Em Bento Gonçalves e região, Sindicato dos Trabalhadores Rurais auxilia das mais diversas formas, sempre lutando pelas causas de quem está todos os dias no campo. As agricultoras de Pinto Bandeira, Teresinha Mazzocco Paese e Cirley Antunes dos Santos Lorenzatti, contam um pouco sobre suas vidas, conquistas e anseios
Esta segunda-feira, 17 de abril, é lembrada como dia Internacional de Luta dos Trabalhadores do Campo. Há cerca de 11 anos, os movimentos sociais do campo escolheram o dia por remeter ao massacre de Eldorado dos Carajás, que aconteceu em 1996 e vitimou 21 trabalhadores rurais no Pará. A data tem o objetivo de refletir, mas também é um momento para comemorar todas conquistas realizadas com a luta diária desses homens e mulheres.
Na Serra Gaúcha, milhares de agricultores seguem firmes na atividade rural, passando para as próximas gerações, todo o conhecimento sobre o cultivo de frutas, hortaliças e outros tipos de plantio, além de criação de animais da fazenda.
Em Pinto Bandeira, Teresinha Mazzocco Paese, 67 anos, é um exemplo de vida dedicada à colônia. “Sempre trabalhei como agricultora e me aposentei nesta profissão. É algo muito sofrido, mas também gratificante, pois tocamos as mãos na natureza que Deus criou. Quando olho para as coisas que planto, me alegro muito, porque é dali que sai a comida que comemos”, menciona.
Em sua propriedade, Teresinha cultiva uvas, pêssegos e ameixas, sempre com muito cuidado e dedicação. “Amo minhas parreiras e adoro quando vejo um pomar florido, digo que é uma obra divina”, diz. A agricultora também adora a paz que as flores lhe trazem. “Desde criança amo a natureza. O que me marca muito é o que planto e vejo crescer, isso faz com que eu me torne cada vez mais importante com o jeito que cuido do meio ambiente”, completa.
Para ela, o futuro da agricultura está um pouco enfraquecido. “Mas tenho a esperança de que um dia as autoridades deem valor para que nossos filhos sigam os exemplos de quem tanto lutou por essa profissão. Nosso trabalho ainda é pouco valorizado, porém, estamos mostrando que somos importantes para a sociedade e que, sem o nosso esforço, não tem comida na mesa”, afirma. Além disso, Teresinha destaca o esforço das mulheres. “Na colônia, deixamos de ser dona da casa e conquistamos feitos, demonstramos que somos capazes de ter igualdades salariais”, conclui.
Outra moradora de Pinto Bandeira que, desde a infância tem a agricultura como principal atividade, é Cirley Antunes dos Santos Lorenzatti, 66 anos. Natural de Nova Prata, ajudava sua família a cultivar milho, feijão, arroz, trigo, entre outros grãos. “Me lembro que em 1970 meu pai foi ao banco pedir empréstimo e lá, lhe disseram que o que daria lucro naquele momento era a soja. Mas a gente já tinha a terra toda plantada com milho, que já estava na altura de uns dez centímetros. Ele chegou em casa com um saco com sementes de soja e me mandou, com a maquininha a mão, plantar no meio do milho. Eu sei que a gente colheu e deu lucro, ainda mais por que éramos os primeiros daquela região a investir neste alimento”, recorda.
Anos depois, já adulta e residindo na Capital Estadual do Pêssego de Mesa, ela investiu na produção de pêssego, uva, caqui, figo, marmelo, entre outras frutas que utiliza na produção de doces e geleias. “Sempre trabalhei na colônia e com 50 anos decidi construir minha agroindústria na Linha Jansen 32 em 2008, a primeira a ser formalizada do município”, diz.
Para ela, essa é uma conquista corajosa que sempre levará para a vida. “Eu não tinha capital pra construir e comprar equipamentos, então foi aos poucos. Gostaria de agradecer aos meus vizinhos, que lá no início me emprestaram máquinas pra começar a trabalhar. Depois consegui um empréstimo para construir e comprar os itens, mas não foi fácil. São 24 horas por dia dedicadas ao empreendimento, nunca termina. Mas foi um importante passo para ajudar na renda da minha família, para irmos para frente”, frisa.
