Em entrevista ao Semanário o Secretário Geral da Associação Ativista Ecológica, Gilnei Rigotto, destaca a ineficácia das campanhas ecológicas atuais, alerta para os impactos da agricultura intensiva e defende uma atuação mais proativa e consciente de indivíduos e governos para salvar o planeta
O Dia Mundial do Meio Ambiente, celebrado em 5 de junho, foi instituído pela Organização das Nações Unidas (ONU) durante a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo em 1972. Esta conferência foi um marco significativo na história da conscientização ambiental global. Pela primeira vez, líderes mundiais e especialistas se reuniram para discutir a preservação dos recursos naturais e a sustentabilidade do planeta, estabelecendo princípios orientadores para as políticas ambientais globais.
Semana do Meio Ambiente 2024
Anualmente, a ONU escolhe um tema para nortear as ações do Dia Mundial do Meio Ambiente. Em 2024, a temática é “Acelerar a restauração da terra, a resiliência à seca e o progresso da desertificação”, com o evento principal sediado pela Arábia Saudita. Este tema é particularmente relevante, dado que dois terços da Terra estão atualmente em processo de desertificação, um fenômeno causado principalmente por ações humanas como desmatamento, práticas agrícolas inadequadas, exploração excessiva dos recursos naturais e más práticas pecuárias.
A desertificação é o processo de degradação do solo em áreas áridas, semiáridas e subúmidas secas, resultando na perda de vegetação e da capacidade produtiva do solo. Este fenômeno afeta diretamente a subsistência de bilhões de pessoas, especialmente nas regiões mais vulneráveis do planeta. A ONU estima que a restauração de apenas 15% das terras degradadas poderia prevenir até 60% das extinções de espécies ameaçadas, destacando a importância crucial de ações imediatas e efetivas.
Para que as atividades da Semana do Meio Ambiente tenham um impacto duradouro, é fundamental investir em educação ambiental. Ensinar a importância de separar o lixo corretamente, escolher produtos mais sustentáveis e reduzir o impacto ambiental são passos cruciais para construir uma sociedade mais consciente e responsável.
A Arábia Saudita, anfitriã do evento principal de 2024, está profundamente comprometida com a restauração de terras e a resiliência à seca, tanto em nível nacional quanto regional. Ações como a Iniciativa Verde Saudita e a Iniciativa Verde do Oriente Médio são exemplos de esforços para combater a desertificação e promover a sustentabilidade.
A restauração de terras degradadas não só melhora os meios de subsistência e reduz a pobreza, mas também aumenta a resiliência às condições climáticas extremas e contribui para a mitigação das mudanças do clima.
Apesar dos desafios, há esperança real. Países ao redor do mundo prometeram restaurar um bilhão de hectares de terras, uma área maior do que a China. A implementação dessas promessas pode ter um impacto significativo na desaceleração das mudanças climáticas, proteção da biodiversidade e melhoria dos meios de subsistência de bilhões de pessoas. O Dia Mundial do Meio Ambiente de 2024 e a conferência das partes da Convenção das Nações Unidas para o Combate à Desertificação são oportunidades para catalisar ações e alcançar essas metas de restauração.
A Semana Mundial do Meio Ambiente é um lembrete poderoso da nossa responsabilidade coletiva de proteger e preservar o planeta. Através da ação conjunta e do compromisso contínuo, é possível construir um futuro mais sustentável e resiliente para todos.
No contexto da Semana Mundial do Meio Ambiente, o Semanário entrevistou Gilnei Rigotto, Secretário Geral da Associação Ambiental e Ecológica Comunitária (AAECO). Rigotto traz uma visão crítica e incisiva sobre a eficácia das campanhas ambientais, os desafios da agricultura intensiva, a preservação das áreas verdes e as energias renováveis, entre outros temas cruciais para o meio ambiente.
Segundo Rigotto, há um grande descompasso entre as discussões sobre questões ambientais e as ações práticas efetivadas, tanto por entes públicos quanto privados. Ele destaca que, com raras exceções, muitas dessas discussões não se traduzem em ações concretas que realmente fazem a diferença no meio ambiente. “O que vemos são campanhas pífias e sem resultados. Precisamos de mutirões de pessoas botando a mão na massa, e não apenas nos teclados”, afirma.
Rigotto critica a falta de criatividade nas campanhas ecológicas, apontando que a eficácia depende justamente da inovação e da implementação de ações práticas. “Infelizmente vivemos uma crise de criatividade ecológica. Fazer diferente seria mobilizar pessoas para ações diretas, como plantios coletivos e recuperação de áreas degradadas”, comenta.
