Cheguei “à terceira edição, revisada e corrigida”. Eu e mais uma multidão de mulheres que não se enquadram no formato tradicional. Nossos cabelos não são brancos – a não ser que gostemos do charme prateado. Não somos exemplos de doação absoluta – temos vida própria além dos netos. Não tricotamos nem fazemos crochê, sentadas na cadeira de balanço – preferimos queimar calorias numa caminhada, ou ganhá-las numa cervejada.

É claro que não perdemos o “rebolado”. E amor temos em dobro. Orgulho também. Curtimos nossos netos, mas não os empanturramos de guloseimas (que as mães não nos ouçam) e cuidados de graça. Barganhamos abraços e beijos, passeios no shopping de mãos dadas e exigimos sempre resposta positiva à pergunta: “Gosta da vovó?”.

Somos antenadas. Embora tenhamos crescido num mundo analógico, encaramos a tecnologia digital sem medo. Temos intimidade com o “face”, “twittamos” e, se bobear, “navegamos” até altas horas.

E Deus nos livre do codinome “nona” – com todo o respeito às nossas saudosas nonas, que faziam um “brodo” temperado com alma e um “chico balanceado com gosto de céu”. Diferentemente delas, cozinhar não é nossa missão. Optamos por investir em projetos, cuidamos de nós mesmas e voamos. De avião ou com asas próprias. E isso não tem mais volta. Hoje, “atletas”, “peruas” ou “gatonas”; casadas, separadas ou viúvas, somos vovós ligadas, plugadas e conectadas a um mundo em constante transformação. Nona? Só se for a Sinfonia de Beethoven.

Histórias antigas

Para não dizer que não falei dos nonos, vale lembrar que eles eram homens rudes, mas de bom coração, e alguns, com uma clarividência surpreendente. Vejam o exemplo do Bépi. À noite lia o jornal “La Stafetta”, enquanto as filhas ficavam bordando o enxoval. Diante de algum evento extraordinário, ele interrompia a leitura e, virando-se para elas, dizia:

-Ascoltê, ascoltê, tose”! Que róbe! Arrivará um giorno che uma persona lá da altra parte del mondo parlará e sará ascoltada e vista quá. Que robe! (Escutem, escutem, filhas! Que coisa! Chegará um dia em que uma pessoa lá do outro lado do mundo falará com outra daqui e ambas poderão se ver).

Acertou na mosca o velho Merlo. Só não imaginava que os nonos também evoluiriam… Agora são “vovôs”. Vivem a idade do lobo e depois vestem a pele de lobo mau…

Histórias recentes

Há alguns anos atrás, eu conduzia meu veículo pela saída da cidade, num local onde sempre havia adolescentes caroneiros. Andando devagar, olhei penalizada para um rapazinho com ar de cansaço, que então se animou e pediu:

-Tem carona, nona?

Minha resposta foi explosiva:

-Nona é a tua avó!

E acelerei largando fumaça pelas ventas.

De repente, o estalo: ele não havia dito “nona”, e sim “dona”…