Um incansável trabalho de bombeiros, cães farejadores e voluntários segue à procura por quatro corpos soterrados pelos deslizamentos ocorridos no início de maio
A maior catástrofe climática registrada no Rio Grande do Sul e considerada, também, uma das maiores do Brasil, ocorrida no início de maio, continua trazendo angústia às autoridades, às forças de segurança e, principalmente, às famílias dos desaparecidos, que ainda são quatro em Bento Gonçalves. Lourdes Helena Lazarini, moradora da comunidade do Passo Velho, Distrito de Tuiuty, Carine Milani, Nelsa Faccin Gallon e Isabel Velere Antonello Gallon, da Linha Imaculada, no Distrito de Faria Lemos.
Conforme o coordenador dos trabalhos de busca, comandante do Corpo de Bombeiros local, capitão Gustavo Kist, atualmente são mais de 50 bombeiros que atuam nas localidades e também na extensão dos rios das Antas e Taquari, uma vez que os corpos podem ter sido levados pela força das águas. “Estamos utilizando binômios (militares com cães farejadores), drones, aeronaves não-tripuladas, além de contarmos com o apoio de equipes de fora do Estado”, destaca.
Bombeiros de 16 estados da Federação já estiveram na localidade, dentre eles, de São Paulo, Minas Gerais, Brasília, Mato Grosso, Rio de Janeiro, Santa Catarina, Roraima e Amapá. “Foram várias as equipes que nos apoiaram e apoiam com equipes especializadas e conhecimentos. Embora todos tenham passado por situações de catástrofe é difícil comparar, pois cada desastre é único, tem suas peculiaridades, suas formas de agir e de abordagem. Mas foi uma situação muito complexa, dadas as características, a constância de precipitações, o número de deslizamentos, o nosso relevo, que dificulta a locomoção por terra. Também ficamos muito tempo sem teto de voo para operar. Todo esse cenário acabou dificultando a resposta, mas felizmente conseguimos transpor essas dificuldades e fazer com que as pessoas que estavam em risco fossem salvas. Foram 1.052 salvamentos computados, mas, com certeza, foram muitos outros que acabaram sem registros em razão da urgência”, conta.
A angústia das famílias
Kist destaca que as famílias estão compreendendo o trabalho das equipes, que tentam, dentro do possível, externar as estratégias adotadas, a forma de operação e frisar que em momento algum as buscas vão acabar. “Seguimos realizando as atividades da forma mais intensa e técnica possível, porque o nosso objetivo é o mesmo. O quanto antes pudermos entregar para os familiares o ente querido, para nós, é o mais importante”, pondera.
O comandante diz, ainda, que enquanto houver buscas existe a possibilidade do encontro. “Batalhamos constantemente contra o tempo. Não trabalhamos com possibilidade de suspensão ou interrupção das buscas neste momento. Reavaliamos frequentemente, porque ainda percebemos que existem estratégias a serem superadas, desafios a serem transpostos e, sobretudo, vítimas a serem encontradas”, afirma.
O Capitão frisa, também, a parceria com a Defesa Civil, visando o acompanhamento das precipitações pluviométricas e do cenário como um todo, visando a necessidade de remoção de famílias, informações de áreas de risco ou mesmo a evolução das condições climáticas. “Atuaremos dentro das previsões que já existem, seguimos atentos, mas aguardamos aproximar um pouco mais para termos certeza de que se tornem precisas. Agiremos com a Defesa Civil, com os topógrafos e geólogos que têm atuado na ocorrência e nos apoiado muito”, conclui.
“Estamos testando nossos limites”, evidencia o comandante
São dias e noites de intenso trabalho. “É uma experiência de vida e uma experiência profissional muito grande. Estamos há mais de 40 dias operando. Tive a oportunidade de estar aqui desde o início, então, aprendemos muito, não só técnicas, mas resiliência, dedicação. Estamos testando nossos limites e a tolerância à frustração. Trabalhamos sobretudo o aspecto de união, de espírito de corpo e a constância na busca pelo nosso objetivo, que nesse momento é a localização das vítimas desaparecidas. É uma tragédia sem precedentes e um número que, apesar de que cada vítima é única e isso é muito triste, acaba sendo razoável dentro de um cenário catastrófico. Gostaríamos de ter zero vítimas, mas o cenário foi muito caótico e o alto número de salvamentos cabe ser ressaltado”, comemora.
Outro ponto destacado pelo comandante diz respeito à relevância do aeródromo no contexto do desastre. “O local foi de fundamental importância. Toda a equipe foi de grande valia, desde que se disponibilizaram a apoiar a operação. Chegamos a atuar com oito aeronaves de forma concomitante. Somamos 410 salvamentos por aeronaves tripuláveis. Conseguimos acessar muitas áreas, colocar muitas equipes em campo graças ao apoio do aeródromo, de uma organização do Corpo de Bombeiros, com os entes federados. Foi uma união muito importante entre a sociedade civil organizada e as instituições militares”, finaliza.