Instituições relacionadas à área da segurança pública e da saúde encaram a problemática com prevenção, acompanhamento e inúmeras apreensões no Município
São 4.531 prontuários abertos, sendo 1.896 ativos. Este é o número de pacientes em tratamento devido ao uso de drogas ilícitas em Bento Gonçalves. O registro é do Centro de Atendimento Psicossocial – Álcool e Drogas (CAPS AD), serviço vinculado ao Setor de Saúde Mental da Secretaria Municipal de Saúde. Tais pacientes são atendidos em consultas médicas, psicoterapia, grupos de autoajuda, grupos de motivação, tratamento intensivo e ambulatorial.
Mas se engana quem imagina que este número é real. Conforme a coordenadora do serviço, psicóloga Juliana Carvalho, a quantidade de consumidores de droga é muito maior. “Esse número se divide entre as pessoas que fazem consumo “social” e consumo mais severo. O número de pacientes em atendimento é razoável se comparado ao de habitantes do Município. O investimento em informação é fundamental para que as pessoas procurem o serviço, uma vez que temos a oferta de tratamento para dependência química que pode acarretar danos muito graves na vida do consumidor”, frisa a coordenadora.
Conforme ela, diferentemente do que se pensa, nem todos os casos de dependência química estão ligados ao alcoolismo. “As pessoas estabelecem relações com diferentes tipos de droga, de acordo com várias nuances e situações de vida. Existe a questão da predisposição genética, que muitas vezes não é lembrada e pensada por quem inicia o uso consumo e abuso de substância. Levando em conta o consumo de álcool, sabe-se que no Brasil é a droga mais consumida e aqui não é diferente. Hoje temos, entre os 1.896 prontuários ativos, 300 alcoolistas”, destaca Juliana.
Para a psicóloga, pacientes em tratamento são aqueles que vivem a recuperação diariamente, que acreditam na força do mesmo e que são os maiores responsáveis pela manutenção de seu bem-estar. “São pessoas que aceitam a condição de estarem com um problema grave de saúde, que altera o comportamento e que necessitam de ajuda através de medicação, de grupos de autoajuda e da utilização do tripé Disciplina, Espiritualidade e Trabalho. Sabemos que o percentual de abstinência não é tão amplo, porém, a recuperação também diz respeito a cair e se levantar, quantas vezes forem necessárias durante a vida”, comenta.
Juliana diz, ainda, que as substâncias que alteram o comportamento estão presentes na vida dos seres humanos ‘desde sempre’. “A curiosidade e a experimentação também são frequentes e comuns ao longo da vida. O diálogo é o melhor caminho para que as crianças tenham ideia de todas as consequências do uso. O consumo de substâncias psicoativas altera o comportamento, porém, o tempo é relativo para cada pessoa e o tipo de conduta modificada depende do tipo da droga que está sendo consumida. Portanto, cabe aos pais terem um canal de comunicação saudável com seus filhos, observando mudanças extremas de comportamento, como abandono dos estudos, abandono de atividades que proporcionam prazer, como o esporte, música, dança. Alguém que inicia uma relação de dependência com a droga passa a viver só em função dela. Todo o resto à sua volta vai perdendo o valor afetivo que até então existia”, conclui.
BM promove ações repressivas ao tráfico
O comandante do 3º Batalhão de Policiamento de Áreas Turísticas (BPAT), tenente-coronel Artur Marques de Barcelos, destaca que o trabalho da instituição está focado na repressão, porém, há também o patrulhamento preventivo e a visibilidade nas regiões em que existe o tráfico de entorpecentes. “As ações de combate ao tráfico propriamente dito são desenvolvidas a partir de atividades repressivas que passam por emprego da Força Tática (FT) e da Ronda com Apoio de Motocicletas (ROCAM) em locais em que existe a comercialização de entorpecentes. Atuamos neste viés de combate, mais incisivas, no trabalho de inteligência e monitoramento e em ações pontuais de repressão qualificada. Mas temos que falar com relação ao tráfico como um todo, o consumo em geral, uma vez que realizamos ações de viés preventivo e, principalmente, podemos destacar o afastamento das crianças e adolescentes das drogas e da violência através do Programa Educacional de Resistência às Drogas, o Proerd, que atende nas escolas e orienta para as maneiras mais eficazes deste público se afastar das drogas. Afinal, no pano de fundo do tráfico está o consumo, a demanda. Então, atuamos com crianças e adolescentes para criar esta cultura de afastamento”, ressalta.
