Quando você vê, os filhos saíram do banco detrás do carro, saltaram para o banco da frente e já assumiram a direção de suas próprias vidas.

O problema é que não crescem um pouquinho todo dia, mas de repente.

Os filhos crescem de repente e nós torcemos para que não vivam dizendo:

– Numa boa, meu velho, você tá igual ao pão de fôrma: chato, quadrado, casca grossa e fácil de dobrar.

Torcemos para que nossos filhos não achem que estamos portando medalhas, quando estamos apenas carregando o peso de uma dor (às vezes, a dor é tudo o que nos resta em incertos momentos da vida).

Torcemos para que nossos filhos não nos peçam respostas para as quais temos pouca ou nenhuma pólvora para queimar.
Por incrível que pareça, carregamos uma tênue esperança de que os nossos filhos compreendam que ser um bom pai é um dos trabalhos mais cansativos do mundo, pois não temos o direito de nos demitir ou de tirar férias.

Carregamos, inclusive, a esperança de que nossos filhos não nos façam pagar um preço alto demais pelas nossas hesitações.

É claro que você e eu que somos pais, trememos ante a possibilidade de que nossos filhos nos digam com a ironia que lhes é peculiar:

– Não se preocupe, meu velho, na sua idade ninguém mais o considera um hipocondríaco.

Talvez, acrescentem, rindo às gargalhadas:

– Pois é meu velho, até que enfim o seu investimento em plano de saúde está começando a valer a pena.

E, então, encerrem com uma pergunta humilhante:

– Escuta, meu velho, porque fica tão feliz quando começa a falar sobre aposentadoria?

De repente, pegamo-nos pensando que os nossos filhos entendem que nascemos para amá-los e que o amor por eles é a única salvação que conhecemos. Senão isso, pelos menos que perdoem as nossas fraquezas: calamos quando deveríamos ter falado e falamos quando deveríamos ter ficado de boca fechada.

Todos nós que somos pais desejamos que nossos filhos não construam muros em tornos de nós com a argamassa dos pequenos gestos do desdém e as grandes pedras da indiferença.

Ao fitarem os fios brancos da nossa barba, gostaríamos que nossos filhos entendessem (ou ao menos fingissem entender) que fomos programados para detestar som alto demais, especialmente se for “som tipo batidão” que parece por as paredes da casa abaixo.

Há muitas outras coisas que gostaríamos que os nossos filhos entendessem.

Gostaríamos que os nossos filhos entendessem que perdemos boas noites de sono para zelar pelo sono deles e que hoje só desejamos que nos deem “boa noite”.

Gostaríamos que tentassem entender, ainda, que a maior herança que podemos deixar a eles são os ventos das boas lembranças.

Nós, pais, alimentamos o dia a dia com a esperança de que não venhamos a ficar órfãos dos nossos próprios filhos em algum período das nossas vidas. Acalentamos a ideia de que, de vez em quando, nossos filhos sintam uma pontinha qualquer de orgulho pelo pai que tem e que não exijam a coragem que não temos e a força que nem sempre está em nós.

Desejamos que nossos filhos entendam que se alguma vez lhes dissemos verdades duras, o fizemos para que venham a tornar-se bons pais amanhã.

Ao nos pegarem na janela, batendo os dedos na vidraça embaçada pelo tempo, não digam que nos viram chorando, mas que estávamos lavando os olhos de dentro para fora.
Por fim, abraçamos a esperança de que nossos filhos digam de vez em quando:

– Puxa, o velho está certo.