Clacir Rasador
De vez em quando somos surpreendidos com aquelas postagens – no meu caso, no Facebook, segundo meus filhos, rede social dos velhos – que nos fazem reviver memórias e sonhos já carcomidos pelo tempo, embora ainda despertem aquele sorriso solitário e irriguem os olhos de nostalgia.
Foi com esse sentimento que recebi as regras da pelada de futebol de antigamente, as quais, mesmo sem autoria, não deixam dúvidas que as pernas das mãos que as escreveu já levou muitas caneladas em campinhos de chão batido.
Sem dar espaço para o politicamente correto, as 20 regras eram claras e sem mi mi mi, driblavam qualquer preconceito, ideologia, raça, credo ou cor. Ali, o negócio era unicamente fazer gol, ganhar time adversário dentro das quatro linhas, mesmo que imaginárias, e sentir o peso da fama nos comentários da rua, quiçá do bairro… pelo menos até o dia seguinte, pois cada jogo era tratado como uma nova decisão de campeonato…
A expressão “time sem camisa” não tinha qualquer relação à falta de amor, seriedade ou dedicação dentro do campo; era tão somente o outro time contra quem se jogava… exatamente o time com camisa, pois não havia dinheiro sequer para uma nova bola, imagine para dois ternos (uniformes).
Dos “gramados” de cor terrosa, de goleiras de pedras ao chão ou feitas de encaixe de caniços de eucaliptos, tais arenas eram o berço fecundo do sonho mais sonhado entre os sonhos dos meninos de meu tempo, ser jogador de futebol profissional. Ao mesmo tempo, dada as dificuldades da grande maioria dos varzeanos, profissionalizar-se no mundo da bola, era como ganhar sozinho na loteria, diga-se, único jogo de apostas de esporte legalizado à época.
A propósito, a maior decepção na loteria era a chamada “ZEBRA”, quando um time tido como superior em qualidade futebolística perdia para outro que não tinha lá grandes talentos; embora, confesso, adorava ver a zebrinha aparecer no Fantástico aos domingos.
Contudo, mesmo odiada por alguns, a velha zebra que deixava os quase ricos pelas tabelas, passaria hoje por uma inocente ovelhinha se comparada às revelações da operação Penalidade Máxima do Ministério Público de Goiás, recentemente com abertura de inquérito na Polícia Federal, a qual está a revelar um jogo criminoso e vergonhoso de esquema de apostas e manipulação de resultados no futebol brasileiro.
Vítimas primeiras, os leais torcedores de seus times vivem um pesadelo quando nomes de seus jogadores são anunciados como investigados, traidores se provado do que chamam manto sagrado, as cores de seus times; e por consequência, mais que traidores, serão suicidas de seus próprios sonhos e, por que não, algozes da então pátria de chuteiras, como diria o dramaturgo e escritor Nelson Rodrigues.
E assim, seguindo o “modus operandi” de forma reativa e não preventiva, tal qual o dito popular “porta arrombada, tramela nela”, o Brasil – por conta de crimes que marcam época, como o foi em tantos momentos de sua história, – recentemente a barbárie ocorrida na creche em Blumenau – SC – vai despertando nos legisladores e governo a necessidade de pavimentar com leis a realidade como ela é, diga-se, fora dos lustros pisos do poder do Planalto.
Peço licença e encerro já na prorrogação, aqui me rendendo novamente à nostalgia, cantarolando “velhos tempos, belos dias” refrão musical de Roberto Carlos, refrão este que cai como uma luva ao lembrar dos anos dourados em termos de futebol, onde nada era mais verdadeiro e simples dentro das quatro linhas que a lendária frase do também lendário artilheiro Dadá Maravilha: “não existe gol feio, feio é não fazer gol”.
Vamos em frente!