Falando especificamente de Bento Gonçalves, o comandante afirma que somente em 2024 foram realizadas mais de 60 prisões por tráfico.
A importância do Proerd para a sociedade
Neste primeiro semestre de 2024, cinco escolas participam do Proerd em Bento Gonçalves: Instituto Estadual de Educação Cecília Meireles, com cinco turmas do Ensino Fundamental; Escola Estadual de Ensino Médio Mestre Santa Bárbara, com quatro turmas; Escola Estadual de Ensino Fundamental Ângelo Salton, com duas turmas; Escola Municipal de Ensino Fundamental Santa Helena, com duas turmas e Impulso Bento, com duas turmas, totalizando 425 alunos. Outras cinco serão contempladas com o programa no segundo semestre.
“Todas as escolas, dentro do possível, são atendidas”, afirma a coordenadora do Programa, subcomandante do 3º BPAT, major Estefanie Gomes Caetano, que explica: “As escolas enviam ofício ao quartel solicitando o Proerd e, conforme a demanda, vamos atendendo”, destaca.
De acordo com ela, o Programa tem a duração de 10 encontros e forma, anualmente, cerca de 800 jovens. Entre os temas abordados estão não somente o combate às drogas, mas a forma de se comunicar, o não-uso da violência e outros. “O modelo de tomada de decisão Proerd faz com que a criança tenha condições de se posicionar frente aos desafios que vai encontrar no cotidiano, evitar comportamentos errados, a não cometer bulling, trabalhar com a inclusão, resistir à pressão dos colegas, não ter comportamentos nocivos para si e para sua família, ser um cidadão do bem, dar orgulho para sua família, cultivar os valores. Os melhores alunos, no final do curso, são premiados. Todos recebem certificado e camiseta”, conta.
A instrutora do Proerd, soldado Janaína Riciardi crê na eficácia do Programa. “Com certeza, através do Proerd, as crianças e adolescentes são preparados para resistir às drogas e para se portar em diversas situações que podem se apresentar no decorrer da vida, inclusive quando adultos. É muito gratificante atuar no Proerd”, enfatiza.
Polícia Civil atua através do Policiamento Comunitário
O Policiamento Comunitário – Núcleo Polícia Civil de Bento Gonçalves, coordenado pela delegada Deise Salton Brancher existe desde 2011. Conforme ela, o principal objetivo é proporcionar uma aproximação entre a Polícia Civil e a comunidade atuando preventivamente em diversos eixos. “Os 12 agentes, juntamente comigo, atuam em importantes projetos como o Grupo Reflexivo Despertar, Rotas Turísticas, palestras do projeto Papo de Responsa, desenvolvido nas escolas e nas empresas, e também através da participação em Conselhos Municipais. Atuamos, ainda, em conjunto com outros órgãos de segurança, visando especialmente a prevenção”, comenta Deise.
Comunidade Terapêutica é 100% custeada pelo Município
Desde abril de 2011 Bento Gonçalves conta com a Comunidade Terapêutica, localizada no Passo Velho, Distrito de Tuiuty. A estrutura é referência na região e tem capacidade para atender 32 internos, acompanhados por monitores, durante as 24 horas, sete dias por semana. O tratamento realizado no local é custeado 100% pelo Município.
Entre os benefícios ofertados estão auxílio psicológico, psiquiátrico, clínico, odontológico, grupo de autoestima e medicações. Coordenada pelo CAPS AD, que realiza o encaminhamento dos pacientes, a Comunidade oferece atividades laborais, além de contar com biblioteca, horta e horto florestal, onde são cultivadas mudas de árvores nativas e flores, que posteriormente são utilizadas no embelezamento urbano do Município. A duração do tratamento é de seis meses.
O coordenador de Saúde Mental da Secretaria da Saúde, psicólogo Maurice Bouwary afirma que, há 13 anos, o espaço tem sido a salvação de muitos pacientes. “É difícil precisar um percentual de recuperação, porque varia de indivíduo para indivíduo, porém, creio que beira os 30%”, frisa.
Bouwary destaca que, devido à catástrofe climática que atingiu o Estado e causou grandes estragos no Vale das Antas, por ora, os pacientes foram transferidos para o CAPS AD, onde recebem todo o atendimento e a assistência, tanto por parte da equipe quanto dos monitores.
Fotos: Arquivo, Brigada Militar e Reprodução