Conforme Cirley, a geração futura de agricultores da região é incerta, pois muitos não permanecem com os pais na colônia. “No meu caso, não sei se minha agroindústria vai continuar depois de mim. Só tenho dois filhos e eles tem bastante trabalho no campo, plantando mais parreira e renovando-os. Mas não é certo que eles vão continuar no futuro”, lamenta.
Sobre o reconhecimento do agricultor, que tanto faz para o povo ter alimentos de qualidade em suas mesas, Cirley têm dúvidas e afirma que vê pouco a ser feito referente a isso. “A gente sofre com o clima, principalmente quando não chove. Lutamos pra sobreviver aqui na colônia e não está fácil. Não somos muito valorizados, pois o governo põe o preço do quilo da uva e as indústrias querem reduzir. Não acho justo”, finaliza.
O sindicato
A história do Sindicato dos Trabalhadores Rurais Agricultores Familiares de Bento Gonçalves, Monte Belo do Sul, Santa Tereza e Pinto Bandeira iniciou em 26 de abril de 1962, completando, em breve, 61 anos de muita batalha pelos agricultores. “No começo tinha muito mais dificuldade para as pessoas do campo. O sindicato ocorreu com união e com a ajuda da igreja católica, que reunia os trabalhadores rurais naquela época. Tudo foi pensado para buscarem melhor condições de vida durante todo esse período e foram diversas lutas e desafios”, conta o atual presidente, Cedenir Postal.
De acordo com Postal, o sindicado auxilia das mais diversas formas, sempre lutando pelas causas de quem batalha todos os dias no campo. “Em primeiro lugar, estamos sempre a frente na luta da categoria por melhores condições e por preços mais justos. Além de acesso as linhas de crédito de seguro e de comercialização, de organização da produção, na questão da previdência, na organização da documentação e realização de palestras, cursos de capacitação dos agricultores, entre outras atividades”, afirma.
Segundo o presidente sindical, uma das principais conquistas foi o direito à aposentadoria rural, aprovada por lei em 1971. “Os homens e mulheres puderam ser reconhecidos como categoria. Depois temos tantas outras, o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) foi uma delas, que foi através da luta dos sindicatos”, salienta. O programa comentado pelo presidente sindical, proporciona financiamento para custeio e investimentos em implantação, ampliação ou modernização da estrutura de produção, beneficiamento, industrialização e de serviços no estabelecimento rural ou em áreas comunitárias rurais próximas, visando à geração de renda e à melhora do uso da mão de obra familiar.
Além disso, a evolução estrutural nas áreas rurais também melhoraria o dia a dia dos milhares de agricultores da Serra Gaúcha. “A categoria precisa ter melhores condições de energia e internet de qualidade, estradas boas, entre outras questões de infraestrutura”, comenta. O preço justo pelos produtos que precisam de tanto cuidado para serem produzidos também é algo que Postal ressalta ter mais zelo. “Neste caso, principalmente da uva, que seja valorizado o preço justo e com prazos de pagamento mais curtos. Porque, hoje, o agricultor demora mais de ano para receber de sua safra”, completa.
Ademais, Cedenir destaca que ainda falta muito para o trabalho no campo ser, devidamente, reconhecido. “No meu ponto de vista, o agricultor precisa ser mais valorizado, é um povo que levanta cedo, dorme tarde, trabalha de sol a sol com as incertezas do clima e da colheita. Todos nós precisamos nos alimentar pelo menos de manhã, de meio-dia e de noite, quem produz esses alimentos são quem planta, trata e colhe. Precisa-se dar uma importância maior a este serviço árduo, pois eles nos proporcionam algo que precisamos para viver, a comida”, encerra.
Fotos: Arquivo Pessoal