Vanius Cesar Santarosa tem família italiana e aprendeu a falar português apenas no primeiro ano das séries iniciais. No interior, cuidava das parreiras junto à família e após 34 anos, assume a cadeira número um da Brigada Militar
Natural do interior de Bento Gonçalves, da Linha São Miguel, nos Caminhos de Pedra, o novo comandante-geral da Brigada Militar do Rio Grande do Sul, Vanius Cesar Santarosa, nasceu em uma típica família italiana, que tira dos parreirais o sustento.
Após os representantes do Conselho de Segurança Pública do município (Consepro-BG), da Secretaria de Segurança e do Centro da Indústria, Comércio e Serviços (CIC-BG) afirmarem que é importante a representatividade de alguém nascido e criado na Capital Nacional do Vinho no cargo mais alto da BM, o coronel explica a origem da família. “Todos italianos. Aprendi a falar português na escola, quando fui alfabetizado no primeiro ano das séries iniciais. Até então, só falava em italiano em casa, como toda família tradicional da região”, explica.
Uma lembrança que marca a infância é o início das aulas em uma escola localizada no Centro. “Meu primeiro dia no colégio Bento. Aquela situação contrastante entre eu, filho de agricultores, indo estudar na cidade. Era uma realidade muito diferente da que estava acostumado. Eu era muito pequeno, tipo ‘bicho do mato’. Foi uma passagem marcante para mim. Ali fiz até a oitava série e depois fui para o Mestre Santa Bárbara”, lembra.
O ingresso do comandante na Brigada Militar foi incentivado por um brigadiano que ajudava o pai na colheita de uva. “Era um soldado chamado Jacir. Meu pai queria que eu fosse militar, pois me daria uma vida mais tranquila, mas eu não queria sair de perto da família. Ele falou que a Brigada também era uma estrutura militar. Foi então que me inscrevi no vestibular pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC), onde participei da seletiva para concorrer a uma vaga no curso de formação de oficiais”, conta.
Em 1986, Santarosa saiu da Serra Gaúcha, aos 17 anos. O que leva consigo são os ensinamentos que teve dos pais. “Educação para correção de atos, rígida e muito séria. Você leva isso para a vida toda, carrega os primeiros valores que a família te ensina. Eles tinham uma vida muito difícil. Para poder estudar eu ajudava meus pais de dia com as parreiras, depois, de noite, pegava a bicicleta, fazia alguns quilômetros, chegava no ponto de ônibus para pegar o transporte, ir até a cidade, estudar para poder ser alguém na vida, tentar progredir, ter uma profissão. O pai sempre dizia que a vida dos agricultores é honesta, simples, mas não dá muito futuro”, relata.
Foram quatro anos de estudos na Capital, em regime de internato. “Me formei em um dos primeiros postos, que é o aspirantado, e logo em seguida, me tornei tenente. Depois fui classificado no 1º Batalhão de Polícia Militar. Ele é o mais antigo da BM, tem responsabilidade territorial com toda a zona sul de Porto Alegre. Servi oito anos no ali”, ressalta.
Realização de um sonho
Um objetivo que Santarosa tinha desde criança era ser piloto. Após oito anos servindo na BM, concorreu a uma vaga para essa formação. “Foi uma disputa muito acirrada entre todos da corporação. Consegui êxito e ser o único que conquistou a vaga. Servi dentro da unidade aérea por alguns anos, fiz curso de especialização nos Estados Unidos. Hoje sou o piloto mais habilitado que existe dentro da corporação. Tenho formação de linha aérea de avião e helicóptero, mas em função da ascensão na carreira, tive que ser movimentado”, explica.
O comandante afirma que foi responsável pela formação de todos os pilotos da corporação, no Centro de Formação Aeropolicial (Cfaer), em Capão da Canoa. “Estive na Filadélfia, na fábrica de helicópteros ítalo-americana, fabricante de alguns helicópteros que nós temos. Aprendi um treinamento para passar aos demais pilotos aqui no estado, são os helicópteros mais modernos que equipam a nossa frota. Sou também examinador credenciado pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), ou seja, posso renovar e habilitar pilotos. Todas as possibilidades de cursos dentro do segmento aeronáutico da BM, eu fiz”, orgulha-se.
Após isso, o coronel se tornou chefe de estado maior da região do Vale dos Sinos por três anos, foi movimentado para chefe de operações da Brigada no quartel general, atuou como responsável pelo planejamento da Copa América de 2019, além de ter sido responsável pelo setor tecnológico da Brigada. No segundo semestre de 2019, foi convidado a ser subcomandante geral, o número dois da corporação no Estado. “Fiquei até o mês passado, quando recebi o convite do governador Eduardo Leite para assumir a cadeira número um, ou seja, comandante-geral. Aqui estou, após 34 anos e meio de serviço”, comemora.
Uma trajetória de sucesso
Segundo Santarosa, ser comandante-geral é algo muito desejado por todos os oficiais, mas poucos chegam ao comando. “É uma coroação do trabalho ao longo desses anos, agora sendo comandante geral há possibilidade de implementar algumas ideias que vão trazer melhoria no atendimento da população, ou seja, melhorar o atendimento que a Brigada presta, as condições de trabalho do nosso policial. Também estamos trabalhando na melhoria no fornecimento de equipamentos. Outra linha é melhorarmos o plano de carreira do nosso nível médio, do nosso soldado, que é uma das portas de entrada da corporação”, salienta
Desde o início de abril comandando a corporação, o militar afirma que este foi um mês de muito trabalho e diversas ações. “Nas primeiras semanas, tivemos que fazer a exclusão de policiais militares, porque na minha política, não tolero desvio de conduta”, garante.
Ao olhar para trás e ver o menino que saiu da colônia, no interior de São Miguel, percorrer uma trajetória e ter conseguido se tornar o número um da corporação, o coronel sente gratidão. “Uma sensação de dever cumprido. Ainda tenho muitas metas, mas já é uma satisfação muito grande poder desempenhar essa função e, principalmente, desenvolver um trabalho que vai atender melhor o povo gaúcho”, ressalta.
A família do comandante-geral continua residindo em Bento Gonçalves. “Frequento sempre o município. Minha mãe, Valederes de Santarosa, ainda mora lá no sitio. Tenho parentes que moram no Barracão, os Anselmi, e mais familiares do meu pai que continuam vivendo em São Miguel, os irmãos dele, que seguem na produção de uva”, finaliza.
Fotos: divulgação