Doze anos atrás, eu estava feliz, comemorando com a família e amigos a minha formatura em Letras depois de suados cinco anos de estudos. Foi uma festa simples, um jantar no tão conhecido Atalaia, que durou até próximo das cinco da manhã. Comemos, bebemos, dançamos, rimos, brindamos a minha conquista e a vida.
Uma semana depois, durante uma outra comemoração de formatura de amigos, na madrugada, logo depois de chegarmos em casa, a felicidade deu lugar à tristeza. Só se falava nisso. As notícias do Brasil e do mundo afora pararam em Santa Maria. Boate Kiss. As cenas não saem da minha cabeça. Foram 242 jovens que, como eu, estavam brindando a vida numa cidade universitária que viam na boate uma oportunidade de se divertir, aproveitar as tão esperadas férias.
Ninguém imaginou que por um descuido ou uma irresponsabilidade de muitos, a tragédia tomaria conta do show pirotécnico. Muitos, sem entender nada, morreram presos ao banheiro, inalando fumaça tóxica, outros tentando sair do local, alguns, heróis, se foram tentando salvar vidas. Foi e ainda é um luto gaúcho. Coletivo. Todo 27 de janeiro, há 12 anos, nós choramos em conjunto. Choramos para que isso não se repita. Choramos porque não vimos esses jovens colarem grau. Lamentamos por tudo aquilo que poderiam ter vivido e não puderam. Enlutamos pelos sonhos de casar, ter filhos, voltar para casa que se foram naquela noite.
Não tem como esquecer. Até porque, além dos jovens mortos, sobreviveram mais de 600 feridos. Muitos, com sequelas. É digno de emoção ainda hoje rememorar as 134 ligações perdidas no celular escrito “Mãe”. O ginásio da cidade foi transformado em necrotério. Na boate, hoje demolida, cenas de terror.
O livro “Todo dia a mesma noite”, escrito relatando os fatos dessa noite, é para os fortes. O incêndio foi o segundo maior do Brasil até hoje. Mais tarde, o livro virou minissérie disponível na Netflix. Doloroso rever tudo isso.
A cidade dos estudantes, anteontem, recebeu uma homenagem luminosa. É uma forma de manter acesa a chama da esperança, para que seja feita justiça, já que até agora não houve uma sentença final para o caso.
O projeto Tempo Perdido, simula hoje, com o auxílio da inteligência artificial, como estariam as vítimas agora se estivessem vivas.
É de chorar ainda hoje, porque podia ser você. Podia ter sido eu. Esses jovens se foram cedo demais e da pior forma. Entraram para se divertir sem ter o direito de ir embora. Eles só queriam curtir a vida. São 12 anos de luta e de saudade. Que a justiça – mesmo tardiamente – seja feita para que eles possam, finalmente, descansar em paz!