Produtores relatam a perda de alguns hectares de uva, com estimativa de prejuízos entre R$ 40 mil e 100 mil, enquanto comunidade e autoridades locais trabalham para a recuperação pós-catástrofe
O mês de maio de 2024 ficará marcado na história do Rio Grande do Sul pelas enchentes e deslizamentos que afetaram profundamente a região. O município de Santa Tereza, conhecido por suas belas paisagens e prósperas atividades agrícolas, sofreu um golpe devastador. Cerca de 40 propriedades rurais foram destruídas pelas enchentes, enquanto outras 70 foram arrasadas por deslizamentos de terra, deixando um rastro de destruição e prejuízos incalculáveis.
Em Santa Tereza, a situação é particularmente crítica. A cidade, que possui uma economia fortemente baseada na agricultura, viu grande parte de suas plantações de uva, milho e soja serem levadas pelas águas. Além disso, a infraestrutura rural, incluindo estradas, pontes e silos, foi severamente danificada.
A situação do município é um reflexo de um problema ainda maior que afetou todo o estado. Mais de 206 mil propriedades rurais foram impactadas pelas enchentes em diversas regiões do Rio Grande do Sul. As águas, que subiram rapidamente após dias de chuvas intensas, invadiram plantações, destruíram infraestruturas e deixaram muitos agricultores em situação de emergência.
Adriano Barella Stringhini, 38 anos, teve sua propriedade danificada pelos deslizamentos. Ele conta que teve a perda de pelo menos um hectare da sua produção de uva perdido. “No dia do deslizamento, ainda estávamos dormindo. Era por volta das meia-noite quando minha filha avistou o primeiro deslizamento, depois disso, vi que meu parreiral ficou coberto de pedras. Momentos depois, demos abrigo para um vizinho que acabou sendo afetado também. E somente no dia seguinte fomos embora da propriedade, para casa de amigos”, conta Stringhini.
O produtor estima que perdeu cerca de 40 a 100 mil reais e também não poderá mais cultivar na área atingida por um tempo. “Tem áreas que podem ser replantadas, mas isso tem um custo de 100 mil por hectares, outras não tem mais o que fazer, mesmo onde pode ser plantado de novo demora de três a quatro anos para produzir novamente”, revela.
O município de Santa Tereza foi um dos mais impactados pelas catástrofes de maio. E devido a isso, a prefeitura não conteve esforços para auxiliar os afetados. “A prefeitura começou logo a abrir as estradas para conseguirmos ter acesso às nossas propriedades. Da parte do governo federal e do estado não vi nada de concreto, mas ainda vamos esperar que ajudem mais. No início, tivemos muito medo de tudo acontecer novamente, porém, agora, já erguemos a cabeça e estamos arrumando os parreirais de novo com muita fé e coragem”, relata.
Bento Gonçalves um dos municípios atingidos pelas enchentes e deslizamentos ainda não possui uma estimativa de quantos produtores rurais foram atingidos pelo desastres.
Os agricultores do Rio Grande do Sul enfrentam agora o desafio de reconstruir suas vidas e propriedades. As enchentes não apenas destruíram bens materiais, mas também comprometeram a produção agrícola, que é a principal fonte de sustento para muitas famílias na região. O solo encharcado, a perda de safras e a destruição de maquinário agrícola são alguns dos problemas enfrentados pelos produtores.
Considerando o volume, a maior perda ocorreu na produção da soja. Foram 2,71 milhões de toneladas perdidas. A estimativa divulgada em março deste ano pela Emater/RS-Ascar era que fossem colhidas 22,24 milhões de toneladas, em uma área plantada de 6,68 milhões de hectares, com produtividade de 3.329 quilogramas por hectare. Descontando a área afetada pelas chuvas e as perdas, a nova estimativa de produção é de 19.532.479 toneladas, com produtividade média de 2.923 quilogramas por hectare.
A produção pecuária gaúcha também foi severamente impactada, exigindo longo período para recuperação. As perdas de animais afetaram de forma significativa 3.711 criadores gaúchos. O maior número de animais mortos foi de aves, totalizando 1.198.489 indivíduos adultos. Também houve perdas substanciais de bovinos de corte e de leite, suínos, peixes e abelhas.
O período do evento climático extremo coincidiu com a fase final de frutificação de importantes variedades de citros, em especial a bergamota, que já estava em colheita. Em muitos pomares, o solo ficou alagado, não somente em razão da inundação, mas por vários dias com precipitações volumosas. Os citros, na região dos Vales, e a banana, nas encostas da Serra do Mar, foram as culturas mais prejudicadas, com impacto para 8.381 propriedades.
O abastecimento de hortaliças nos centros urbanas foi fortemente afetado. As culturas de folhosas e leguminosas sofreram maior impacto na região Metropolitana, na Serra e nos vales do Taquari e do Caí.
Considerando o volume e a área plantada, as maiores perdas foram de batata, brócolis e aipim. As dificuldades logísticas para escoar a produção remanescente e a incerteza sobre a demanda provocaram a redução da oferta, mas não houve interrupção total, situação que permitiu uma menor elevação dos preços na Ceasa/RS.
A intensidade das chuvas danificou a estrutura foliar das olerícolas folhosas (alfaces, rúculas e radiches) e dos temperos (salsa e cebolinha). Houve prejuízos também em relação à qualidade e à aparência das verduras.
O período das chuvas coincidiu com o momento tradicional de mudança das áreas de cultivos olerícolas, em especial na região de Maquiné e no Vale do Paranhana. Nos meses de verão, os cultivos são transferidos para áreas de maior altitude, como nos Campos de Cima da Serra (São Francisco de Paula e Cambará do Sul).
O relatório técnico completo inclui, ainda, os impactos para os povos tradicionais, a cultura do arroz, a floricultura, o abastecimento, o cooperativismo, as produções leiteira e florestal, além de dados meteorológicos e ações para o enfrentamento da calamidade.
Ações do governo
Diante da calamidade, o governo estadual declarou situação de emergência em várias regiões afetadass. As autoridades mobilizaram equipes de resgate e assistência para ajudar as comunidades atingidas. No entanto, a reconstrução das propriedades rurais e a recuperação da produção agrícola demandarão tempo e investimentos significativos.
A solidariedade entre os moradores também tem sido um fator crucial para enfrentar a crise. Em muitas comunidades, vizinhos se uniram para ajudar uns aos outros, compartilhando recursos e oferecendo apoio emocional e material. Organizações não-governamentais e grupos de voluntários também têm trabalhado incansavelmente para fornecer ajuda às famílias desabrigadas e a distribuir alimentos e suprimentos.
O caminho para a recuperação
A recuperação das propriedades rurais afetadas pelas enchentes e deslizamentos no Rio Grande do Sul será um processo longo e árduo. Especialistas destacam a importância de medidas preventivas para mitigar os impactos de futuras catástrofes naturais. A construção de infraestruturas mais resilientes, a implementação de sistemas de alerta precoce e a adoção de práticas agrícolas sustentáveis são algumas das ações sugeridas.