A psicóloga e mestra em psicologia clínica, Patrícia Dotta, destaca que existe uma invisibilidade para o sofrimento mental infantil. Estar atento aos sinais dados pelas crianças é importante para um possível diagnostico
Amanhã é celebrado o Dia Mundial da Saúde Mental. O objetivo é chamar a atenção para doenças mentais e os principais efeitos na vida das pessoas. Por isso, nesta data, a reportagem do Jornal Semanário decidiu abordar um assunto pouco falado: a depressão infantil. Embora não muito frequente, estatísticas mostram que o índice de casos, no Brasil, varia entre 0,2% a 7,5% para crianças abaixo dos 14 anos.
A psicóloga e mestra em psicologia clínica, Patrícia Dotta, destaca que existe uma invisibilidade para o sofrimento mental infantil, sendo visto como birra pelos adultos, em muitos casos. “Às vezes, os pais ou professores, tem dificuldade em reconhecer quando a criança tem um comportamento mais disfuncional e quando, de fato, se caracteriza como uma questão de sofrimento psicológico. Dizem que é manha, que tem que passar o chinelo para resolver”, pontua.
Patrícia reforça que a criança que não tem saúde mental na infância, vai sofrer na vida adulta. “Pode se envolver com uso e abuso de álcool, ter relacionamentos completamente abusivos, ter dificuldade de se estruturar financeiramente, emocionalmente. As consequências são gravíssimas. As crianças sofrem, não é bobagem”, garante.
O sofrimento psicológico infantil pode se manifestar de duas formas. Uma delas é a partir dos sintomas internalizantes. “Que são os sentimentos de introspecção. A criança tem baixa autoestima, é mais tímida, introvertida. Observamos sentimentos de isolamento, dificuldade de fazer amigos na escola”, exemplifica. A segunda maneira é por meio de sintomas externalizantes. “A pessoa pode ser mais agressiva ou hiperativa”, aponta.
É importante frisar que a depressão infantil se manifesta, em um primeiro momento, como uma apatia. “A criança não quer brincar, se sente sozinha, chora. É uma forma de manifestar os sintomas depressivos, que representa o sofrimento psicológico”, explica.
Como identificar
Questionada sobre como os pais ou responsáveis podem perceber um possível quadro de depressão, a psicóloga responde que a partir de uma certa intensidade e frequência de comportamentos depressivos. “Quando a criança não brinca, no sentido simbólico, há algo sério acontecendo, então esse é um primeiro indicador de que os pais tem que ficar atentos”, alerta.
Outra questão é quanto ao que acontece dentro do ambiente familiar em que ela está inserida. “Brigas, discussões, conflitos são pontos que podem gerar sofrimento psicológico. A criança é o sintoma da família, ela sempre vai expressar algo relacionado ao ambiente social”, afirma.
O que os pais transmitem para os pequenos também é fator determinante. “A criança não tem uma depressão simplesmente por ela mesma. Os pais brigam, não transmitem sentimentos de segurança. Alguns são muito controladores, exigentes. Às vezes são muito afetivos e acabam não pondo limites e a criança domina. Ou, por outro lado, são muito rígidos e controladores e a criança se sente reprimida”, analisa.
O diagnóstico
É importante reforçar que existe diferença entre tristeza e depressão. “A criança vai ficar triste, ela precisa se deprimir, é uma emoção, mas passa, vai embora. Diferente de quando isso se instala a partir de um ponto de vista mais profundo”, afirma,
De acordo com Patrícia, a depressão geralmente vem acompanhada. “A criança não vai apresentar somente a tristeza mais intensa, ela pode ter ansiedade, impulsividade, déficit de atenção”, aponta.
Além disso, outros sintomas podem ser comuns nesses casos. “Ansiedade, alterações de humor, dificuldade de ficar bem, fadiga, sentimentos de inutilidade. Algumas crianças tem pensamentos suicidas ou até tentativas, que é uma forma de pedir ajuda, porque se ela chega nesse ponto, o que está acontecendo naquela família?” questiona.
No dia das crianças, a reflexão sobre ter um filho
A psicóloga salienta que os pais devem refletir sobre a responsabilidade de colocar uma vida no mundo. “É preciso querer ter filho, não só porque as pessoas acham bonito, não é um bibelô, tem que cuidar. Quem não quer trabalhar, se estressar, (porque isso é normal), não tenha, porque depois a criança fica com essas questões psíquicas. É preciso pensar antes”, pontua.
Sobre o dia das crianças, Patrícia reforça que mais importante do que dar presentes é estar presente. “Agora os pais dão brinquedos, mas o difícil é o pai e mãe sentar e brincar, conversar, fazer o tema junto, perguntar como ela está. Enfim, coisas simples, mas que são importantes”, recomenda.
A importância de buscar ajuda
A psicóloga reforça a importância de buscar apoio de um profissional especializado, ao perceber que a criança está em sofrimento. “Não deixem sofrendo, não deixem piorar, levem para um profissional, façam uma avaliação com psicólogo. Sem saúde mental a vida não funciona, a criança não se desenvolve bem”, afirma.
Segundo Patrícia, o tratamento com as crianças é feito a partir da psicoterapia, sendo necessário o uso de medicação em casos severos. “O tratamento é feito com profissionais especialistas, psicólogos, psiquiatras”, finaliza.