Agricultura Intensiva
O secretário geral da AAECO alerta para os impactos negativos da agricultura intensiva, que leva à exaustão dos nutrientes do solo e à necessidade de correções caras, além do uso exagerado de agrotóxicos. “A agricultura intensiva gera exaustão da terra e nutrientes do solo, por consequência exige correções custosas e aplicação de agrotóxicos. O impacto é necessidade de novas áreas e deixa-se a área degradada ou desértica com erosão, sem vida. Temos que diversificar as plantações, plantio direto e agricultura orgânica. É falácia que não é possível em grande escala”, explica. Rigotto defende a diversificação das plantações, o plantio direto e a agricultura orgânica, afirmando que é uma falácia dizer que estas práticas não são viáveis em grande escala.
Urgência irreversível
Rigotto acredita que já ultrapassamos o estado de emergência extrema na questão ambiental. “Desde os anos 80 defendo a urgência máxima, mas hoje podemos estar em um ponto irreversível, com oito bilhões de seres humanos, a maioria sem a real consciência de nossos impactos no planeta”, ressalta.
Uma das vitórias da AAECO foi a ação no Ministério Público que conseguiu barrar a venda de áreas verdes no município, algumas das quais são Áreas de Preservação Permanente (APPs). “A proposta é simplesmente respeitar as áreas verdes e APPs que já existem e têm regramento. Graças a uma ação no Ministério Público, a AAECO conseguiu barrar a venda de áreas verdes no município e, inclusive, algumas descobrimos serem Áreas de Preservação Permanente”, destaca Rigotto.
Embora as energias renováveis sejam essenciais para um futuro sustentável, Rigotto acredita que elas também têm seus desafios. “Energias renováveis em alguns casos têm resíduos ainda sem reciclagem acessível. Temos exemplos dos resíduos eletrônicos, placas solares e baterias de carros elétricos, além das torres eólicas que matam pássaros. Estudos sobre esses impactos são necessários”, afirma.
Rigotto é enfático ao afirmar que estamos destruindo aceleradamente nossos ecossistemas e a biodiversidade. Ele critica os políticos que fazem novas leis permissivas e defende a necessidade de voltar a leis ambientais mais restritivas e cumpri-las rigorosamente. “Temos que parar de fazer novas leis permissivas e voltar a leis mais restritivas ambientais e cumpri-las”, declara.
Como em todas as instituições, Rigotto reconhece que existem aqueles que agem por consciência e outros por oportunismo. “Resta a nós discernir se o que nos chega é realmente verdadeiro na essência”, comenta.
Ele acredita que a resposta às catástrofes deve ser rápida e que os prefeitos, por estarem mais próximos dos problemas, devem ser os primeiros a agir. Ele também critica a demora das movimentações das forças nacionais e sugere uma melhor aparelhagem da Defesa Civil. “Nenhum ente político deixou de responder à catástrofe, mas a demora das forças nacionais ficou notória. Quando houve o furacão Katrina em Nova Orleans nos EUA, as forças armadas demoraram mais do que o Brasil para socorrer as vítimas pelos mesmos motivos. O país deve aparelhar a Defesa Civil e creio até juntar-se à estrutura do Corpo de Bombeiros que faz trabalhos semelhantes”, comenta.
Recentemente, Gramado aprovou um projeto de lei que cobra pelas sacolinhas plásticas, uma medida que Rigotto apoia e sugere ser adotada em outras cidades. “Estamos destruindo aceleradamente nossos ecossistemas e com eles a biodiversidade local e global. Em vez de políticos cada vez mais bater e criticar ambientalistas deveriam é parar de fazer novas leis permissivas. Temos de voltar e refazer leis mais restritivas ambientais e cumpri-las”, diz.
Rigotto destaca que os indivíduos são a parte mais importante na luta ambiental, por serem a maioria. “Os indivíduos são a parte mais importante, pelo simples motivo de serem a maioria. Temos de mudar o pensamento arraigado de que são os governos e grandes corporações que têm de resolver. Somos a maioria que deve fazer sua parte replicando o exemplo. Se o governo não respeita leis ambientais, não votemos neles; as empresas desrespeitam a natureza, paremos de consumir seus produtos”, afirma.
Ele destaca a conservação dos recursos hídricos e o gerenciamento de resíduos como questões imediatas, além de citar o aumento dos custos dos alimentos devido às alterações climáticas. “A preservação das águas e o tratamento de resíduos no quesito mais direto. Os alimentos serão outro desafio, visto que, as mudanças climáticas elevarão os preços, quando não destruírem milhares de hectares. Na Índia mais de 200 milhões de pessoas passam fome, no Brasil estima-se mais de 20 milhões”, alerta. Para Rigotto, não existe um legado ambiental, mas uma necessidade urgente de mudança de mentalidade e paradigmas. “Não existe legado nenhum, existem necessidades urgentes de uma mudança de mentalidade e paradigmas, e parece que o seres humanos irão aprender, ou por amor ou pela dor”, conclui.