio feito entre os atores para conhecer uma casa onde foram gravadas cenas do filme que passa na Epopeia. “Foi um dia mágico”, recorda.
Os dois são movidos pelo amor ao teatro e à história que representam. “A minha inspiração é sempre poder contar a história como ela foi vivida”, declara Guerra. Para Mariluz, o amor pela profissão é o que a motiva todos os dias. “Simplesmente amo o que faço!”, enfatiza.